Pagou por urna com ossadas da avó para provar que há corrupção no cemitério

Um casal e um coveiro estão acusados de corrupção activa e passiva e profanação de cadáver. Em causa está uma urna retirada do cemitério de Alverca.

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Coveiro foi suspenso por quatro meses depois de confessar o crime Sérgoi Azenha/Arquivo

Um manobrador de máquinas confessou nesta segunda-feira que levou uma urna com ossadas da avó para casa para tentar provar que haveria “corrupção” no cemitério de Alverca e que não há segurança quanto ao controlo das ossadas ali depositadas. O homem e a companheira estão a ser julgados no Tribunal de Vila Franca de Xira, acusados de subornarem o coveiro, também arguido, para que este trocasse a urna de uma familiar com a de outra pessoa, com o intuito de pedir uma indemnização à Junta de Freguesia de Alverca por erro dos serviços.

O manobrador de máquinas, Ricardo Conceição, de 31 anos, está acusado de corrupção activa e profanação de cadáver. Sentou-se no banco dos réus com a mulher, Ana Sofia, operadora de caixa de supermercado de 28 anos, acusada dos mesmos crimes, e o coveiro do cemitério de Alverca, José Basílio, acusado de corrupção passiva e co-autoria na profanação de cadáver.

Os factos remontam a Julho de 2011, quando o casal residia em Alverca. Ricardo Conceição pagou 100 euros ao coveiro para que este lhe entregasse uma urna com as ossadas da avó. José Basílio diz que se deixou levar pelo manobrador de máquinas e que aceitou o dinheiro porque o ordenado é “fraco”. Mas Ricardo Conceição garantiu que desconhecia por completo que era crime retirar as ossadas de um familiar nestas condições de um cemitério, afirmando que entregou os 100 euros apenas num “acto generoso” porque o coveiro se queixara de dificuldades financeiras.

Ricardo Conceição disse em tribunal que descobriu, em 2009, que a urna com as ossadas da sua avó tinha desaparecido. Alertou a junta de freguesia e participou o caso à PSP, que abriu uma investigação. A urna voltou a aparecer 15 dias depois, mas Ricardo diz que a junta nunca lhe deu qualquer tipo de explicação para o sucedido. “Fiquei um pouco transtornado e resolvi demonstrar que, no cemitério de Alverca, existem pessoas assim e que é possível ocorrerem estas situações de troca de urnas. A intenção foi também mostrar que há lá dentro pessoas que são corruptas”, afirmou.

José Basílio explicou que a urna tinha estado desaparecida porque uma senhora, anterior detentora do ossário, terá usado uma chave que ainda possuía e retirado a urna, pensando que continha as ossadas do marido. Segundo referiu, isto foi feito sem conhecimento dos coveiros e, só alguns dias depois da reclamação do manobrador de máquinas é que a urna com as ossadas da sua avó foi encontrada no chão, junto a um canteiro.

Em Setembro de 2011, a advogada de Ricardo Conceição escreveu ao executivo da Junta de Freguesia de Alverca, com o qual esteve reunida duas vezes, explicando que o seu cliente estava revoltado com a forma como a urna com as ossadas da avó havia desaparecido em 2009. Afirmou ainda que pretendia que fizessem um teste de ADN para confirmar a autenticidade das ossadas e que iria levar o caso a tribunal, pedindo uma indemnização de alguns milhares de euros por danos morais, o que acabou por acontecer. O processo está em curso no Tribunal Administrativo de Lisboa.

A causídica admitiu que a questão poderia ser negociada, mas a junta não aceitou fazer nenhum acordo, tendo procurado saber o que se passava. O coveiro acabou por confessar ter recebido os 100 euros e foi alvo de um processo disciplinar que resultou em quatro meses de suspensão do serviço.

Nesta segunda-feira depôs também Berta de Jesus, coordenadora técnica da Junta de Alverca, que garantiu que qualquer movimento de ossadas no cemitério tem que ter um registo e uma autorização. A funcionária observou que não sabe se a urna terá estado desaparecida durante essas duas semanas.

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