Câmara do Seixal paga 370 mil euros de renda por dois edifícios

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O novo edifício dos serviços centrais custa 240 mil euros/mês Fábio Teixeira

A Câmara do Seixal, uma das sete autarquias do país onde o endividamento mais tem crescido, gasta todos os meses 370 mil euros (4,4 milhões por ano) com as rendas de dois edifícios.

Um deles, o dos serviços centrais, foi inaugurado há menos de um ano, e outro, o dos serviços operacionais, está concluído há seis anos.

Toda a oposição (PS, PSD e BE) considera ruinosos os contratos celebrados com a empresa que construiu os edifícios, a Assimec, do grupo A. Silva & Silva, e defende a sua renegociação.

Alfredo Monteiro, o presidente da autarquia, de maioria comunista, admitiu ao PÚBLICO que o momento é difícil, mas garantiu que a câmara não só tem assegurado os seus compromissos como está em condições de o fazer no futuro. As rendas pagas, afirmou, consomem cerca de oito por cento do orçamento camarário.

Argumentos contrários esgrime a oposição, segundo a qual os dois edifícios têm sido um dos factores que mais pesam nas contas da autarquia. O vereador social-democrata Edson Cunha considera-os mesmo um "desastre financeiro" que condenará os executivos dos próximos 20 anos.

Os dois imóveis, construídos de acordo com as especificações da autarquia, somam uma área de pavimento de 46 mil metros quadrados, albergam 1500 funcionários e custaram à Assimec 47 milhões de euros - 17 milhões dos quais relativos ao edifício dos serviços operacionais.

Este último foi objecto de um contrato de arrendamento, subscrito pelo presidente da câmara e por José Tavares da Silva, administrador da Assimec, que obriga o município ao pagamento de uma renda mensal de quase 130 mil euros, actualizável nos termos da lei, desde Janeiro de 2005 até 31 de Dezembro de 2024. A partir daí, o contrato é automaticamente renovado a cada três anos.

A autarquia tem, no entanto, a possibilidade de comprar o imóvel. Se o quiser fazer, terá de desembolsar 19,6 milhões de euros. Teoricamente tem também a possibilidade de denunciar o contrato, mas este exclui, na prática, essa hipótese: "Atendendo às expectativas legítimas da Assimec quanto à duração do arrendamento para recuperação do investimento, a inquilina desde já aceita, com carácter definitivo, prescindir da faculdade de revogação unilateral", lê-se no documento. No caso de o município não cumprir esta cláusula, terá de pagar uma indemnização correspondente a todas as rendas em falta até Dezembro de 2024. Ou seja: mesmo que queira denunciar o contrato e deixar o edifício, terá de pagar até ao fim.

Um ano depois, em Dezembro de 2006, a empresa e a câmara assinaram um contrato de promessa relativo à construção e arrendamento de um novo complexo destinado à instalação da presidência, vereação e serviços centrais. A obra custou perto de 30 milhões de euros à Assimec (que não quis falar ao PÚBLICO) e as novas instalações foram inauguradas em 12 de Setembro do ano passado.

Trinta e oito edifícios que acolhiam os serviços camarários no centro histórico do Seixal foram desocupados e 700 funcionários foram deslocados. O contrato inicial foi depois alterado, tendo as partes negociado a construção de um parque de estacionamento de três pisos e 500 lugares. Esta alteração custa ao município mais 43 mil euros por mês, subindo para 240 mil o valor da renda do complexo.

Tal como no caso dos serviços operacionais, também aqui ficou estabelecido que, se a câmara quiser pôr fim ao contrato, renovável de dois em dois anos após o seu termo, em 2029, terá de pagar à empresa o equivalente às rendas devidas até ao fim. Se o município optar pela compra, coisa que só pode fazer no mês de Setembro dos anos ímpares, o preço será de 28,9 milhões de euros, a pagar por inteiro, de uma só vez.

Se a câmara não comprar nenhum dos imóveis cuja construção custou cerca de 47 milhões à Assimec, o valor das rendas pagas só nos 20 anos iniciais dos contratos rondará os 88,8 milhões de euros, sem contar com as actualizações previstas na lei.

Há anos que todos os vereadores da oposição criticam o modelo destes contratos e defendem a sua renegociação, aproveitando as "relações privilegiadas" que, afirmam, a autarquia tem com o grupo A. Silva & Silva. O socialista Fonseca Gil defende mesmo a "responsabilização financeira" de Alfredo Monteiro.

"Não há relações especiais com ninguém", responde o presidente da câmara, garantindo que a autarquia sempre procurou as melhores soluções, pelo melhor preço, ainda que considere "todas as possibilidades em cima da mesa". Para o eleito da CDU, os contratos são "financeiramente sustentáveis" e referem-se a edifícios que "prestam um serviço público de enorme importância para o concelho". A centralização dos serviços permitiu ganhos "enormes e inegáveis", afirma. Só com os serviços centrais, acrescenta, poupou-se metade da renda mensal - o que equivale a 120 mil euros mensais.

O endividamento líquido da Câmara do Seixal cresceu mais de 70 por cento de 2008 para 2009 (segundo a Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas), rondando agora os 49,8 milhões de euros e colocando o município na lista dos 35 mais endividados. Para pagar as dívidas de curto prazo, a autarquia contraiu no mês passado um empréstimo de quatro milhões de euros que quase esgota a sua capacidade de endividamento.

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