OE para 2016 permite às freguesias terem mais eleitos a tempo inteiro

A proposta em discussão prevê também que os presidentes de junta possam subdelegar competências noutros eleitos ou em dirigentes autárquicos. A Anafre sublinha que não será aumentada a despesa pública.

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Rui Gaudêncio

A proposta de Orçamento do Estado (OE) para 2016 dá resposta àquela que era uma velha reivindicação de muitos autarcas do país, pela qual a Associação Nacional de Freguesias (Anafre) se vinha batendo nos últimos anos: abre a porta a que freguesias com determinadas dimensões possam passar a ter um ou dois eleitos, além do presidente da junta, a exercer o seu mandato em regime de tempo inteiro.

Actualmente a lei que estabelece o regime jurídico do funcionamento das freguesias define que naquelas que têm entre cinco mil e dez mil eleitores o presidente da junta (ou o vogal em quem ele delegue) pode exercer o seu mandato em regime de meio tempo e com meia remuneração. Já nas freguesias com mais de dez mil eleitores esse mandato pode ser exercido a tempo inteiro, com o vencimento previsto na lei. Em 2015, os vencimentos dos eleitos das freguesias a desempenhar funções a tempo inteiro oscilavam entre 1220 euros mensais, mais 355 para despesas de representação, e 1907 euros, mais 555 para despesas de representação, consoante o número de eleitores. Isto no caso de as funções serem exercidas em excluividade. Em caso contrário, os abonos eram reduzidos para metade.  

Ora, a proposta de OE para este ano prevê que as freguesias com um número de eleitores até 1500 possam ter um eleito a meio tempo e que as que têm um número de eleitores superior a esse e inferior a dez mil possam ter um a tempo inteiro.

Mas há mais: as freguesias com mais de dez mil eleitores passarão a poder ter dois eleitos em regime de tempo inteiro e as que têm mais de 20 mil eleitores passarão a poder ter três.

Em declarações ao PÚBLICO, o presidente da Anafre sublinha que aquilo que se lê na proposta de OE “é ipsis verbis” aquilo que a associação propunha e que tinha já proposto ao anterior Governo e aos diferentes grupos parlamentares.

Pedro Cegonho frisa também que as alterações em cima da mesa “não têm impacto no défice do Estado”, uma vez que está estabelecido que os encargos anuais delas decorrentes serão suportados pelos orçamentos da freguesias. Houve, conclui, “o bom senso de não aumentar a despesa pública”. 

O autarca socialista destaca que a proposta de OE contempla uma outra modificação relevante para o funcionamento das freguesias: passa a permitir que os presidentes de junta subdeleguem determinadas competências “em qualquer dos vogais ou em titulares de cargos de direcção intermédia”, algo que até aqui era impossível.

“É o quadro mais razoável, até por uma questão de estabilidade, de ficar para o futuro”, considera Pedro Cegonho, salvaguardando que “as freguesias podem não utilizar tudo o que a lei permite”. “Há latitude para se poder avaliar caso a caso as necessidades”, diz, explicando que caberá a cada junta de freguesia fazer essa avaliação e decidir pela atribuição de mais tempos inteiros, caso a proposta de OE venha a ser aprovada.

No caso concreto de Lisboa, município que promoveu recentemente uma reorganização administrativa que se traduziu na atribuição de novas competências às juntas de freguesia, havia cada vez mais as vozes a defender a necessidade de haver mais eleitos a exercer os seus mandatos em regime de tempo inteiro.

Isso mesmo ficou patente em várias recomendações aprovadas na Assembleia Municipal de Lisboa. Na mais recente, datada de Janeiro, recomendava-se à Câmara de Lisboa que promovesse diligências junto do Governo no sentido de “permitir mais um tempo inteiro para um membro da junta de freguesia, bem como a possibilidade de o presidente delegar competências, procurando assim resolver a situação de excessiva concentração de responsabilidades executivas”. 

Em declarações ao PÚBLICO, a presidente da Junta de Freguesia de Benfica, que é uma das mais populosas de Lisboa, congratulou-se com as alterações previstas na proposta de OE. “Finalmente”, comentou a autarca do PS, considerando que se veio dar resposta àquela que era “uma necessidade imperiosa”.

“A delegação de competências também é fundamental”, acrescentou Inês Drummond, notando que hoje os presidentes de junta são obrigados a “assinar todos os papelinhos”, incluindo os mapas de férias de todos os funcionários e documentos relativos à compra de “parafusos e lâmpadas”.

“É uma excelente notícia”, reage por sua vez o presidente da Junta de Freguesia de Carnide, que fala numa “vitória” e numa “conquista para a Anafre”.

Sublinhando que as freguesias de Lisboa são “muito grandes” e têm “muitas competências”, Fábio Sousa constata que os presidentes de junta passam hoje boa parte do seu dia-a-dia “a apagar fogos”. “Parecemos os bombeiros de serviço. Muitas vezes não há tempo para reflectir”, admite o autarca do PCP, que aplaude por isso a possibilidade de haver subdelegações de competências noutros eleitos e em dirigentes autárquicos.

Já o presidente da Junta de Freguesia da Estrela mostra-se satisfeito mas defende que “impor uma condição transversal” não é o mais adequado. Para Luís Newton, cada freguesia devia poder decidir quantos tempos inteiros pretende ter.

Apesar de tudo, o eleito social-democrata considera que as alterações em cima da mesa poderão contribuir para que os autarcas “comecem a ser profissionais”, numa altura em que não é admissível que juntas com a dimensão das de Lisboa tenham “uma estrutura amadora”. “Algumas têm orçamentos superiores a muitas câmaras do país”, remata.   

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