Cátedra de arqueologia na Universidade de Évora importante para conhecer o islão

Na vila de Mértola encontra-se uma completa e extensa biblioteca sobre o islão, a par de um espólio arqueológico sem paralelo, que permitem aprofundar o conhecimento sobre essa cultura para combater o fundamentalismo.

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Cláudio Torres Enric Vives-Rubio

A Universidade de Évora (UÉ) assina, nesta terça-feira, com o Campo Arqueológico de Mértola (CAM) a criação da Cátedra de Ensino em Arqueologia Cláudio Torres, que significa uma “homenagem ao excepcional trabalho” do arqueólogo que é Prémio Pessoa e a quem a UÉ atribuiu, em 2001, o título doutor honoris causa.  

No âmbito da cátedra “prevê-se que a intersecção entre as valências e competências existentes nas duas instituições se traduza num reforço da qualidade dos programas de ensino em Arqueologia”, acentua a UÉ, realçando ainda a “consolidação dos trabalhos de investigação conjuntos” que a assinatura do acordo possibilita.

Cláudio Torres disse ao PÚBLICO que um dos propósitos da criação da cátedra de Ensino em Arqueologia reside no “grande contributo que pode vir a dar na luta contra o Daesh [Estado Islâmico]”, facultando aos jovens universitários e aos académicos dos países do Mediterrâneo o conhecimento recolhido ao longo das últimas décadas no concelho de Mértola e noutras regiões de Portugal sobre a história e a cultura do islão. O aprofundar do conhecimento sobre a sua própria cultura é uma arma contra o fundamentalismo, contra uma visão que distorce as raízes da sua civilização.

O investigador acredita, assim, que a luta contra o Daesh também se pode fazer a partir de Mértola, facultando aos jovens e académicos dos países da orla do Mediterrâneo – Marrocos, Tunísia e Egipto –, acossados pela violência que o Estado Islâmico propaga, uma outra forma de olhar o islão.

Na vila alentejana estão a ser recebidos estudantes em fase de doutoramento ou de mestrado e um número crescente de investigadores, que ali aprofundam o estudo do islão. É este trabalho que Cláudio Torres pretende ver desenvolvido e aprofundado na cátedra sobre arqueologia. “Também nós temos obrigação de lutar contra a disseminação de uma cultura de terror do Daesh que nada tem que ver com o islão”, sintetiza o investigador.   

Mértola é incontornável nesta busca do conhecimento pelo espólio que tem: “Em todo o mundo islâmico não há um único museu de arte islâmica como o que temos [no CAM]”, assinala o seu director. Tanto os jovens estudantes, como os académicos magrebinos que pretendem estudar o islão em profundidade e com bases fundamentadas “têm de vir a Mértola”, refere o director do CAM.

A vila alentejana dispõe de um “espólio espantoso” de testemunhos arqueológicos da presença do Al-Andalus entre os séculos VII e XIII, e que foram trazidos à luz do dia pelas equipas de investigadores do CAM ao longo das últimas quatro décadas. O arqueólogo destaca ainda a “vasta biblioteca sobre o islão”, garantindo que “não há equivalente” em qualquer instituição académica portuguesa.

Este intercâmbio com o mundo mediterrânico, que a partir de hoje envolve também a Universidade de Évora, já conta com as universidades Nova de Lisboa e do Algarve e tem sede em Mértola, onde irão ter lugar aulas para aproveitar as potencialidades “da biblioteca e do laboratório” de pesquisa científica do CAM, observa Cláudio Torres, que pretende ver ainda incluída neste projecto a Universidade de Coimbra. O objectivo do consórcio universitário é lançar, pela via do conhecimento, pontes de aproximação às comunidades de ambas as margens do Mediterrâneo.

Criado em 1978, o CAM conta com uma equipa de investigação multidisciplinar nas áreas de História e Arqueologia, História Local, Património Histórico, Herança Artística e Cultural, Museologia e Antropologia Física.

A UÉ dispõe do Laboratório Hércules, do Centro de História da Arte e Investigação Artística e do Centro Interdisciplinar de História, Culturas e Sociedade que fazem investigação de ponta.

Mais de onze mil sítios arqueológicos estão inventariados pela Direcção-Geral do Património Cultural, no Alentejo, uma área de investigação que “exige o alargamento das colaborações interinstitucionais”, sugere a UÉ. Neste sentido, e em simultâneo com a criação da cátedra de arqueologia, é assinado, na presença da secretária de Estado da Ciência, Fernanda Rollo, um acordo específico com a Direcção Regional de Cultura do Alentejo para alargar o âmbito da investigação arqueológica no Sul do país.

 

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