Desflorestação já não é o único vilão das emissões de CO2 do Brasil

O Brasil tem cada vez mais automóveis e a seca do ano passado obrigou a um maior uso de centrais a carvão e gás natural para produzir electricidade.

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Consumo de energia compete agora com a desflorestação como a maior fonte de CO2 no Brasil AFP PHOTO/ANTONIO SCORZA

A desflorestação da Amazónia está perto de ser ultrapassada pelos automóveis, indústrias e residências como a maior fonte de gases com efeito de estufa no Brasil. Uma estimativa não oficial divulgada esta quinta-feira em São Paulo mostra que as emissões de CO2 relativas ao consumo de energia atingiram um novo recorde em 2014, quase igualando aquelas que resultam da destruição das florestas.

Em 2004, 71% das emissões brasileiras vinham da desflorestação – ao reduzir a capacidade de absorção do CO2 da atmosfera. Nesse ano, foram destruídos quase 28.000 quilómetros quadrados da Amazónia – o maior valor desde que há registos, equivalente a quase um terço de Portugal continental.

O ritmo caiu substancialmente e, no ano passado, a área desmatada foi de 5012 quilómetros quadrados, segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). Em 2014, a alteração no uso dos solos, que é quase toda relacionada com a desflorestação, representou 31,2% das emissões brasileiras, segundo as estimativas divulgadas do Observatório do Clima, que congrega uma série de organizações não-governamentais do país.

Apesar de ter havido uma redução na 15% na área desmatada na Amazónia em relação a 2013, o efeito benéfico foi praticamente anulado pelo aumento no consumo de energia. O Brasil tem cada vez mais automóveis e a seca do ano passado obrigou a um maior uso de centrais a carvão e gás natural para produzir electricidade, pois as barragens estavam vazias.

Mesmo com a crise económica em que o país está mergulhado, as emissões do sector da energia cresceram 6%. Hoje, representam 30,8% do total.

O país lançou para a atmosfera o equivalente a 1558 milhões de toneladas de CO2 em 2014 – 0,9% a menos do que no ano anterior. O valor total – equivalente a 23 vezes as emissões de Portugal – tem oscilado pouco nos últimos seis anos, revelando que o maior benefício do controlo da desflorestação já foi conseguido.

O Brasil comprometeu-se, perante as Nações Unidas, a reduzir em 37% as suas emissões até 2025 e 43% até 2030, em relação aos níveis de 2005. Até agora, já se conseguiu uma descida de 33%. Mas com o aumento do consumo de energia e maiores dificuldades em reduzir ainda mais a desflorestação, o caminho não será fácil.

“Isso preocupa, porque 2020 é depois de amanhã”, disse Carlos Rittl, secretário-executivo do Observatório do Clima. Rittl afirma que o país precisa fazer mais, não só para cumprir o que prometeu à ONU, mas para contribuir para que a temperatura da Terra não suba mais do que 2oC até ao final do século. “Estamos longe da trajectória em que precisamos estar”, completa o responsável pelo Observatório do Clima.

As estimativas das emissões brasileiras surgem a pouco mais de uma semana do início de uma conferência decisiva da ONU, em Paris, na qual deverá ser aprovado um novo acordo internacional sobre as alterações climáticas. Tal como o Brasil, mais de 160 países já submeteram planos voluntários de como pretendem contribuir para combater o problema.

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