Carreira especial só para alguns organismos gera mal-estar nas Finanças

Trabalhadores da DGAEP exigem carreira que reconheça a sua “especialização”.

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Maria Luís Albuquerque, Ministra das Finanças Daniel Rocha

A criação de uma carreira especial para alguns trabalhadores do Ministério das Finanças, aprovada recentemente, está a gerar mal-estar dentro do próprio ministério, com os funcionários da Direcção-Geral da Administração do Emprego Público (DGAEP) a pedirem um tratamento semelhante.

Depois do Instituto Nacional de Estatística (INE), agora é a vez de os trabalhadores da DGAEP também pressionarem o Governo a acelerar o processo de revisão das carreiras da função pública e a reconhecer a “especialização” dos seus quadros, tal como aconteceu com os mais de 230 técnicos de três organismos também tutelados por Maria Luís Albuquerque.

O desagrado com a “infundada discriminação e desconsideração” foi expresso numa carta enviada em Janeiro à ministra das Finanças e que é subscrita pela maioria dos 90 quadros da DGAEP.

Na missiva a que o PÚBLICO teve acesso, os trabalhadores começam por dizer que a criação dessa nova carreira especial de técnico superior “suscita um profundo choque e gera a maior surpresa e perplexidade”, contribuindo para “instalar um sentimento de profundo mal-estar, desagrado e infundada discriminação e desconsideração”.

Sem pôr em causa o mérito dos técnicos superiores da Direcção-Geral do Orçamento (DGO), Direcção-Geral do Tesouro e Finanças (DGTF) e do Gabinete de Planeamento e Estratégia (GPEARI) que vão transitar para a nova carreira e ter um ganho salarial extra de, no mínimo, 52 euros, os colaboradores da DGAEP “não entendem” que estando os prémios de desempenho e as progressões congelados há vários anos, “venham agora a ser eleitos alguns trabalhadores, ao abrigo de um critério à margem desses mecanismos que, com o devido respeito, se tem por falacioso”.

“Os trabalhadores da DGAEP não compreendem esta nova medida que agora discrimina a esmagadora maioria da Administração Pública, comprometendo a coesão das instituições e a equidade entre os seus trabalhares”, dizem. E exigem que seja encontrada uma solução que “dê resposta à dignidade e reconhecimento que os trabalhadores da DGAEP e seguramente de toda a Administração legitimamente esperam e desejam”.

A DGAEP é o organismo que apoia os governos no estudo, concepção e coordenação das políticas para a Administração Pública, nomeadamente na área da gestão de recursos humanos.

Ao que o PÚBLICO apurou a iniciativa da carta partiu de alguns trabalhadores e só foi enviada ao gabinete de Maria Luís Albuquerque porque reuniu um número de assinaturas representativo.

Argumentos semelhantes aos que seguiram na carta também foram avançados pelos sindicatos quando no início de Janeiro foi tornado público que o Ministério das Finanças estava a preparar-se para criar uma nova carreira. Na altura tanto os sindicatos da CGTP como os da UGT lembraram que há dezenas de carreiras à espera de serem revistas desde 2008 e que a criação de uma nova carreira que tem implícito um aumento salarial mínimo de 52 euros, vai em contraciclo com os congelamentos das progressões e com os cortes salariais que ainda se mantêm em 2015.

Também a direcção do INE (tutelado pelo ministro da Presidência) já tinha aproveitado a porta deixada em aberto com a criação da nova carreira para insistir com o Governo relativamente à situação dos seus técnicos. Foi a própria presidente, Alda Carvalho, que admitiu, quando esteve na Assembleia da República a 18 de Fevereiro, que tem vindo a perder técnicos qualificados para outros organismos públicos, porque as condições salariais e de progressão que tem para oferecer são pouco atractivas. Embora a direcção do INE venha a propor a revisão da situação desde 2009, só agora o Governo admitiu estudar a criação de uma carreira de técnico superior de estatística.

Luís Marques Guedes, ministro da Presidência, adiantou a 13 de Fevereiro, que a revisão das carreiras no Estado seria retomada pouco a pouco, mas sem apontar datas ou áreas prioritárias. No dia em que a nova carreira das Finanças foi aprovada, o ministro destacou que se tratou “da primeira das carreiras, a primeira das prioridades, mas o trabalho continua não apenas nas Finanças", acrescentando que estão a ser definidas as prioridades e a calendarização dessas actualizações. O PÚBLICO perguntou ao Ministério das Finanças quando é que prevê o início desse trabalho de revisão e se já foram identificadas as áreas prioritárias, mas ainda não teve resposta.

A Lei 12-A/2008 determinou a integração de uma grande parte dos trabalhadores em apenas três carreiras gerais e obrigava a que as carreiras de regime especial e os corpos especiais fossem revistos “no prazo de 180 dias” para serem convertidas em carreiras especiais ou integradas nas carreiras gerais. O prazo nunca foi cumprido nem pelo anterior nem pelo actual Governo e, passados sete anos, poucas foram as carreiras revistas, restando situações como as dos técnicos de diagnóstico e terapêutica, dos inspectores do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, dos técnicos da antiga Direcção-Geral das Alfândegas, dos guardas-florestais, entre outras.

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