Venda do Novo Banco leva a braço-de-ferro negocial entre BdP e Anbang

A possibilidade de a venda poder ser adiada é uma hipótese que continua em cima da mesa.

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Fitch acredita que testes de stress devem “esclarecer algumas questões sobre a posição de solvência do Novo Banco” Enric Vives Rubio

A aproximação do final das negociações para a venda do Novo Banco decorrem num contexto de grande impasse, com o Anbang a apresentar o melhor envelope financeiro, mas a colocar muitas reservas ao negócio, o que levou já o Banco de Portugal a acenar com a norte-americana Apollo como “lebre”. Caso o Anbang não reveja a sua actual posição negocial, passa a estar em cima da mesa o adiamento da operação, que o Governo quer ver fechada até final de Agosto.

O PÚBLICO apurou que a seguradora chinesa Anbang faz depender o pagamento (o envelope financeiro) ao Fundo de Resolução da aceitação por parte do vendedor de condições contratuais muito duras que estão a ser consideradas inaceitáveis e irracionais. Uma posição negocial que está a provocar um braço de ferro com o BdP. O Anbang quer que o supervisor (que gere o FR) se responsabilize por um conjunto alargado de contingências que incluem também créditos de risco (tudo o que for abaixo de um determinado valor o BdP responderá por isso). Ainda ontem a Justiça aceitou uma providência cautelar colocada pela sociedade Liminorke, liderada pelo empresário Jaime Antunes, para tentar impedir a venda do Novo Banco.

A seguradora chinesa procura ainda precaver-se do resultado dos próximos testes de stress à banca europeia agendados para Novembro e que vão abranger todas as instituições financeiras, consideradas de risco sistémico. Com 18% de quota de mercado nacional, o Novo Banco está neste grupo.

Na passada sexta-feira, 7 de Agosto, o BdP veio anunciar que apenas um candidato, dos três escolhidos (Anbang, Fosun e Apollo) para participarem na última fase do concurso público, tinha revisto a sua proposta de aquisição do Novo Banco. Dias depois, o Jornal de Negócios avançou que o Anbang ganhara o direito a negociações exclusivas, mas os outros, Fosun e Apollo, ainda poderiam ser repescados. Mas tudo aponta para a exclusão (não assumida pelo FR) da Fosun (dona da Fidelidade e da Luz Saúde) e que está sob escrutínio da autoridade de supervisão seguradora. E também para o facto de o valor líquido da oferta da Apollo ser muito inferior ao do envelope do Anbang, o que, na prática, coloca também o fundo de private equity fora da disputa. Ou seja: ou a venda é ao Anbang, ou não há venda.

De acordo com os números divulgados (e não confirmados oficialmente), o envelope em cash assinado pela seguradora chinesa ronda os 3200 milhões (a que se somam mais mil milhões para recapitalizar a instituição). E dificilmente poderá haver espaço para uma reviravolta das negociações a favor da Apollo, que o BdP estará a usar para pôr pressão sobre o seu interlocutor chinês. 

Mas esta solução, Anbang, tem suscitado dúvidas pois tenderá a ser mais escrutinada pelo Banco Central Europeu, que tem a palavra decisiva sobre o nome do futuro dono do Novo Banco. Ao contrário da Apollo, que apesar de ser um fundo de private equity, beneficia de alguma fiscalização por parte das autoridades norte-americanas, o investidor chinês mantém relações opacas entre sociedades associadas e é politicamente dominado, pelo que se desconhece se cumpre as regras, o que dificulta uma boa fiscalização, que passará a ser feita pelo BCE. Em todo o caso, o Anbang foi autorizado pelo BCE recentemente a comprar um pequeno banco na Bélgica.

Em Janeiro, quando arrancou o concurso público de venda do segundo maior banco privado, o Governo e o BdP congratularam-se com os 17 candidatos que levantaram o caderno de encargos (sem custos para os interessados), mostrando grande confiança no processo que parece agora ter chegado a um impasse.

Desde o início que o Governo e o BdP puseram a fasquia do sucesso da operação no encaixe líquido do negócio. O primeiro-ministro Pedro Passos Coelho, a ministra das Finanças Maria Luís Albuquerque e o próprio governador Carlos Costa justificaram a intervenção no BES via resolução por ser a que não penalizaria os contribuintes. Hoje há um dado adquirido: dificilmente não haverá perdas para os contribuintes. Mesmo que a proposta mais alta, a do Anbang (3200 milhões) vença, o FR terá de encaixar uma perda de 1700 milhões, dado que a 4 de Agosto de 2014 a instituição portuguesa recebeu fundos de 4900 milhões. A unidade técnica do parlamento já veio lembrar que as previsões para 2015 contam com o reembolso do empréstimo concedido ao Fundo de Resolução para capitalizar o Novo Banco.  Daí que para o Governo quanto mais depressa estiver concluída a venda do Novo Banco melhor.

No meio da discussão negocial, no BdP admite-se que caso a Anbang persista nas suas exigências, a venda do Novo Banco deve ser adiada. Uma solução que daria razão à anterior administração liderada por Vítor Bento, que pediu dois anos para colocar o Novo Banco nos carris, para maximizar o encaixe da venda. A proposta não foi acolhida e Bento acabou por deixar o Novo Banco em Setembro de 2014.

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