As cidades que se revelam num minuto

Cidadania, ambiente e sustentabilidade, um workshop em que se lançam perguntas sobre o tempo: são faces de um evento que tomou conta do Porto esta semana. Para o ano há mais, garantem organizadores.

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O evento incluiu massagens ao ar livre Miguel Nogueira

A pergunta “quanto tempo o tempo tem?” anda a destravar línguas a muitas crianças, mas quando Nick Tyler, professor da University College of London, desafia a plateia a pensar quanto tempo há num minuto, numa fracção de segundo, o exercício é mais académico que lúdico.

Afinal, porque é que às vezes cinco minutos “gastos” numa viagem de transporte público parecem uma eternidade se, outras vezes, esses mesmo cinco minutos, nesse mesmo transporte público, passam tão a correr que nem damos por eles?

Tyler, não trouxe respostas nem certezas (nem era esse o seu papel) mas trouxe provocações que bastem ao workshop Human Living in Future Cities, que decorreu na sexta feira à tarde, no Pavilhão Rosa Mota, no âmbito do Cidade +, um evento pensado como ponto de encontro para discutir ambiente, cidadania e sustentabilidade e que termina hoje, depois de sete dias consecutivos de conferências e workshops, demonstrações empresariais e muitas actividades lúdicas.  

Paula Trigueiros, investigadora da Universidade do Porto, foi quem convidou Tyler, na esperança de que as suas provocações trouxessem contributos valiosos para o projeto em que mais se tem empenhado, o Future Cities, um projecto europeu multidisciplinar onde está a dar os seus contributos na área da arquitectura e do design. “São contributos importantes para percebermos as cidades que no futuro queremos desenvolver”, sintetiza a investigadora, ainda o workshop vai a meio, e os participantes acabaram de ser convidados a imaginar (e a representar) como serão cinco minutos na vida de alguém. 

Entretanto, fora do Pavilhão, no meio dos jardins e bem perto do miradouro com vista para o Douro e para a Arrábida, um grupo de turistas holandeses acaba de tirar fotos, enquanto outro grupo de portugueses e estrangeiros, novos e velhos, se vai posicionando pelas almofadas para assistir e participar num momento de meditação. Vânia Costa, terapeuta na Quarto Nascente, prepara a marquesa para dar mais uma massagem de Reiki. 

Quem, como Maria da Luz, enfermeira com cerca de 40 anos, chegou aos jardins do palácio de Cristal de “pára-quedas”, isto é, sem saber do que ali se passava, só restava a surpresa. “O Palácio devia ser palco destas actividades mais vezes”, dizia, enquanto olhava para o programa e começava a desenhar como ia ocupar o resto do dia. As hipóteses são muitas: aprender permacultura e experimentar medicina chinesa, fazer meditação a olhar para o rio ou criar “vulcões” em pequenos workshops infantis. Ou ainda ouvir um concerto na concha acústica dos jardins do Palácio, depois de fazer compras de produtos biológicos no MercadEco.

Pedro Marques, da Porto de Raiz e um dos principais dinamizadores deste Cidade+, explicou ao PÚBLICO que a ideia foi mesmo de começar a juntar as peças que podem ajudar a desenhar a desejável “sustentabilidade”, vendo-o como um puzzle que é muito vasto e complexo. “A temática do ambiente, das cidades do futuro, da sustentabilidade são demasiado importantes e têm de estar sempre relacionadas. Por isso, quisemos organizar um evento em que a componente do conhecimento que há nas universidades e nas empresas estivesse acessível aos cidadãos e que estes pudessem também trazer os seus contributos".

E, destaca a organização, a sustentabilidade não reside apenas no ambiente, e nas questões das poupanças energéticas ou na preservação da natureza. Os desafios da sustentabilidade podem também ser discutidos no âmbito das economias sociais. No espaço Rede + (que contou com dez parceiros, entre eles o  ATES - Área Transversal de Economia Social da Católica Porto ou o GEPE - Grupo de Entreajuda para a procura de Emprego ) estavam vários desempregados a tentar perceber como poderiam criar o seu próprio emprego e fazer a diferença.

Jesus Pacheco, um galego que está a passar uns dias com a namorada no Porto, ficou deslumbrado com o que encontrou no Palácio de Cristal. Quando lhe perguntamos pela idade e pela profissão disse que era difícil, definir. Tinha estado um ano e nove meses a viver e a trabalhar como voluntário numa eco-aldeia na Suécia. “É uma experiência fascinante, em que cultivas aquilo que comes, tomas decisões em comunidade, não estás só. Mas se falas muito disso, começam logo a chamar-te hippie. Foi uma surpresa muito grande ver estes temas e estas misturas aqui, em pleno Porto." Jesus veio até ao Porto sem saber desta iniciativa, e ficou sem vontade de sair dos jardins do Palácio. 

A organização que, além da Porto de Raiz envolve a BioRumo, uma empresa de consultoria em ambiente e sustentabilidade, e ainda a Câmara do Porto e a empresa municipal Porto Lazer, está a encarar esta primeira edição do Cidade + como uma edição piloto. Envolveu mais de um ano de preparação, mas tudo pode ser afinado depois das experiências estarem no terreno e se perceber a reacção das pessoas e dos parceiros envolvidos - são mais de 50 parcerias firmadas, entre empresas, instituições e universidades, contabiliza Pedro Marques.

Apesar de o balanço ainda não estar feito, Pedro Marques já tem uma certeza. O Cidade + vai ter mais edições no futuro e trarão uma preocupação acrescida: “Queremos que produza resultados concretos. Nós sentimos muito na pele durante a organização deste evento, até pelo número de voluntários que nele quis empenhar o seu tempo e dedicação, que as pessoas querem mesmo fazer parte da mudança”, sintetiza. Para o ano há mais. Com muita cidade por revelar e muitos minutos para discutir.

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