Eles estão-se nas tintas!

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Algumas "notáveis" figuras públicas, do alto da sua imensa sapiência divina, insistem em dizer que o país deve cortar na despesa pública, custe o que custar no curto prazo, nem que isso signifique atirar para o desemprego mais 200 mil pessoas. Deste modo, no longo prazo, afirmam, teremos o céu e a paz. Contudo, há já mais de 80 anos, John Maynard Keynes encontrava destes obsessivos fundamentalistas e, por isso, afirmava que, "no longo prazo, estaremos todos mortos" e acrescentava: "Este longo prazo é enganador e constitui uma desculpa para não fazer aquilo que deve ser feito no curto prazo." Por conseguinte, inventar razões para não se fazer nada para diminuir os actuais níveis de desemprego é não só cruel e injusto, mas também um gravíssimo erro político. As consequências dos níveis de desemprego têm efeitos sociais corrosivos e devastadores, e resultará em enormíssimos custos económicos infinitamente maiores do que aqueles que agora enfrentamos, caso este problema não seja urgentemente resolvido. Por conseguinte, deverão ser efectuados investimentos no crescimento económico e na criação de emprego no curto prazo, nem que isso represente aumento dos défices. Desta forma, resultará um crescimento económico robusto no longo prazo. E, aí sim, "é no boom económico e não no abrandamento que se devem implementar as medidas de austeridade", afirmava Keynes. Um estímulo na economia portuguesa adequado e inteligente, que levasse uma parte substancial dos 800 mil trabalhadores ao mercado de trabalho, provocaria um efeito multiplicador que colocaria a economia nacional a crescer entre os 4% a 4,5%, podendo, deste modo, pagar confortavelmente a sua dívida pública e baixar o défice para cerca de 3%.

A retórica dos fundamentalistas obsessivos insiste na descarada mentira que propala a ideia que a austeridade colocou o país no caminho do equilíbrio das contas públicas. Porém, a evidência factual é que a dívida pública subiu de 100% há dois anos para 112% e subirá para 118,6% no próximo ano (de acordo com o próprio ministro das Finanças) e o desemprego atingiu o recorde histórico de 15,5% e atingirá os 18% no fim do próximo ano. Estando a receita fiscal em queda e a despesa a aumentar, adivinham-se novos impostos. Acresce que, de acordo com a OCDE, Portugal só começará a sair da recessão, bem como só voltará aos mercados, em 2014, se tudo correr bem. O contexto é, portanto, de iminente implosão da zona euro em consequência das medidas de austeridade. O discurso político dos fundamentalistas insiste agora na necessidade de diminuir os pesados custos do Estado, recorrendo à privatização dos seus (proveitosos) sectores. Deste modo, não só assistirá ao despedimento de milhares de funcionários públicos, como também as futuras contracções de pessoal serão escandalosamente efectuadas apenas por empresas de trabalho temporário.

Este processo de contratação constitui um passo no sentido da privatização do Estado social, cujas áreas de negócio são tão ambicionadas pelos "empreendedores" grupos económicos em prejuízo dos pobres e mais vulneráveis. Desta maneira, observa-se de forma escandalosa e alarmante o agravamento dos desequilíbrios económicos desde 2008. De acordo com um estudo efectuado por Thomas Piketty e Emanuel Saez, economistas e investigadores da London Business School e da University of California, Berkeley, respectivamente, "93% do rendimento nacional adicional em 2010 foi para 1% da população mais rica, representando um aumento de 11,6% relativamente a 2009." Contudo, mais surpreendente é a rapidez com que os super-ricos ficam ainda mais ricos relativamente aos que são meramente ricos. Assim, em 2010, 37% dos rendimentos adicionais nos EUA foram para os 0,01% (os super-ricos) cujos rendimentos médios anuais representam cerca de 23,8 milhões de dólares anuais por família. O top 1%, cujo rendimento médio anual por família é de cerca de 1,1 milhões de dólares, teve um aumento de 11,6% no mesmo ano. Porém, os restantes 99% da população tiveram um microscópico aumento de apenas 80 dólares ajustado à inflação, ou seja, 0%.

Deste modo, verifica-se que, em resultado das políticas fundamentalistas, o mundo está cada vez mais injusto e desequilibrado economicamente, dado que as elites políticas utilizam despudoradamente os cargos públicos em benefício dos poderosos grupos económicos, como se verificou com a utilização dos serviços secretos em Portugal. E estão-se absolutamente nas tintas para o problema que constitui o traumático evento que uma situação de desemprego representa para aqueles que os elegeram.

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