Em Almada, há contos aqui, ali e acolá

Na rua, nos cafés ou no mercado, vai ser muito provável “tropeçar” em contadores de histórias durante este fim-de-semana, “onde o Tejo se faz ao mar”.

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O mercado da Trafaria é um dos locais onde se ouvirão contos DR

Ir ter com as pessoas aos espaços que frequentam habitualmente e surpreendê-las com histórias com que se identifiquem é uma das ideias do Rio de Contos – O I Encontro de Narração Oral de Almada, com incidência no Monte da Caparica e na Trafaria.

“É um encontro virado para o território e para as pessoas comuns, por isso não acontece em auditórios, mas em espaços de circulação e convívio habituais”, explica Miguel Horta, da associação cultural Laredo, que organiza o Rio de Contos em parceria com a Câmara Municipal de Almada (e apoio da União de Freguesias de Caparica e Trafaria). Em todos os espaços, a entrada é livre.

Esta escolha geográfica decorre dos “trabalhos anteriores desenvolvidos com jovens, como os Sussurradores de Poesia [através de um tubo longo, sussurram-se pequenos poemas ao ouvido de alguém], de sessões de leitura com as comunidades locais cabo-verdianas, com muitos desempregados, e também da escuta de muitas pessoas mais velhas da comunidade que são muito engraçadas na sua forma de contar histórias”, descreve com entusiasmo “o pintor que se dedica à partilha e comunicação com o outro”, como Horta se descreve a si próprio. E tem um propósito muito claro: “Criar novos leitores.” Pormenoriza: “Usar a narração oral na perspectiva da mediação leitora. Queremos conquistar as pessoas para os livros e para a leitura.”

Serão cinco os locais de intervenção e partilha da palavra, “sítios genuínos, normalmente alheados destas práticas, e alguns onde é preciso alguma coragem para começar a contar”: dois cafés no Monte da Caparica (café-pastelaria Doce Impakto e Churrasqueira do Bairro); Mercado Municipal da Trafaria; Biblioteca da Trafaria (“onde o Tejo se faz ao mar”) e Biblioteca Municipal Maria Lamas (Monte da Caparica).

Haverá contadores mais experientes em contextos desta natureza e outros sobretudo familiarizados com “espaços protegidos”, como os serviços educativos das bibliotecas. Para que os narradores menos habituados a audiências alargadas e desconhecidas ganhem coragem de avançar, a organização aliou-os a “madrinhas” e “padrinhos” narradores com mais “currículo”.

Paula Cusati e Cláudia Sousa, mais experientes, serão por exemplo “madrinhas” dos contadores da Rede Municipal de Bibliotecas de Almada na sessão das 15h de sábado no Mercado da Trafaria.

Rio de Contos começa neste sábado às 11h, na Biblioteca Municipal Maria Lamas, com histórias para bebés, e no Mercado Municipal, com histórias para todos, pela voz de Miguel Horta e Ana Sofia Paiva. “O mercado não deixará de ser mercado”, diz o também mediador de leitura junto de públicos com necessidades educativas especiais. “Eu e o Thomas Bakk estaremos até nalgumas bancas de fruta”, antecipa, elogiando esse seu companheiro de partilha de histórias, que desafiou a integrar o projecto Leituras em Cadeia, promoção da leitura em estabelecimentos prisionais: “Eu vi o Thomas Bakk, com a sua arte e sabedoria, pôr uma série de reclusos tatuados a chorar. É preciso ser-se inteiro e saber muito disto.”

Comover-se, rir, chorar, partilhar histórias, estar frente a frente com pessoas diferentes de nós são situações que a narração oral propicia e que este encontro quer valorizar. Miguel Horta não quer deixar de destacar a Tertúlia da Palavra, marcada para as 17h de domingo, no Mercado Municipal, com “intervenientes de peso”: António Fontinha, Cristina Taquelim e Raquel Lima, com moderação de Maria José Vitorino.

Há uma história que só se poderá contar depois do encerramento do encontro. Como se irá integrar nas narrativas o som do sino da igreja junto do mercado, a que não se conseguirá baixar o som durante estes dois dias. “Toca de 15 em 15 minutos e, à hora certa, canta: ‘A 13 de Maio na Cova da Iria…”, trauteia Miguel Horta e diz, divertido, que será “um encontro com badaladas”. Depois, volta a falar da sabedoria do contador Thomas Bakk: “Não há contador de histórias que não tenha enfrentado o toque de um sino numa aldeia.” Provavelmente, irá cantar e dançar.

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