Uma estranha forma de estar nos negócios

Um negócio podia ser só isso. Empreendedores que perante uma boa oportunidade procuram investidores dispostos a arriscar em busca do retorno desse investimento. Mas a forma de fazer grandes negócios em Portugal quase nunca foi só isso. Seja pelo regime de condicionamento industrial, seja por uma atitude paternalista do Estado, seja por uma questão de ganância que se agudizou nas últimas décadas.

A história que hoje contamos no P2 não é uma escandaleira. Não é certo que venha a pesar nos bolsos dos contribuintes. Mas também não é impossível que tal aconteça. A história que hoje contamos no P2 é tudo isto e muito mais.

A oportunidade apareceu. O estado angolano procurava um fornecedor para montar um sistema encriptado de telecomunicações de dados de voz para os serviços secretos angolanos - Serviço de Inteligência e Segurança do Estado-SISE.

Mas onde deviam estar empreendedores havia oportunistas. Onde deviam estar investidores havia o Banco Espírito Santo (BES) como financiador. E como o negócio envolvia o Estado angolano, lá estava o Estado português representado pelo então primeiro-ministro José Sócrates. Em vez de se procurar capital para investir, procuravam-se facilitadores de negócios ligados à política. E como havia risco, procuravam-se garantias públicas.

Não fosse a informalidade como este negócio foi feito, hoje, muito provavelmente não saberíamos dele. Não saberíamos que foi um, entre muitas causas, que contribuíram para o colapso do BES. Que pesa nas contas da Reditus.

O que surpreende já nem é a forma de actuar. Hoje, depois de venda de parte da Galp à ENI, depois do BPN, depois da Oferta Pública de Aquisição falhada sobre a Portugal Telecom, depois da queda do BES, depois dos financiamentos da CGD para lutas de poder de outros bancos, só para citar alguns casos, podemos dizer que nada surpreende.

O que surpreende é como são sempre as mesmas figuras, invariavelmente, a aparecer. As mesmas ligações entre a política e os negócios.

O que surpreende é como nada parece ter mudado ao longo dos anos. O que assusta é não termos a certeza de que alguma coisa já mudou para o futuro.

A história que hoje contamos no P2 não é uma escandaleira. É apenas uma estranha e já habitual forma de fazer negócios.

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