A história da lista secreta de 1991 gregos que deviam centenas de milhões ao fisco

Foto
O secretário-geral do PASOK, Evangelos Venizelos está a ser alvo de fortes críticas dentro e fora do seu partido Thierry Roge/REUTERS

O actual secretário-geral do PASOK, Evangelos Venizelos, teve conhecimento em 2011 de uma lista com os nomes de 1991 pessoas que tinham dívidas avultadas ao fisco grego, mas guardou-a para ele. A existência da lista foi tornada pública na semana passada, tal como uma outra, com os nomes de 36 políticos suspeitos de enriquecimento ilícito. Um deles suicidou-se nesta quinta-feira.

O que está em causa é a chamada "Lista Lagarde", porque foi a actual directora do Fundo Monetário Internacional, Christine Lagarde, na altura ministra das finanças francesa, quem entregou a lista dos 1991 a responsáveis gregos.

O documento foi parar à mãos de Giorgos Papakonstantinou, ainda em 2010, quando este era ministro das Finanças. A soma das dívidas dos 1991 milionários totalizavam 1500 milhões de euros, alegadamente não declarados às finanças, e depositados numa conta do banco britânico HSBC em Genebra, na Suíça.

Em entrevista recente ao Financial Times, Papakonstantinou revelou que na altura passou a lista, gravada num CD, à polícia financeira grega (SDOE). Este mesmo responsável, que assinou o primeiro memorando com a troika para a Grécia em Maio de 2010, sugeriu na mesma entrevista que o CD tinha desaparecido, dada a ausência de notícias acerca da "Lista Lagarde".

Questionado sobre estas declarações, o actual ministro das finanças grego, Yannis Stournaras, disse ao mesmo jornal especializado em assuntos económicos: "A primeira vez que soube da existência [da Lista Lagarde] foi esta semana pelos jornais. Se a SDOE não conseguir descobrir onde está o CD, então trataremos de pedir uma nova cópia aos nossos parceiros europeus."

Após dias de especulação, Evangelos Venizelos, actual secretário-geral do PASOK e sucessor de Papakonstantinou, confirmou em entrevista ao canal grego MEGA TV que tinha tomado conhecimento da "Lista Lagarde" em Agosto de 2011, um mês depois de assumir a pasta das finanças. O socialista disse na mesma entrevista que, na altura, estava mais preocupado com "salvar o país" do que com "controlar informação secreta"

Venizelos considerou a lista "ilegal"

Venizelos argumentou que o CD com a lista de 1991 nomes "não era um registo obtido e submetido pelas devidas vias legais e que, por isso, não podia ser sujeita a investigação e muito menos divulgada".

O socialista alegou que um qualquer uso questionável da "Lista Lagarde" poderia comprometer os esforços do Governo grego junto das autoridades suíças, no sentido de estas lançarem detalhes de contas bancárias de gregos que tenham contas na Suíça e que possam ser culpados de evasão fiscal e outros crimes financeiros.

O jornal grego Ta Nea avançou, por seu lado, que já aconteceu alguns governos europeus terem conhecimento de listas semelhantes e que, entrando em contacto com os alegados devedores fiscais, conseguiram que estes reembolsassem as finanças.

Foi assim em Espanha e em França, em que os governo receberam respectivamente 6000 milhões e 570 milhões de euros. Em França, conta ainda o Ta Nea, 4000 cidadãos pagaram voluntariamente aquilo que deviam ao Estado depois de lhes ter sido comunicado que estavam sob investigação.

Os depósitos bancários de gregos incluídos na Lista Lagarde chegarão a um total de 1500 milhões de euros. Os 1991 nomes estão a ser investigados, depois de Venizelos ter entregado o documento ao actual primeiro.ministro, Antonis Samaras (conservador), que por sua vez o passou para a SDOE.

O jornal grego Ethnos cita fontes que avançam que o documento em causa inclui contas de empresas de construção naval, nomes de homens de negócios judeus, outros homens e mulheres do mundo dos negócios e também um "antigo participante na vida política grega" que pertence ao partido Nova Democracia, o mesmo que está à frente do actual governo grego.

Syriza acusa Venizelos de "esconder os erros dos poderosos"

O silêncio de um ano e três meses de Venizelos está a sair-lhe caro. Aqueles que o criticam olham-no como uma peça essencial deste puzzle.

O militante do PASOK e antigo ministro das obras públicas e dos transporters, Yannis Ragousis, saiu do partido, criticando a "certeza que as autoridades tiveram em não atacarem a evasão fiscal e a severidade na mesma escala que usaram para reduzirem os salários e aumentarem os impostos" aos gregos.

Ragousis referiu ainda que as políticas gregas dos últimos 35 anos, incluindo as do PASOK, "levaram a Grécia à falência e a decadência moral da sociedade".

Alguns analistas políticos gregos estimam que mais militantes de peso se preparam para sair do PASOK em reacção às revelações feitas por Venizelos ao longo da última semana, desde que a Lista Lagarde veio a público.

A coligação Esquerda Radical (Syriza) lançou um comunicado na quarta-feira em que era criticado o silêncio de Venizelos, acusando-o de "manter estes dados numa gaveta enquanto o país teve duas eleições". O comunicado da Syriza classificava o comportamento de Venizelos como "desprovido de seriedade e politicamente inaceitável" e uma "prova de uma escolha política de atingir as classes mais fracas e de esconder os erros dos mais poderosos".

A outra lista

Paralelamente à "Lista Lagarde", surgiu na última semana também outra lista com os nomes de 36 políticos gregos suspeitos de enriquecimento ilícito. A imprensa grega avança que os 36 nomes já estavam a ser investigados pela SDOE. Até agora, nenhum deles foi acusado.

Porém, o documento tornou-se viral depois de ter sido publicada à revelia das autoridades num blogue. Dos 36 nomes, constam antigos ministros do PASOK e da Nova Democracia (ND), um ex-presidente da câmara municipal de Atenas pela ND e um antigo líder da Synaspismos (partido de esquerda que faz agora parte da coligação da Syriza).

Um dos visados na lista, Leonidas Tzanis, advogado, ex-deputado do PASOK e antigo vice-ministro do Interior foi encontrado enforcado na sua casa, há 24 horas.

(Notícia corrigida a 11 de Outubro. Leonidas Tzanis foi deputador pelo PASOK e não pela Nova Democracia, como se lia antes da correcção.)
Sugerir correcção
Comentar