Tribunal deu razão a empresa excluída no concurso para remoção dos resíduos de S. Pedro da Cova

Ministério do Ambiente recorreu para o Tribunal Central Administrativo do Norte. Há ainda uma providência cautelar de outra empresa à espera de decisão.

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LNEC avisou em 2012 que os resíduos ameaçam a saúde pública Adriano Miranda

O Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga (TAFB) declarou, a 4 de Novembro, que a exclusão da empresa ABB no concurso público para a remoção das 88 mil toneladas de resíduos perigosos depositados nas antigas minas de S. Pedro da Cova foi ilegal. Consequentemente, considerou também "inválida" a decisão do então Ministério da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento Território de adjudicar, a 10 de Julho de 2013, a empreitada à Ecodeal–Gestão Integral de Resíduos Industriais.

O Ministério do Ambiente, a Ecodeal e ainda a Semural-Waste & Energy, SA - empresa que também se apresentou a concurso - apresentaram recurso da decisão do TAFB para o Tribunal Central Administrativo do Norte. É mais um escolho num processo que, em todo o caso, já estava parado pela providência cautelar pedida pela Semural, que alega que a proposta da Ecodeal é omissa em relação a parte dos resíduos.

Em causa estão 88 mil toneladas de resíduos provenientes da antiga Siderurgia Nacional que, entre 2001 e 2002, foram depositados nas antigas minas de S. Pedro da Cova que, em 2012, o Laboratório Nacional de Engenharia Civil confimou serem muito perigosos para a saúde pública, por apresentarem teores elevados de chumbo, cádmio, arsénio e zinco.

O júri do concurso lançado pela Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte (CCDRN) excluiu a ABB-Alexandre Barbosa Borges por esta não ter apresentado uma declaração dos transportadores e operadores de gestão de resíduos que se propunha subcontratar, na qual estes deveriam afirmar que se comprometiam, incondicionalmente, a executar os trabalhos indicados. O TAFB concluiu que a falta de tal declaração – que a ABB entendeu só ser exigível numa fase ulterior (a da habilitação) – só justificaria exclusão da concorrente se tal consequência estivesse expressamente prevista na parte do Programa de Procedimento Concursal relativa aos documentos integrantes da proposta.

Orçada em 13 milhões de euros, a remoção dos resíduos beneficia de uma compartição a 85% de fundos comunitários, tendo cerca de nove milhões de euros reservados pelo Programa Operacional de Valorização do Território.
  
Ainda assim, o Estado português arrisca-se a ser sentado no Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) por não ter resolvido um problema de risco grave para a saúde pública a despeito das advertências comunitárias. É que a 20 de Novembro passado – 16 dias, portanto, após a decisão do TAFB – a Comissão Europeia avisou que Portugal tinha dois meses para remover os resíduos, sob pena de ter de responder perante o TJUE.

O aviso de Bruxelas foi noticiado pelo PÚBLICO e por outros meios de comunicação social, que pediram uma reacção à CCDRN. Então, e apesar da sentença emitida duas semanas antes, a CCDRN remeteu os órgãos de comunicação social para uma nota no seu site na qual afirmava apenas que estava “impedida de dar sequência ao processo” de remoção dos resíduos “devido ao pedido de impugnação e providências cautelares ao concurso público internacional interpostos pelas empresas Semural-Waste & Energy, SA e ABB - Alexandre Barbosa Borges SA que se apresentaram a concurso juntamente com outros 12 concorrentes". E nem uma palavra sobre a decisão do TAFB.

A falta de informação sobre os processos judiciais foi justamente uma das queixas que o presidente da União de Freguesias de Fânzeres e S. Pedro da Cova, Daniel Vieira, foi apresentar nesta terça-feira à Assembleia da República, em audiência na Comissão Parlamentar de Ambiente.

“Já deve haver resultados, estamos a falar de processos urgentes, e ninguém nos diz nada. Nem de que tratam os processos. Em Outubro, a Comissão Europeia deu dois meses a Portugal para resolver o problema e o prazo está a chegar ao fim”, declarou o autarca da CDU ao PÚBLICO, no final da audiência. Daniel Vieira contou que também tentara sensibilizar os parlamentares para o facto de ter sido prometido que a qualidade da água na freguesia seria finamente monitorizada, dado o receio de contaminação dos solos e lençóis freáticos, e que “nada foi dito entretanto à população ou à junta” sobre a matéria.

Daniel Vieira recordou que esta foi a terceira vez que foi à Assembleia da República chamar a atenção dos deputados para o problema. “Da primeira vez chamaram-me alarmista”. Depois do relatório do LNEC, a Assembleia da República aprovou em 2012, por unanimidade, uma recomendação ao Governo para proceder à remoção e tratamento dos mesmos. “Que fiscalização estão os deputados a fazer? A Assembleia da República deixou cair isto, deixou de acompanhar o problema, e tão responsável é quem depositou ali os resíduos [com autorização do Governo de então] como quem deixa que eles ali permaneçam”, protesta o autarca, convencido de que, desta vez, conseguiu sensibilizar os deputados para a importância da questão.

Notícia corrigida. Na primeira versão referia-se, erradamente, que os fundos europeus disponíveis para a remoção dos resíduos estavam perdidos por falta de utilização em tempo útil. Pelo erro, o PÚBLICO pede desculpa aos leitores e entidades envolvidas.
 

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