Prevenção de incêndios florestais é a nova tarefa do burro mirandês

O gado asinino ganha um novo fôlego num projecto que recorre ao burro mirandês para prevenir incêndios florestais na região do Rio Sabor.

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De um lado está uma espécie que poderá não existir daqui a 50 anos, que já poucos criam pois não lhe atribuem utilidade. Do outro estão terrenos carregados de combustível, prontos a arder. Conjugar estes dois problemas pode vir a constituir-se como uma das soluções para os resolver, anulando-se mutuamente. A ideia é colocar o burro mirandês a pastar em determinadas áreas, criando faixas contínuas de terreno limpo que servem de barreiras naturais aos incêndios - sem mato, não têm como progredir. A experiência vai estar no terreno no próximo ano.

A responsabilidade do projecto está nas mãos da Associação para Estudo e Protecção do Gado Asinino (AEPGA) e da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD) que, recentemente, divulgou um estudo dando conta da ameaça de extinção que pesa sobre o burro mirandês. Trata-se do aproveitamento de zonas agrícolas abandonadas, como lameiros e prados, onde os burros poderão alimentar-se e, ao mesmo tempo, “limpar” e impedir que estas faixas de terreno funcionem como combustível para a possíveis incêndios. “O abandono agrícola propicia os fogos florestais e a aptidão natural desta espécie para as ervas dos lameiros vem combater isso”, explica ao PÚBLICO Miguel Nóvoa, secretário técnico da associação.

O bem-estar animal é algo que AEPGA privilegia pelo que as zonas definidas ao longo do vale do Rio Sabor para o projecto, já foram limpas e preparadas para receber os animais. “Os burros são uma espécie fácil de domesticar, mas não deixamos de assegurar a água e os suplementos alimentares necessários”, garante Miguel Nóvoa. A preocupação em desenvolver estudos sobre a espécie  de forma a melhor "conhecer o animal" e encontrar soluções para evitar o seu desaparecimento tornou óbvia a parceria com o Departamento de Ciência Veterinária da UTAD.

O projecto-piloto pretende estar no terreno durante o Outono e a Primavera, prevendo-se colocar cerca de 10 animais por cada hectare. As chamadas “faixas de redução de incêndio” vão impedir que, caso um fogo deflagre em alguma região, a zona "lavrada pelos burros" funcione como uma possível “barreira”. A Associação para Estudo e Protecção do Gado Asinino, que reúne criadores e admiradores deste gado, vai disponibilizar alguns dos seus animais para participarem nesta iniciativa.

A utilização de animais no combate aos incêndios não é inédito. Há já várias experiências a decorrer no país com recurso a cabras. O objectivo é o mesmo: diminuir a carga combustível em terrenos considerados cruciais na evolução - ou não - do fogo. Por isso, é necessário um acompanhamento técnico - no caso facilitado pela UTAD - para que a acção decorra em zonas que podem servir de tampão à evolução das chamas.

Acresce uma outra vantagem: a redução de custos na criação destes animais. Os burros que normalmente se alimentam em lameiros particulares, podem agora garantir parte da sua alimentação diária em zonas desaproveitadas. Assim, tenta-se também combater o abandono progressivo da criação destes animais que é, segundo o estudo de Miguel Quaresma, médico veterinário  da UTAD, o problema que mais ameaça a preservação da espécie. Estimam-se em “600 indivíduos a população reprodutiva, que está envelhecida, onde menos de metade das fêmeas de raça pura registadas pariram e algumas pariram uma única vez”, sustenta o investigador.

A par da economia, vem a manutenção da paisagem e a colocação do animal ao serviço do ecossistema. “A maioria das pessoas desconhece a importância que o burro mirandês tem na salvaguarda dos terrenos agrícolas”, argumenta o membro da AEPGA, lembrando que este bicho vai onde o tractor não vai e de uma forma muito menos agressiva para o chão que pisa.

É esperado que o projecto tenha início no terreno, na Primavera de próximo ano.

Texto editado por Ana Fernandes

 

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