Autoridade Palestiniana marca um “Dia de Raiva” para esta sexta-feira

Cinco palestinianos morreram na Cisjordânia. Fontes dizem que os protestos, que envolveram cerca de 10 mil pessoas, foram os maiores desde a última Intifada.

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Ataque ao posto de control israelita na Cisjordânia Mohamad Torokman/Reuters

Esta sexta-feira, a última do Ramadão – o mês sagrado para os muçulmanos –, é de alto risco no Médio Oriente. A Autoridade Palestiniana marcou para hoje um "Dia de Raiva contra o banho de sangue em Gaza", que é um apelo a todos os palestinianos para saírem à rua e expressarem descontentamento e frustração pelo ataque israelita contra a Faixa de Gaza.

O exército israelita entrou em alerta máximo nos territórios ocupados da Cisjordânia e em Jerusalém Oriental (também ocupada por Israel e que os palestinianos consideram a sua capital).

O protesto marcado pela Autoridade Palestiniana, presidida por Mahmoud Abbas (líder da Fatah, que governa a Cisjordânia), começou depois das orações do meio-dia. Foi marcado para assinalar a indignação palestiniana depois de, na quinta-feira, uma escola das Nações Unidas que abrigava deslocados da Faixa de Gaza ter sido atingida por um morteiro. Quinze pessoas morreram, a maior parte delas mulheres, crianças e membros da equipa de apoio humanitário; 200 pessoas ficaram feridas, muitas perderam membros. 

O Governo israelita argumenta que o Hamas (o partido que governa a Faixa) usa estas instalações para armazenar armas - na semana passada a ONU denunciou ter encontrado armas numa das instalações que gere. O que se passou com o ataque de quinta-feira à escola (quem o fez) está ainda por apurar. As autoridades de Gaza culpam Israel. o Estado hebraico diz que o tipo de danos deverá ter sido causado por morteiros, e que tanto os seus soldados como os combatentes do Hamas estavam a utilizar estas armas. O exército israeltia diz que vai investigar.

O incidente ocorreu num dos dias mais mortíferos em Gaza, quando morreram mais de 100 pessoas, e foi particularmente desesperante: a ONU tentou em vão negociar a abertura de um corredor para levar os refugiados daquele centro para um mais seguro. Muitas das pessoas, na maioria mulheres e crianças, foram atingidas quando esperavam um autocarro para mudar de refúgio. Havia poças de sangue no chão, nas paredes, nas pequenas secretárias. Ovelhas corriam pelo local pouco depois do ataque, ainda havia sapatos e pedaços de roupa rasgados para fazer curativos pelo chão.

Na quinta-feira à noite já houve um primeiro sinal de que a violência pode eclodir na Cisjordânia e em Jerusalém Oriental. Duas pessoas morreram quando dez mil pessoas se manifestaram contra Israel. Um grupo avançou sobre um posto de controlo israelita perto de Ramallah e, na troca de tiros (do lado israelita) e de pedras e cocktails Molotov (do lado palestiniano), dezenas de pessoas ficaram feridas. Um adolescente morreu. 

Partes da estrada entre Ramallah e Jerusalém estavam cobertas de pedras usadas por palestinianos, na maioria jovens, contra as forças israelitas, diz a correspondente da Al-Jazira na Cisjordânia Dalia Hatuqa. A dimensão das manifestações fez lembrar os protestos durante a última Intifada, de 2000 a 2005. Nesta sexta-feira, morreram mais cinco palestinianos na Cisjordânia - dois em Nablus (um alegadamente morto por uma habitante de um colonato) e outros três em Hebron, atingidos com balas reais numa manifestação. 

Duas semanas para destruir túneis
A operação militar israelita em Gaza entra esta sexta-feira no 18.º dia, tendo morrido até agora 804 palestinianos (a grande maioria civis) e mais de 30 israelitas (33 soldados e três civis, um dos quais um trabalhador tailandês). Neste contexto de escalada no conflito, o secretário de Estado dos EUA, John Kerry, apresentou às duas partes uma nova proposta destinada a pôr fim à guerra. Kerry avança com uma solução de duas semanas de trégua durante as quais o exército israelita teria a permissão dos palestinianos para destruir os túneis do Hamas (a justificação do Governo de Telavive para este conflito), que permitem aos palestinianos entrar em território ocupado por Israel para realizar atentados e também para fazerem entrar na Faixa bens essenciais. A Faixa de Gaza está há oito anos sujeita a um bloqueio económico.

No plano de Kerry, que o Governo israelita vai analisar nesta sexta-feira, essas duas semanas seriam aproveitadas pelos negociadores para chegarem a uma solução de cessar-fogo permanente. Mas a proposta, dizem os analistas, não deverá ser aceite pelos palestinianos. Na quarta-feira à noite o líder do Hamas no exílio, Khaled Meshaal, disse que o movimento não concordará com um cessar-fogo na Faixa de Gaza antes de Israel pôr fim ao bloqueio ao território. “Não aceitaremos qualquer iniciativa que não leve ao fim do bloqueio e que não respeite os nossos sacrifícios”, disse Meshaal numa conferência de imprensa no Qatar, onde vive desque que deixou a Síria devido à guerra neste país.

Um dos países chave nestas negociações, o Egipto, considera o Hamas um perigo numa altura em que as novas autoridades presididas pelo antigo militar Sissi ilegalizou e perseguiu a Irmandade, que tinha ocupado a presidência após as primeiras eleições livres do Egipto. O movimento palestiniano tem dito que qualquer trégua tem de incluir a garantia do fim do bloqueio.

Kerry está há quatro dias na região, e hoje de novo no Cairo. Responsáveis dos EUA já avisaram que não ficará no local “indefinidamente”.

O secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, parecia mostrar uma nota de exaspero: “Isto é errado”, disse, depois do ataque à escola em que morreram também empregados da ONU. “Estou a dizer tanto israelitas como aos palestinianos do Hamas que é moralmente errado”, continuou. “O mundo tem estado a ver o que está a acontecer com grande preocupação. Têm de parar de lutar e começar a dialogar.”

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