Ajuda da zona euro à banca espanhola poderá ser insuficiente

Madrid enfrenta nos próximos dias o teste do acesso aos mercados financeiros, que determinarão se o país poderá escapar a um resgate pleno, como que está a ser aplicado em Portugal e na Grécia

Aajuda até 100 mil milhões de euros que a Espanha foi forçada pelos parceiros europeus a aceitar para reforçar o capital dos banco em risco de falência foi ontem saudada em várias capitais como um passo decisivo na resolução da crise da dívida, mas não dissipa as dúvidas sobre a possibilidade de o país evitar um resgate pleno.

Mariano Rajoy, primeiro ministro espanhol, congratulou-se ontem por ter conseguido livrar o país de uma "intervenção externa" graças, disse, às reformas que aplicou desde que chegou ao poder em Dezembro. Rajoy negou ter sido objecto de qualquer pressão dos parceiros - "quem pressionou fui eu", disse - afirmando que "não foi fácil" ter obtido uma linha de crédito para os bancos.

A prova de fogo acontecerá nos próximos dias, quando ficar claro se o país poderá continuar, como espera, a financiar-se nos mercados ou se será empurrado para uma ajuda europeia que assegure as necessidades do Estado durante dois a três anos. A aposta dos ministros das Finanças do euro quando decidiram, no sábado os termos de uma ajuda cujo montante exacto só será decidido dentro de dez dias, assentou na criação de uma barreira de segurança em torno dos bancos espanhóis, cuja fragilidade, resultante da bolha imobiliária, suscita a maior desconfiança dos investidores.

A urgência da decisão, antes mesmo de serem conhecidas as necessidades reais de capital do sector, foi imposta pelas eleições legislativas de 17 de Junho na Grécia, que poderão determinar o princípio do fim da sua presença no euro se o próximo governo recusar o plano de ajuda.

O montante de 100 mil milhões de euros disponibilizado no sábado, superior aos 40 a 80 mil milhões que o FMI estimou necessários, destina-se a prevenir todas as eventualidades, a começar pelos riscos de contágio provenientes da Grécia.

A decisão constitui "um sinal muito claro para os mercados e para o público de que a zona euro está decidida a assumir medidas determinadas", afirmou ontem Olli Rehn, comissário europeu responsável pelos assuntos económicos e financeiros, sublinhando que se tratou de uma acção "preventiva".

Com esta protecção "a incerteza sobre os bancos espanhóis não vai agravar a incerteza que rodeia as eleições gregas", resumiu Anders Borg, ministro sueco das finanças, cujo país não é membro do euro.

Rajoy, da mesma forma que o seu ministro das Finanças Luis De Guindos fizera na véspera, tratou de apresentar o plano espanhol numa perspectiva mais favorável do que os programas dos outros três países ajudados, o que, no caso de Portugal e Irlanda, não vai certamente ajudar os respectivos governos a impor as reformas com que se comprometeram com os parceiros europeus.

Grandes diferenças?

Na prática, no entanto, as diferenças não são assim tão significativas. As taxas de juro para os empréstimos serão as mesmas para os quatro países (actualmente 3,5%). Madrid terá, como os outros países, de subscrever um memorando de entendimento com as contrapartidas dos empréstimos. A diferença é que, no seu caso, as contrapartida não se traduzirão em novas exigências de condicionalidade macro-económica para o Estado porque serão assumidas pelos bancos através de rigorosos planos de reestruturação.

Isto não dispensa Madrid de proceder a um brutal ajustamento económico e financeiro: o país já está aliás sob uma apertada vigilância dos parceiros para reduzir o défice orçamental de 8,9% do PIB em 2011 para 5,6% este ano e 3% em 2014.

Este ajustamento é suficientemente severo para os Dezassete países do euro terem aceite não agravar as exigências a um país em recessão e com uma taxa de desemprego muito próxima dos 25%. Mesmo assim, os ministros das finanças sublinharam no sábado que Madrid não escapará ao controle dos parceiros sobre o cumprimento dos objectivos.

Outra diferença tem a ver com o facto de o FMI não participar nos empréstimos - não por imposição de Rajoy, mas porque as suas regras não lhe permitem entrar em programas destinado apenas à recapitalização de bancos - o que não o afasta do processo: "a Comissão Europeia, o Banco Central Europeu (BCE) e o FMI procederão a uma análise em profundidade das necessidades de restruturação e de recapitalização do sector bancário em Espanha", precisou Olli Rehn, referindo-se à troika cuja presença Madrid queria evitar.

O programa espanhol também é igual aos outros no sentido em que, contrariamente ao que Rajoy ontem afirmou, os empréstimos vão agravar a dívida pública: se o país absorver os 100 mil milhões disponibilizados, a dívida saltará este ano de 80 para 90% do PIB. Do mesmo modo, os juros dos empréstimos vão pesar no défice, o que significa que o governo terá, inevitavelmente, de assumir novas medidas de austeridade para cumprir as metas acordadas com Bruxelas.

É precisamente esta situação que suscita algumas das principais dúvidas sobre a possibilidade de o país escapar a um resgate pleno. O risco é que esta deterioração das finanças públicas agrave a desconfiança dos investidores e os leve a fechar o acesso de Madrid ao mercado. Foi o que aconteceu na Irlanda quando o défice disparou em consequência da recapitalização dos bancos precipitando o resgate europeu.

As incógnitas não acabam aqui. Segundo a decisão do eurogrupo, os empréstimos serão partilhados entre o fundo provisório de socorro, o FEEF, e pelo seu substituto permanente, o ESM, que deverá ficar activo em Julho.

O primeiro instrumento levanta o problema dos colaterais (garantias) exigidos pela Finlândia e Holanda para se protegerem de eventuais problemas de reembolso. Já a opção pelo ESM assusta os investidores devido ao seu estatuto de credor preferencial que garante o seu reembolso prioritário em caso de problema. O risco é que os investidores fujam da dívida espanhola obrigando a zona euro a substituí-los com um resgate pleno, que poderá chegar aos 500 mil milhões de euros.

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