Abandonar o marxismo, apoiar a NATO: as crises do PSOE

Os socialistas espanhóis passaram por vários momentos de instabilidade ao longo dos últimos 40 anos, motivados por questões ideológicas ou simples desejo de poder.

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Pedro Sánchez, o protagonista da mais recente crise do PSOE Javier Barbancho / Reuters

O Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE) atravessa uma das crises mais profundas desde a Transição espanhola – o período após a morte de Franco (1975) em que o regime político passou da ditadura à democracia multipartidária. O diário El País, próximo dos socialistas, diz mesmo que o momento actual é o pior da história do partido. Mas a vida interna do PSOE tem sido pontuada por momentos de ruptura, lutas fratricidas e divisões internas.

A primeira crise acontece logo nos primeiros anos de democracia em Espanha. Em 1979, o PSOE acabava de perder novamente as eleições para a União do Centro Democrático, liderada por Adolfo Suárez, e foi lançado um debate interno para determinar o rumo ideológico a dar ao partido. O líder socialista, Felipe González, privilegiava uma deslocação para o centro do espectro político e um abandono da matriz abertamente marxista reafirmada no congresso de 1976.

Sem conseguir fazer valer a sua vontade, González apresenta a demissão após o 28.º congresso do PSOE, em 1979, deixando o partido nas mãos de uma comissão de gestão. Porém, os “vencedores” da ala marxista não conseguiram segurar as bases do PSOE, para quem González era o homem indicado para levar o partido ao poder. Quatro meses depois, em Setembro de 1979, é marcado um congresso extraordinário que reconduz González à liderança, agora incontestada. Sob a liderança do andaluz, o PSOE chega finalmente ao poder após as eleições gerais de 1982, ganhas com uma maioria recorde.

González viria a protagonizar uma nova crise interna no PSOE. Em 1984, a sua tarefa no 30.º congresso era convencer o partido a mudar uma das posições charneira do seu ADN ideológico – a manutenção de Espanha na NATO. Os socialistas tinham liderado a oposição à integração da Espanha na Aliança Atlântica, feita em Maio de 1982. À frente do Governo, González prometeu um referendo que, em plena Guerra Fria, causou calafrios entre os aliados, mas acabou por fazer campanha pelo “sim”, saindo vencedor por uma curta margem. Uma vez mais, o líder socialista vencia uma batalha contra a herança ideológica do próprio partido.

A saída de González, na ressaca da derrota nas eleições gerais de 1996, levou o PSOE a um vácuo na liderança. Joaquín Almunia foi eleito secretário-geral e decidiu convocar, pela primeira vez na história do partido, eleições primárias para escolher o candidato a presidente do Governo. O objectivo era que o preferido do aparelho partidário e da maioria dos “barões” socialistas, Almunia, conseguisse cimentar a sua legitimidade perante as bases órfãs de González. O exercício saiu furado e os militantes elegeram Josep Borrell, um ex-ministro de González, dando-se a situação bizarra de um partido cujo líder não era o candidato às eleições.

Sem conseguir reunir apoios entre a cúpula do PSOE, e à boleia de um escândalo que envolveu dois antigos colaboradores, Borrell é forçado a afastar-se e a dar lugar a Almunia. As bases socialistas não perdoaram e castigaram nas urnas a escolha dos “barões”, acabando por dar a vitória nas eleições gerais de 2000 ao PP de José María Aznar.

Com Pedro Sánchez na liderança desde 2014, o PSOE esperava regressar ao poder após quatro anos da mais dura austeridade imposta pelo PP de Mariano Rajoy. Mas a colecção de derrotas – que inclui duas eleições gerais, eleições municipais e, mais recentemente, eleições autonómicas na Galiza e no País Basco – enfraqueceram a posição interna de Sánchez, cada vez mais sob pressão para abandonar a liderança dos socialistas.

 

 

 

 

 

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