“Ninguém esperava que a onda crescesse daquela maneira”

Golpe de mar fez quatro feridos e danificou cerca de duas dezenas de automóveis na Foz do Porto.

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As ondas da Foz surpreenderam que estava a admirar a violência do mar cortesia António Ricca
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As ondas da Foz surpreenderam que estava a admirar a violência do mar cortesia António Ricca
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As ondas da Foz surpreenderam que estava a admirar a violência do mar cortesia António Ricca
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Cerca de duas dezenas de carros foram atirados uns contra os outros pelo mar cortesia António Ricca

A voz de Esmeralda Silva não pára de tremer, enquanto remexe na carteira, à procura dos documentos que tem de entregar ao reboque que acaba de levar o seu Peugeot azul, todo amolgado, para longe da Esplanada do Castelo, na Foz do Porto.

A viatura é uma das cerca de vinte apanhadas pela força avassaladora de uma onda que atravessou toda a via, arrastando pessoas, carros e até um autocarro turístico, que estavam no local. Há quatro feridos, sem gravidade. O Restaurante Shis ficou, segundo várias fontes, completamente destruído.

Esmeralda, de 53 anos, gosta de fotografar o mar quando está bravo e lança ondas furiosas contra o farol, perto do Forte de S. João Baptista da Foz. Era isso que estava a fazer, na tarde desta segunda-feira, pelas 16h, quando o mar cresceu mais do que aquilo que se esperava. “Foi uma onda fora de comum. O meu carro estava estacionado do lado do forte e, mesmo assim, foi arrastado. Eu vi a onda a crescer e a chegar ao relvado. Venho fotografar muitas vezes, mas tenho cuidado e sentia-me segura. Ninguém esperava que a onda crescesse daquela maneira”, diz ao PÚBLICO.

Mário Vieira e o colega Valeriano Meireles também sentiram na pele e força do mar. Tinham acabado de entrar no carro do último, para abandonar a Esplanada do Castelo, quando um autocarro turístico, apanhado pela onda gigante, chocou com a viatura dos dois amigos. “Rodopiámos e não conseguíamos ver nada, porque ficámos completamente tapados pela onda. Vimos pessoas a serem atiradas pela água e uma molhada de carros a bater uns contra os outros, tudo num espaço de dez ou 15 segundos”, conta Mário Vieira.

Os dois amigos viveram-no e António Ricca fotografou tudo. O portuense tinha, como tantos outros, escolhido a marginal para fotografar a força do mar e estava na Esplanada do Castelo quando, à sua frente, viu o mar explodir para cima de carros e pessoas, arrastando algumas para debaixo das viaturas, fazendo os carros “boiar como barcos”. “Sentíamo-nos todos muito seguros, mas a verdade é que fomos surpreendidos. As pessoas foram arrastadas, os carros andaram em várias direcções a chocar uns contra os outros”, conta o homem de 59 anos. A sua máquina fotográfica registou a hora a que a onda semeou o caos na zona: 16h03.

O vereador da Protecção Civil da Câmara do Porto, Sampaio Pimentel, esteve no local e confirmou a existência de quatro feridos – duas pessoas ficaram com escoriações, por terem sido arrastadas pelas águas, e outras duas sofreram de hipotermia. Por precaução, o Centro Social da Foz do Douro foi evacuado, pelas 17h30. Os familiares das crianças do jardim-infantil foram alertados para ir buscá-las mais cedo e alguns idosos também foram retirados do local. Às 17h30, Maria Teresa Teixeira deixava o edifício junto à marginal com os netos de um e três anos. “Lá dentro está tudo bem, mas pediram-nos para vir buscar os meninos mais cedo. Nunca vi nada assim aqui, mas de facto tinham avisado para temporal, a nível nacional”, disse.

Na página da Protecção Civil, um aviso à população alertava para a “agitação marítima forte com ondulação de Noroeste que poderá atingir os 16 metros na costa ocidental Norte e Centro e 14 a 15 metros na região Sul até às 24h” de segunda-feira. Uma situação que apontava para, entre outros efeitos, “possíveis acidentes na orla costeira”. Ainda assim, no Porto, ninguém esperava que o mar se agigantasse desta maneira. Disso mesmo deu conta ao PÚBLICO Sampaio Pimentel, no local do acidente. “Isto foi uma situação completamente inesperada. Depois da construção dos molhes é a primeira vez que acontece. Há uns dois ou três anos uma onda galgou o muro, mas não foi nada como esta. Temos de ter muito respeito pelas forças da natureza. As pessoas sabem que este é um local tradicionalmente difícil e perigoso, e têm de ter cuidado”, disse.

Depois do acidente, o trânsito foi cortado na marginal, na Esplanada do Castelo, na Rua do Coronel Raul Peres e na faixa mais perto do mar da Avenida do Brasil. Sampaio Pimentel garantiu que os condicionamentos de trânsito iriam continuar até às 10h desta terça-feira, altura em que a situação seria reavaliada.

Apesar do acidente da tarde, pelas 18h30, a meia hora do pico previsto da maré, ainda havia vários curiosos colados às fitas de protecção da polícia, junto ao Forte de S. João. A poucos metros dali, no passeio, amontoavam-se mesas, cadeiras e alguma louça que os funcionários tinham conseguido retirar do Restaurante Shis, na praia do Ourigo. Lá em baixo, garantiram várias fontes, estava tudo destruído.

A forte agitação marítima levou ao corte de vias na orla costeira em várias zonas do país, de Matosinhos à Costa da Caparica e ao Carvoeiro, no Algarve. Na Póvoa de Varzim e em Espinho, vários bares ficaram danificados pelo mar. Previa-se que a agitação marítima, com ondas muito fortes, continuasse ao longo da noite. 
 
 
 
 

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