Maioria dos brasileiros tem medo de uma polícia “rápida no gatilho”

Homicídios cometidos pela polícia no Rio de Janeiro são raramente investigados. Maioria da população nos centros urbanos do Brasil tem medo das forças de autoridade.

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A Amnistia diz que há indícios fortes de execuções extrajudiciais em pelo menos 9 em cada dez mortes às mãos da polícia militar em 2014 Christophe Simon/AFP

A polícia no Rio de Janeiro, cidade que se prepara para acolher os Jogos Olímpicos de 2016, é “rápida no gatilho” e raramente é investigada e julgada pelos homicídios que comete – mais de 1500 nos últimos cinco anos –, acusa a associação de defesa dos direitos humanos Amnistia Internacional.

Os dados revelados nesta segunda-feira pela organização revelam que pelo menos 16% do total de homicídios registados no Rio de Janeiro nos últimos cinco anos ocorreram às mãos de polícias em serviço. São 1519 mortes. Só na favela de Acari, na zona Norte do Rio, a organização apurou indícios que sugerem a ocorrência de execuções extrajudiciais em pelo menos nove em cada dez mortes às mãos da Polícia Militar (PM) em 2014.

No relatório “Vocè matou meu filho!”, a Amnistia acusa a PM do Rio de recorrer regularmente e de forma injustificada ao uso excessivo de força durante as operações de segurança nas favelas da cidade. E quando a polícia mata alguém, é raro que esse caso seja devidamente investigado, segundo a organização. 

Quando uma pessoa é morta em resultado de uma intervenção policial, um agente da polícia elabora um relatório administrativo para determinar se o incidente aconteceu em legítima defesa ou se é necessário iniciar procedimentos para uma acusação criminal. Na prática, muitos dos casos são arquivados como incidentes de “resistência [à polícia] seguida de morte” – o que impede que sejam feitos inquéritos independentes.

Das 220 investigações abertas em 2011 no Rio de Janeiro a casos de mortes pela polícia apenas uma resultou em acusações formuladas contra o agente. Em Abril de 2015, 183 investigações continuavam em aberto.

Medo dos "bons"

Mas impunidade da polícia no Rio de Janeiro é apenas uma das razões pelas quais a presença e actuação da polícia brasileira não inspiram confiança nem transmitem segurança à população das grandes cidades do país. Uma sondagem publicada neste fim-de-semana pelo instituto Datafolha revela que 62% dos moradores em centros urbanos têm medo de ser agredidos por agentes da PM, e 53% receiam tornar-se vítimas da violência da Polícia Civil.

Este inquérito avaliou as opiniões dos moradores de 84 municípios com mais de cem mil habitantes, em todas as regiões do país. As conclusões apontam para um cenário de medo permanente, não só da possível agressão das autoridades, mas sobretudo da violência urbana.

Segundo a Datafolha, 81% dos inquiridos manifestaram medo de ser assassinados, e, nesse grupo, 49% acreditam na possibilidade de serem vítimas de homicídio ainda durante este ano. Os números são significativamente mais altos do que em 2012, a última vez que foi feita uma pesquisa com as mesmas perguntas.

A análise dos resultados mostra que os negros, as mulheres e os habitantes do Nordeste são os grupos que mais receiam a morte violenta, por assassínio ou violência doméstica. Ainda de acordo com a Datafolha, 52% da população tem um familiar ou conhecido que foi morto de forma violenta. A taxa de homicídios no Brasil tem vindo a aumentar há mais de uma década. Os últimos dados publicados no Anuário de Segurança Pública para 2013 apontam para 25,2 homicídios por 100 mil habitantes. Ou seja, um assassínio a cada dez minutos.

O papel da polícia nestes números é preponderante. Um levantamento do G1, da rede Globo, para 22 estados do país, mostra que, no ano passado, 2526 pessoas morreram em operações da PM. A confirmarem-se estas estimativas, as mortes em confrontos com a polícia terão quase duplicado num ano, desde as 1231 vítimas contabilizadas em 2013. 

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