A vida em Zaatari pelos olhos de quem lá vive

Refugiados do campo de Zaatari, na Jordânia, usam as redes sociais para contarem a sua vida em imagens.

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Save the Children

É um dos maiores campos de refugiados do mundo, um lugar para onde a guerra atirou dezenas de milhares de pessoas e onde a saudade mora ao lado da esperança. Em Zaatari, no Norte da Jordânia, paredes-meias com a terra queimada em que se transformou a Síria, cabem pelo menos 81.000 pessoas, mas já foram muitas mais.

Encurralados entre a barbárie e a miragem de uma vida normal na Jordânia, ou noutro país qualquer, alguns jovens fazem das redes sociais a sua janela para o resto do mundo, por onde saem vídeos e fotografias que contam sem palavras como é a vida neste purgatório que as Nações Unidas tentam transformar todos os dias num sítio cada vez mais distante do inferno.

"Período entre 16 e 30 de Novembro: 179 recém-nascidos registados em Zaatari, um total de 82.328 refugiados no campo, 50% mulheres e 50% homens."

A informação chegou ao resto do mundo nesta quarta-feira, na forma de um tweet, partilhado na conta @ZaatariCamp, criada em Outubro de 2013 por Nasreddine Touaibia, um funcionário do gabinete de relações públicas do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR).

"Somos o primeiro campo a ter uma presença nas redes sociais", disse Touaibia à agência noticiosa AFP. "É uma forma de tocar directamente as pessoas, de lhes recordar que esta tragédia não acabou e que precisamos de ajuda."

Na terça-feira, um outro tweet disparado por Nasreddine Touaibia e a sua equipa acertava em cheio na consciência daquilo a que se convencionou chamar "comunidade internacional": "1,7 milhões de refugiados sírios vão ficar à mercê da fome. O nosso presidente António Guterres apela ao envio imediato de fundos para o Programa Alimentar Mundial."

Mas a vida em Zaatari é mais do que apenas um somatório de desgraças, como o PÚBLICO testemunhou em Setembro de 2013 e em Março de 2014 (ver Revista 2 de 6/10/2013 e PÚBLICO de 15/3/2014).

Dos mais de 80.000 refugiados (já chegaram a ser mais de 150.000, em meados do ano passado), 57% têm menos de 18 anos de idade, de acordo com os números do ACNUR.

Durante uma semana, em Agosto deste ano, alguns deles receberam formação em fotografia e percorreram o campo de Zaatari de smartphones em punho, numa iniciativa da organização Save the Children e do fotojornalista Michael Christopher Brown, da agência Magnum.

"Na maioria das vezes, o campo é fotografado por repórteres estrangeiros, sempre a partir da perspectiva de alguém que vem de fora. Eu disse-lhes: 'Mostrem-me o que vocês vêem, que eu não consigo ver; mostrem-me como é a vida real aqui, que o mundo exterior não consegue ver'", disse Michael Christopher Brown, citado num trabalho da BBC a partir do material disponibilizado pela Save the Children.

O projecto, chamado Inside Zaatari (no interior de Zaatari), pode ser visto noutra rede social, o Tumblr, no endereço http://insidezaatari.tumblr.com/. A vida no campo de refugiados já chegou também ao Vine, uma rede social para partilha de vídeos com um máximo de seis segundos.

Michael Christopher Brown, um fotojornalista norte-americano de 36 anos, é conhecido pelo seu trabalho com smartphones, que já usou para retratar conflitos sangrentos em países como o Congo ou a Líbia. Desta vez, a ideia era captar os conflitos internos de quem vive no campo de Zaatari, por quem vive no campo de Zaatari.

"Não temos tantas opções quando tiramos fotografias com um telemóvel como quando usamos uma câmara, mas podemos usar sempre a nossa imaginação. Muitas vezes, quando deixamos a nossa imaginação à solta, não precisamos de uma máquina complicada. Nessa perspectiva, um telemóvel é tão bom como uma câmara", considera Brown.

Talvez por isso, quando a câmara se encontra com a vida diária no campo de refugiados de Zataari, o resultado é uma viagem sem sair do mesmo sítio, como deixa perceber uma das crianças que participaram no projecto, e cuja identidade foi protegida: "Desde pequeno que o meu sonho é ser fotógrafo e viajar pelo mundo. Gosto da ideia de documentar a vida dos sírios aqui no campo, para mostrar ao mundo a miséria que há aqui e na Síria. Através da câmara, consigo ver as coisas com mais clareza do que é habitual, como as emoções das pessoas."

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