BBC acusada de pôr alunos em perigo numa visita à Coreia do Norte

Uma equipa de jornalistas do programa Panorama entrou em Pyongyang numa viagem organizada por estudantes da London School of Economics.

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Há dúvidas sobre se os alunos foram avisados com antecedência Mark RALSTON/AFP

A BBC está a ser pressionada para não transmitir a próxima edição do seu programa Panorama, dedicado à Coreia do Norte, e a emitir um pedido de desculpas. Mas a pressão vem de mais perto do que se poderia imaginar: da prestigiada London School of Economics.

Em questão está a viagem do jornalista da BBC John Sweeney à Coreia do Norte, integrado numa visita organizada por alunos da London School of Economics (LSE). O problema é que Sweeney fez-se passar por um estudante de doutoramento e é isso que está a provocar a indignação da LSE.

Em declarações à BBC, John Sweeney garante que todos os estudantes sabiam que entre eles iria estar um jornalista e que sempre usou o seu nome verdadeiro. Mas admitiu que disse ume mentira: "Menti. Disse que era aluno de doutoramento. É difícil, mas íamos entrar num país que é mais parecido com a Alemanha de Hitler do que qualquer outro Estado actual." O jornalista disse ainda que obteve a aprovação "da maioria dos alunos".

Os responsáveis da LSE acusam o jornalista da BBC de "não ter dado informação suficiente para obter um consentimento informado" por parte dos alunos e dizem que estes foram "postos em perigo", já que Sweeney foi também acompanhado por dois repórteres de imagem, aparentemente sem o conhecimento dos estudantes.

Para além do risco que poderia advir para os alunos, é também a imagem da London School of Economics que está em jogo. Em comunicado, os responsáveis da universidade declaram que "as acções da BBC podem infligir graves danos à reputação da LSE e podem comprometer seriamente futuras possibilidades de alunos ou funcionários da LSE virem a estudar a Coreia do Norte legitimamente, e até as de outros países onde há suspeitas sobre a veracidade de trabalhos académicos independentes". A LSE ressalva que "apoia totalmente o princípio do jornalismo de investigação como interesse público", mas condena o uso do seu nome "como cobertura para actividades como esta".

Um dos alunos que esteve na mesma viagem – e que falou ao jornal da universidade sob a condição de anonimato – disse que os estudantes não tinham conhecimento da presença de "vários jornalistas da BBC na altura do voo para Pyongyang". "Fomos levados a acreditar que John Sweeney era um professor de História, apesar de mais tarde ter sido dado a entender que ele não era da LSE", disse o mesmo aluno.

O director da LSE, Craig Calhoun, comentou também a qualidade do trabalho da BBC: "A reportagem colocou alunos em perigo, mas parece não ter descoberto informações novas e apenas mostra o que a Coreia do Norte quer que os turistas vejam", escreveu Calhoun na sua conta no Twitter.

A BBC cita um porta-voz da própria BBC, que não é identificado pela BBC: "Nós sabemos que os alunos deviam ter sido avisados com antecedência que um jornalista pretendia viajar com eles, porque isso poderia fazer aumentar os riscos da viagem. Eles receberam essa informação, que lhes foi recordada mais tarde, para que pudessem mudar de opinião. Todos os alunos foram explicitamente avisados sobre os potenciais riscos de viajarem para a Coreia do Norte com um jornalista no grupo. Isto incluia os riscos de detenção e o risco de poderem ficar impedidos de regressar à Coreia do Norte."

Jornalista confrontado por colega
Numa entevista à BBC, John Sweeney foi confrontado com as suas acções por um dos seus colegas: "Disseste que ia apenas um jornalista e não uma equipa de três homens. Se tivessem sido descobertas, as tuas acções poderiam ter levado à detenção [dos alunos] na Coreia do Norte. Aceitas a responsabilidade por teres posto estudantes em perigo? E em termos de credibilidade académica? Como é que a LSE pode voltar a receber a confiança de qualquer outro país que queira visitar? Podem enviar um jornalista infiltrado...” Sweeney reafirmou que todos os alunos sabiam que estava um jornalista entre eles e que estavam cientes dos riscos. "Todos sabiam os riscos que corriam e resolveram ir", disse.

Quando confrontado pelo colega com o facto de os alunos não terem sido informados de que iam ter a companhia de uma equipa de investigação composta por três pessoas, o jornalista John Sweeney respondeu: "Mentimos à agência de viagem”. E prosseguiu: "É uma pergunta muito boa e é muito difícil responder. Acho que as pessoas mais indicadas para falarem sobre isso são os próprios estudantes", dando a entender que "a maioria" dos alunos estava a par do plano do programa Panorama.

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