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Uma forma de tentar contrariar o tempo

Arqueografia, de Nuno Matos Duarte: mais perto da ruína, da morte ou da vida?

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 É muito fácil perdermo-nos nas armadilhas de tempo espalhadas nas fotografias de Nuno Matos Duarte. Olhamos para elas e não sabemos bem se estão mais perto da ruína, da morte ou do florescimento, da vida. Temos dificuldade em encontrar um antes e um depois. E somos confrontados com o paradoxo de ver cristalizado um lugar que foi condenado à mudança. Na série Arqueografia, patente no Arquivo Fotográfico Municipal de Lisboa, o que vemos são imagens de uma obra em fase de construção, em progresso. No entanto, a sua representação visual pela fotografia confronta estes estaleiros com um fim, corta a linha de tempo que lhe garantia dinâmica e transformação.

A forma solene (majestosa, até certo ponto) como estes lugares inacabados e rudes são mostrados (como se fossem catedrais) orienta-nos para uma contemplação silenciosa, muito para lá da superfície fotográfica. Atira-nos para os campos da memória e da nostalgia, leva-nos a procurar o início de alguma coisa, de um lugar. A Arqueografia que é proposta por Nuno Matos Duarte (mais um arquitecto a utilizar a fotografia como forma de expressão visual) usa cenários “novos” (contrariando a etimologia da palavra grega arkhaíos, que significa início, primitivo, antigo) para lembrar como a arquitectura procura alcançar a eternidade. Ou seja, duas artes à procura de sair dos limites do espaço e do tempo. E uma forma de nos dizer que todos os lugares podem aspirar a ser belos.

A exposição montada na sala de leitura do Arquivo mostra toda a série de imagens deitada sobre mesas. É uma opção eficaz, paradoxal e provocadora, porque nos atira para a experiência do efémero — curvamo-nos como se estivéssemos a ver uma maquete, uma obra em construção, mas num suporte que é definitivo, pelo menos na captura de um momento particular.

A única imagem que foi separada das restantes onze reproduz uma superfície de cimento, sublinhando a noção de solidez dos materiais usados pela arquitectura na sua luta por nunca chegar a um fim. À sua frente, no chão encostada a uma parede, foi colocada a peça de cimento que lhe deu origem, a sua matriz, num jogo que explora o confronto directo entre imagem e realidade. Um bloco que serve também para nos recordar a importância da experiência sensorial da textura em fotografia. Um recurso que Arqueografia explora de maneira soberba.