Lisboa: arquitectos projectam Ribeira das Naus "contemporânea" mas que revela a história

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As áreas verdes para os peões devem ganhar espaço aos carros DR

Criar um novo espaço verde entre o Cais do Sodré e o Terreiro do Paço onde os utilizadores possam estabelecer uma relação "informal" e "descontraída" com o rio, proporcionando-lhes em simultâneo a hipótese de acederem a uma espécie de "óculo vertical" que revele a história do lugar, é uma das intenções que justificam a proposta dos arquitectos paisagistas João Nunes e João Gomes da Silva para transformar a zona da Ribeira das Naus.

O estudo prévio encomendado pela sociedade Frente Tejo aos ateliers PROAP e Global está concluído e já foi apresentado à Câmara de Lisboa. Prestes a arrancarem com o projecto de execução, os arquitectos dizem que o seu maior medo é que não haja debate e sublinham as vantagens de se avançar até à solução final "de forma muito dialogante".

"Lisboa contacta directamente com o rio em pontos muito exíguos", começa por explicar João Nunes, acrescentando que "isso faz com que a Ribeira das Naus seja um sítio tão inacreditavelmente singular". Tirando o Parque do Tejo e Trancão, que fica no Parque das Nações e foi projectado pelo gabinete do qual é director-geral, o PROAP, o arquitecto não se recorda de qualquer outro sítio "feito com o propósito de ligar a cidade ao rio".

Espaço "descontraído"

A frente ribeirinha entre o Cais do Sodré e o Terreiro do Paço será, segundo João Nunes, "sobretudo um espaço verde, descontraído", onde lisboetas e visitantes poderão estabelecer "um contacto informal, livre", com o Tejo. Para isso haverá "dois prismas relvados" junto aos edifícios da Marinha, numa evocação das rampas varadouro, outrora utilizadas pelas embarcações. Na margem do Tejo, contida entre dois pontões, haverá uma espécie de praia, uma rampa em pedra que, como explica João Gomes da Silva, constituirá "um plano suave que vai descendo para dentro de água".

A circulação automóvel passará a ser feita entre a praia e as duas plataformas relvadas. Os carros transitarão em duas vias paralelas ao rio, assinaladas dentro de uma mancha ziguezagueante em calçada de basalto com um recorte que corresponde à antiga linha de costa do local, cuja vocação industrial e naval só foi transformada nos anos 40 do século XX com o rasgar da Avenida Ribeira das Naus. A ideia, sintetiza João Nunes, é que este seja um espaço "fundamentalmente pedonal", no qual os carros circulem a uma velocidade baixa.

O "uso" da frente ribeirinha entre o Cais do Sodré e o Terreiro do Paço, sublinha João Gomes da Silva, será "perfeitamente contemporâneo", mas isso será feito em paralelo com a intenção de "revelar uma série de elementos históricos da cidade". Nesse sentido, será posta a descoberto a doca seca (construída em 1790) da qual actualmente apenas uma pequena parte está exposta, mas que os arquitectos esperam que esteja "íntegra". Também a estrutura da Doca da Caldeirinha, que de acordo com João Gomes da Silva foi "um dos elementos mais persistentes" deste lugar e remonta a 1500, vai ser retomada, passando a "assinalar o hiato" entre a Ribeira das Naus e o vizinho Terreiro do Paço, ultrapassável através de uma ponte para automóveis e peões.

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