Título da sugestãoElegância etérea

Como tantas outras histórias semelhantes, a colaboração entre a cantora Channy Casselle, o músico Myke Noyce, peça central da banda do americano Bon Iver, e Ryan Olson, baterista do grupo rock Spoon, começou como simples recreação. Os três estavam ligados ao colectivo Gayngs de Mineápolis, quando idealizaram um projecto paralelo, ao qual, no início, não deram grande importância. Mas ao fim de dois meses de trabalho, com a colaboração de dois bateristas e quase sem darem por isso, tinham onze canções completadas. Tinham de fazer alguma coisa com elas e foi assim que acabou por nascer Give You The Ghost.

O álbum chega agora à Europa depois de ter saído no mercado americano no final do ano passado. É o tipo de registo que tem tanto de familiar como de alienígena, misturando diferentes dinamismos rítmicos e referências, para acabar por criar uma identidade singular: música pop global exploratória, onde se vislumbram traços de linguagens como o dub, o funk, o electro e outras coisas intraduzíveis. A voz de Channy é alterada, resultando numa vocalização distorcida, e a bateria orgânica é cadenciada ou arrastada, complementada por efeitos electrónicos. É um tipo de música esquizofrénica: tanto é totalmente electrónica e sofisticada, como orgânica e espontânea.

Curioso é o facto de Channy Casselle não gostar da sua voz, justificando assim as vocalizações transformadas digitalmente: "Quando não nos sentimos totalmente confiantes e vamos sair à noite, não existe outro remédio senão maquilharmo-nos um pouco e vestirmos qualquer coisa que apreciamos, de forma a fazer sobressair aquilo que mais gostamos em nós. Com a minha voz neste álbum foi exactamente o mesmo", diz ela.

Talvez seja por isso que este disco é tão rico em detalhes, um verdadeiro trabalho de alta-costura, onde tudo é milimetricamente harmónico mas ao mesmo tempo desalinhado, contribuindo para criar uma atmosfera onírica e voluptuosa. Não espanta que tanta gente diferente como Bon Iver, os rappers Jay-Z e Kanye West ou o histórico Prince estejam na primeira fila dos admiradores, num disco de manipulação sintética que redefine fronteiras com grande elegância. Vítor Belanciano

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