Maia testa sistema em que munícipes só pagam o lixo que produzem

Projecto-piloto custa 400 mil euros e vai abranger 1100 habitações. Em Óbidos e em Portimão, falta financiamento para avançar com sistemas semelhantes.

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Projecto da Lipor e Maiambiente visa reduzir produção de resíduos e fomentar a reciclagem Ana Maria Coelho/Arquivo

A partir de meados de Abril, os moradores da zona do Lidador, na freguesia de Vila Nova da Telha, na Maia, vão testar um sistema em que pagam pela quantidade exacta de lixo que produzem, em vez da taxa indexada à factura da água.

Este projecto-piloto, baseado no sistema Pay as you throw” (PAYT) – qualquer coisa como “pague à medida que deita o lixo fora” –, vai abranger cerca de 1100 habitações, num total de 3500 pessoas. Resulta de uma parceria entre a Lipor e a Maiambiente, empresas responsáveis pela recolha dos resíduos naquela zona, e assenta no princípio do poluidor-pagador.

Basicamente, quanto mais lixo um habitante produzir, mais paga. Segundo o coordenador do projecto, Paulo Rodrigues, em cada habitação serão entregues quatro contentores (para o lixo indiferenciado, o plástico, o vidro e o papel), equipados com sistemas que permitem pesar a quantidade de resíduos depositados e identificar o utilizador, através de um cartão.

No caso dos prédios, continuarão a ser usados os contentores para a deposição selectiva, devidamente equipados. Também os contentores colocados na via pública vão ter sistemas de deposição controlada com identificação do utilizador. O sistema contempla alternativas para as pessoas com dificuldades motoras e que habitem em casas de difícil acesso para o carro de recolha de lixo.

De cada vez que um morador deita no contentor o lixo indiferenciado (os recicláveis não têm qualquer custo), fica registada a quantidade depositada e, no fim, é-lhe cobrado um valor em função do peso. Isto não significa, garante Paulo Rodrigues, que irá pagar mais. “Muito pelo contrário, o objectivo principal de um projecto PAYT é potenciar a prevenção e reciclagem dos resíduos, compensando as boas práticas ambientais”, afirma. 

Sistema “justo e equitativo”

Actualmente, o preço a pagar pela recolha dos resíduos urbanos depende do consumo de água, o que não reflecte o custo real do serviço: os consumidores pagam cerca de 30% desse custo, ficando o restante a cargo das autarquias. O sistema PAYT, cuja implementação está prevista no Plano Estratégico para os Resíduos Sólidos Urbanos, é “justo e equitativo”, sublinha Paulo Rodrigues.

O custo por quilo de lixo ainda não está definido, mas é certo que “quanto mais separarem os resíduos maior será a optimização e eficiência de todo o sistema”, refere o coordenador do projecto, que espera apresentar resultados da experiência no último trimestre deste ano.

O projecto representa um investimento de 400 mil euros, dos quais 300 mil são financiados através de uma candidatura feita ao abrigo do Plano Nacional de Gestão de Resíduos, referiu à Lusa a Agência Portuguesa do Ambiente (APA). Segundo esta entidade, o projecto da Lipor e Maiambiente foi o único candidato à linha de financiamento destinada a iniciativas que contribuam para os objectivos nacionais na gestão de resíduos.

Projectos de Óbidos e Portimão na gaveta

A Câmara de Óbidos, porém, garante que também pediu financiamento à APA, em 2009, mas até hoje não obteve resposta. “Foi feita uma candidatura para a componente imaterial, que diz respeito às campanhas de sensibilização, a sistemas de simulação e monitorização da população abrangida, mas não tivemos resposta”, afirma o vereador do Ambiente, Humberto Marques.

O apoio pedido à APA, no valor de 80 mil euros, é fundamental para avançar com o projecto PAYT no concelho, que implica um investimento total de 700 mil euros, para abranger 7000 habitações e 12 mil pessoas. “Aguardávamos a resposta da APA para apresentar outra candidatura a fundos comunitários para a componente material”, afirma Humberto Marques. Por agora, o projecto, cujo funcionamento seria semelhante ao da Maia, continua na gaveta.

O objectivo da autarquia era manter os dois tipos de facturação numa fase inicial. “Nos primeiros meses, os moradores continuariam a pagar a tarifa indexada ao consumo de água, mas seria feita a pesagem e a simulação do custo em função do peso”, explica o vereador. “Assim iriam perceber que não pagariam mais, mas sim ou mesmo ou até menos. Como? Mudando hábitos e fazendo uma melhor separação do lixo, reciclando, fazendo compostagem”, refere.

No caso de Portimão, onde também se pretende avançar com um modelo baseado no princípio do poluidor-pagador, o funcionamento seria diferente. “Temos um sistema de recolha através de ilhas ecológicas na via pública preparado para funcionar com o sistema PAYT”, explica fonte do gabinete da presidência da autarquia.

Os moradores teriam um cartão identificativo, através do qual poderiam aceder aos contentores instalados nas ilhas ecológicas, e pagariam consoante a quantidade de lixo depositada. Neste caso, evita-se o custo com contentores individuais e com a recolha porta a porta. Para avançar, falta ter todo o concelho coberto com o sistema de ilhas ecológicas. Mas também aqui falta dinheiro para concretizar a ideia.

Apesar dos custos inerentes à aplicação de um sistema deste género, a Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos (ERSAR) reafirma a necessidade de apostar nesta solução, já utilizada em vários países da Europa. “Queremos evoluir claramente para um modelo no qual a produção de resíduos seja medida por consumidor e incentive uma prática ambiental mais correcta. No entanto, há que resolver problemas tecnológicos e de custos associados”, explicou à Lusa o presidente daquela entidade, Jaime Melo Baptista.

O objectivo é ter, ainda este ano, “uma posição e uma recomendação no sentido de os operadores evoluírem da actual situação em que estimam produção de resíduos para uma desejável futura situação em que medem a produção de resíduos”, disse o presidente da ERSAR à Lusa. Acrescentou que "é preciso encontrar soluções que sejam fiáveis, que dêem confiança à sociedade, aos operadores, a todos”, que evitem a fraude. 

Nesta quarta-feira foi discutida na Assembleia da República uma proposta em que o PSD e o CDS/PP recomendam ao Governo a aplicação do sistema PAYT, como sugere um estudo da Comissão Europeia sobre Prevenção e Reciclagem de Resíduos. Com este modelo, "é possível reduzir a quantidade de resíduos enviada para aterro e os habitantes podem reduzir a sua factura de resíduos", salienta o deputado Bruno Coimbra, do PSD. A proposta, que será votada na sexta-feira, mereceu já o aplauso da associação ambientalista Quercus, que considera “injusto” o sistema actual, pois “trata igualmente todos os cidadãos independentemente de separarem ou não os materiais para reciclar".

O Partido Ecologista Os Verdes também apresentou uma recomendação no sentido de serem promovidas formas e meios de redução ou prevenção de resíduos.
 
 
 

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