E das fezes fez-se ouro

Cientistas dizem que há quantidades comercialmente interessantes de metais valiosos nos esgotos.

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Os metais usados em produtos para o cabelo ou detergentes acabam por chegar às estações de tratamento de esgotos Chris Waits/Flickr

Transformar fezes em ouro parece alquimia barata. Mas não é. Um novo estudo científico apresentado esta segunda-feira reforça a tese de que há quantidades comercialmente interessantes de metais valiosos ou elementos raros – como ouro, prata, cobre, paládio e vanádio – nas lamas das estações de tratamento de esgotos.

Durante oito anos, cientistas dos Serviços Geológicos dos Estados Unidos analisaram amostras de estações de tratamento em cidades, vilas e comunidades rurais das Montanhas Rochosas. E concluíram que, em cada tonelada de lamas havia, em média, 28 gramas de prata, 563 gramas de cobre, 36 gramas de vanádio e algo entre um a seis miligramas de ouro.

“Estes metais estão em todo o lado, nos produtos para o cabelo, nos detergentes, até em nanopartículas nas nossas meias, para prevenir os maus cheiros”, afirma Kathleen Smith, autora principal do estudo apresentado numa conferência da Sociedade Norte-americana de Química, nos Estados Unidos – citada num comunicado desta organização.

Pequenas quantidades destes metais acabam por chegar às estações de tratamento, onde a parte sólida dos esgotos é separada da líquida. “O outro que encontrámos está ao nível mínimo de um depósito mineral”, acrescenta Kathleen Smith.

Ou seja, com tecnologia apropriada e a um custo razoável, os metais valiosos poderão eventualmente ser reaproveitados. E isto não traria apenas um benefício comercial, como ambiental, pois quanto menor a concentração de metais pesados nas lamas, mais facilmente elas podem ser utilizadas como fertilizantes na agricultura.

A ideia já vem inspirando outros cientistas e até empresas. Técnicas para recuperar metais a partir de águas residuais industriais foram já desenvolvidas pela companhia Magpie Polymers, com sede em França.

E há outros estudos que também procuraram avaliar a potencial riqueza dos esgotos urbanos. Um deles, liderado por cientistas da Universidade Estadual do Arizona e publicado em Janeiro passado na revista Environmental Science and Technology, estima que numa cidade com um milhão de pessoas, as lamas das estações de tratamento podem gerar o equivalente a 12 milhões de euros por ano. Os 13 elementos químicos mais lucrativos que se podem tirar dos esgotos valerão cerca de 260 euros por tonelada de lamas, segundo o estudo.

Em 2009, a Agência de Protecção Ambiental norte-americana também já tinha analisado milhares de amostras, encontrando valores parecidos com o do estudo apresentado esta segunda-feira para alguns metais.

A grande questão é saber se é mesmo possível fazer dinheiro com os esgotos, com uma tecnologia barata e que não traga mais problemas ambientais do que soluções. “A viabilidade económica e técnica da recuperação de metais dos bio-sólidos precisa ser avaliada caso a caso”, diz Kathleen Smith.

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