Morte de soldado ucraniano eleva conflito à “fase militar”

Exército ucraniano autorizado a utilizar armas de fogo para “autodefesa”.

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As bases militares na Crimeia estão cercadas por comandos militares pró-russos há várias semanas David Mdzinarishvili/Reuters

Um soldado ucraniano foi morto esta terça-feira durante a invasão de uma base militar na Crimeia por milícias pró-russas. Na base, perto da capital da península, Simferopol, estavam mais de vinte soldados ucranianos, que acabaram por ser presos, segundo o porta-voz do exército da Ucrânia, Vladislav Selezniov. Dois outros militares ficaram feridos, de acordo com o governo ucraniano.

Selezniov diz que não está certo de quem terá iniciado o assalto, mas descreveu os invasores como "forças desconhecidas, altamente equipadas e com as caras tapadas". Outros relatos não confirmados davam conta da morte de um membro do comando pró-russo que cercava a base militar.

Falando depois da morte do militar ucraniano, o primeiro-ministro interino da Ucrânia, Arseni Iatseniuk, afirmou que "o conflito passou da fase política à fase militar". “Hoje as tropas russas começaram a atirar sobre os nossos soldados – é um crime de guerra", acrescentou. O líder do governo de transição ucraniano convocou uma reunião entre o seu ministro da Defesa e os homólogos do Reino Unido, dos EUA e da Rússia - signatários do Memorando de Budapeste que assegura a integridade territorial da Ucrânia - para "impedir a escalada do conflito". Será, contudo, improvável que o ministro russo se sente à mesa com o seu congénere ucraniano, uma vez que Moscovo insiste na ilegitimidade das novas autoridades de Kiev.

Pela primeira vez desde que se iniciou a intervenção russa, o Ministério da Defesa ucraniano autorizou os soldados na Crimeia a usarem armas de fogo “para a sua autodefesa e para a protecção das suas vidas”.

Moscovo tinha anunciado um cessar-fogo até sexta-feira para permitir que as bases militares na Crimeia fossem abandonadas pelos militares ucranianos. Está prevista uma reunião entre os comandantes militares russo e ucraniano ainda esta terça-feira, anunciou o comandante da Marinha ucraniana, Sergei Haiduk, citado pela BBC.

Tártaros pedem prudência

No cemitério de Abdal, nos arredores de Simferopol, realizou-se o funeral de um tártaro de 39 anos que foi assassinado há dias, por elementos das milícias pró-russas. Cerca de duas mil pessoas assistiram ao funeral, que decorreu com os tradicionais ritos religiosos muçulmanos. Mas os líderes da comunidade tártara decidiram não transformar a cerimónia numa espécie de manifestação contra a anexação da península pela Rússia.

Outro líder religioso que participou na cerimónia, Sehran Arifof, confirmou ao PÚBLICO que a atitude da comunidade, a partir de agora, será mais de cooperação do que confrontação com as novas autoridades russas da península. “Nós somos uma minoria, não é sensato iniciar uma resistência, ou protestos violentos”, disse o imã que presidiu a cerimónia. “As pessoas estão muito assustadas, e ninguém acredita nas promessas dos russos.”

À morte de Reshat Ametov juntam-se os relatos de vários desaparecimentos de membros da comunidade tártara, segundo a Reuters. Ametov, um construtor das obras e pai de três crianças, foi visto pela última vez a 3 de Março, durante uma manifestação na Praça Lenine, na capital da Crimeia. De acordo com a Human Rights Watch, que refere imagens televisivas, o homem foi visto a aproximar-se de um grupo de homens armados, pertencentes às milícias pró-russas, que o levaram do local.

Os episódios de violência na Crimeia, que passou esta terça-feira a integrar formalmente o território russo, fazem temer uma escalada dos confrontos. O porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, em declarações à BBC, assegurou que uma intervenção russa no Leste da Ucrânia “não está na agenda”, mas avisou que “se o governo ucraniano não prestar atenção às situações mais graves no Leste, então as consequências podem ser muito, muito graves”.

com Paulo Moura, em Simferopol

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