Depois do Twitter, Turquia corta acesso ao YouTube

Decisão da Autoridade das Telecomunicações acaba de ser anunciada aos operadores nacionais. Ministério dos Negócios Estrangeiro justifica medida com ataques à segurança nacional.

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A Turquia está em plena campanha eleitoral paras as municipais de domingo OZAN KOSE/AFP

A Autoridade de Telecomunicações da Turquia (TIB) acaba de “tomar medidas administrativas” no sentido de encerrar o acesso à rede social YouTube.

A decisão do regulador foi anunciada em comunicado, sem quaisquer pormenores sobre as razões por detrás da decisão. Segundo o diário turco Hürriyet, a Autoridade das Telecomunicações já notificou os fornecedores nacionais de Internet e GSM de que devem bloquear a plataforma de partilha YouTube.

A AFP cita meios turcos que avançam a “difusão de registos piratas pondo em causa o regime” como o motivo por detrás da decisão. Na página da Autoridade das Telecomunicações, uma nota relativa ao YouTube refere que “após análise técnica e avaliação jurídica baseada na legislação, foi tomada uma medida administrativa [para bloquear] o site”.

A Google, que detém o YouTube, confirmou ter recebido reclamações de utilizadores na Turquia que não conseguiam aceder à página inicial do site. A empresa desmentiu que essa situação se devesse a problemas técnicos no site, e garantiu que o caso estava a ser analisado.

Declarações atribuídas pelas agências ao ministério dos Negócios Estrangeiros turco referem a divulgação através do YouTube de uma gravação pirata de uma conversa entre dirigentes governamentais que discutem uma possível operação militar na Síria. A BBC diz que as vozes da gravação foram identificadas como sendo do ministro dos Negócios Estrangeiros, Ahmet Davutoglu, do vice-chefe das Forças Armadas, Yasar Guler e do responsável dos serviços secretos do país, Hakan Fidan.

Os governantes falam numa possível missão em território sírio a pretexto da protecção do mausoléu fúnebre de Suleyman Shah, o avô do fundador do império otomano e que cuja soberania é reclamada pelo Governo turco ao abrigo de um tratado assinado com a França, em 1921 (altura em que o governo da Síria estava mandatado à França).

Um dos intervenientes na conversa sugere que a operação seja apresentada como uma resposta às agressões da guerrilha radical do Estado Islâmico do Iraque e Levante, um dos grupos filiados na Al-Qaeda: “Uma operação contra a Al-Qaeda teria legitimidade internacional e estaríamos a defender solo nacional”, observa. Outro dos participantes na conversa responde que “não é difícil inventar uma justificação para o ataque”.

O ministério diz que a gravação foi “parcialmente manipulada” e acrescenta que a sua divulgação constitui um “miserável ataque à segurança nacional”. A Reuters nota que a autenticidade do registo – que foi publicado por um utilizador anónimo – não pode ser confirmada de forma independente, mas acrescenta que a ser verdadeira, a fuga de informação só poderia ter surgido de dentro do aparelho de Estado.

O fecho do YouTube foi decretado um dia depois de um tribunal administrativo de Ancara ter invalidade um decreto do primeiro-ministro Tayyip Recep Erdogan proibindo o uso de uma outra rede social, o Twitter, no país. O chefe do Governo alegou que os utilizadores do Twitter estavam a usar aquela plataforma para “atacar a segurança da Turquia” e a ele próprio. Mas no entendimento do tribunal, a lei – que vigorou durante uma semana – contrariava os “princípios de um Estado de direito”: por indicação do juiz, o acesso ao Twitter tem de ser restabelecido num prazo máximo de 30 dias.

Erdogan prometeu “erradicar” o Twitter da Turquia antes das eleições municipais deste domingo. O primeiro-ministro sugeriu que a publicação de mensagens com “retórica anti-governamental” poderia levar à extensão do bloqueio a outras redes sociais como o YouTube ou o Facebook.

“Agora andam a divulgar reuniões de segurança nacional”, reagiu Erdogan, num comício esta tarde em Diyarbakir. “Trata-se de uma vilania, uma desonestidade. Quem é que tem interesse em promover escutas clandestinas de reuniões tão importantes?”, questionou o primeiro-ministro.

O Partido Justiça e Desenvolvimento (AKP) de Erdogan – e o primeiro-ministro pessoalmente – têm muito em jogo nas eleições de domingo: mais do que uma escolha autárquica, a votação está a ser encarada como um referendo ao Governo islamista, cuja credibilidade foi posta em causa por vários escândalos de corrupção e autoritarismo. Nesse sentido, o resultado será uma indicação preciosa da força política do primeiro-ministro, que ainda não desfez o tabu sobre uma eventual candidatura presidencial, em Agosto.

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