Autarca de Estremoz cortou subsídios a uma associação por ter sido criticado num jornal

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A instituição visada pelos cortes centra a sua actividade no castelo de Evoramonte DANIEL ROCHA

Presidente da câmara não gostou de editoriais assinados por director de um jornal local, também presidente da associação. Sindicato dos Jornalistas censura "inaceitável sanção indirecta"

O presidente da Câmara Municipal de Estremoz, Luís Mourinha, comunicou, por escrito, à Liga dos Amigos do Castelo de Evoramonte (LACE), que os apoios que a associação recebe da autarquia, aprovados em reunião camarária em Fevereiro deste ano, serão cancelados. Porquê? O presidente sentiu-se ofendido pelo conteúdo de pelo menos dois editoriais publicados no quinzenário local Ecos, assinados pelo director, Eduardo Basso, que também é o presidente daquela associação, além de membro do Partido Socialista na Assembleia Municipal, isto é, da oposição.

A carta, redigida a 7 de Julho, e a que o PÚBLICO teve acesso, foi enviada à LACE em papel timbrado, assinada pelo presidente da câmara, dando conhecimento de que a autarquia deixaria de apoiar as iniciativas da associação sem fins lucrativos, "incluindo a atribuição de subsídios". Tudo porque Luís Mourinha diz ter o "direito de não dissociar" os vários cargos desempenhados por Eduardo Basso e que as suas afirmações nos editoriais - assinados - do Ecos são de alguém que adoptou uma "postura de constante difamação da figura do principal responsável pela gestão da entidade que tem contribuído para a sobrevivência [da associação]".

Nos referidos editoriais, o director do Ecos critica a proposta de Mourinha, que viria a ser aprovada mais tarde em assembleia municipal, de rescindir o contrato efectuado pelo anterior executivo com a empresa Águas do Centro do Alentejo.

O presidente da associação diz desconhecer as motivações do presidente da Câmara de Estremoz, que terá agido sozinho, sem passar, segundo Eduardo Basso, o corte de subsídios pelo executivo camarário.

O líder daquela associação, que se dedica à defesa e valorização do património, nomeadamente do castelo de Evoramonte, critica igualmente o "corte de 64 por cento em 2010 no apoio financeiro à LACE". Algo que, segundo acrescenta,não afectou outras entidades que também beneficiam de subsídios camarários. "Os editoriais são um pretexto. A perseguição à LACE não é nova", acusa Basso, afirmando que não se tratará de uma questão pessoal: "Mesmo antes de desempenhar o cargo de presidente houve desentendimentos entre a associação e este presidente da câmara."

Sindicato solidário

Para o presidente do Sindicato dos Jornalistas, Alfredo Maia, trata-se de "uma sanção indirecta por uma tomada de posição que é legítima". "E isso não é de maneira nenhuma aceitável. Naturalmente que o director do jornal tem o direito de transmitir ao público as suas posições", sublinha Maia.

"A posição do director não se pode censurar, por muito ou pouco que desagrade às pessoas, autarcas incluídos", defende. "Se o presidente da câmara se sente ofendido por um editorial tem dois caminhos: recorrer ao direito de resposta, que foi criado e desenvolvido como garantia de igualdade de armas, ou mesmo aos tribunais."

A LACE já fez saber que não vai deixar de solicitar o apoio financeiro e logístico da Câmara Municipal de Estremoz, que nos últimos anos tem representado uma "parte significativa" da ajuda recebida pela associação. Comunicou-o, aliás, a Luís Mourinha, numa resposta por escrito, queixando-se de não ter recebido a parcela do subsídio relativa ao mês de Junho, que, segundo Basso, terá sido paga a outras associações.

Eduardo Basso adiantou que apresentará uma queixa-crime contra Luís Mourinha, por abuso de poder. O líder da LACE teve uma reunião com o vereador da Cultura, José Trindade, a propósito de um evento programado para Setembro. Encontro em que não se tocou no assunto da carta, segundo ambos disseram ontem ao PÚBLICO. "Apesar de ter sido enviada em nome da câmara, quem tinha de prestar esclarecimentos era o senhor presidente, não eu", explicou o vereador da Cultura, José Trindade, que não quis tecer mais comentários sobre o caso.

O PÚBLICO tentou, sem sucesso, obter reacções do presidente da Câmara de Estremoz, Luís Mourinha. com Carlos Dias

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