Taxas sobre produtos com alto teor de sal e açúcar afectam consumo e PME

Estudo europeu mostra impactos mitigados no sector agro-alimentar, mas diz que encarecer os produtos de elevado valor calórico tem reflexos na rentabilidade das empresas. Medida não está afastada em Portugal.

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A criação de uma taxa adicional sobre os produtos com elevado teor de açúcar e sal em Portugal não é pacífica no interior do Governo Pedro Martinho

Agravar a tributação dos produtos com alto teor de açúcar, sal ou elevado valor calórico – como acontece em França, na Hungria ou na Finlândia – tem um impacto directo no consumo e tem influência nas margens das empresas, sobretudo dos negócios locais e das Pequenas e Médias Empresas (PME), que têm mais dificuldade em contornar a diminuição da procura face às multinacionais.

A conclusão é um estudo recente encomendado pela Direcção-Geral das Empresas e da Indústria da Comissão Europeia a um consórcio europeu liderado pela consultora Ecorys e espelha as reservas com que a Federação das Indústrias Portuguesas Agro-Alimentares (FIPA) encara a hipótese de se criar em Portugal taxas especiais sobre produtos alimentares com excesso de sal e de açúcar a partir do próximo ano.

O cenário foi colocado em cima da mesa em Abril de forma clara pelo secretário de Estado adjunto do ministro da Saúde, Fernando Leal da Costa, depois de a ministra das Finanças, Maria Luís Albuquerque, admitir taxar alguns produtos com efeitos nocivos para a saúde (para cobrir 100 milhões de euros dos 300 milhões de dívidas do sector da saúde).

Até Outubro terá de haver uma decisão, quando for apresentado o Orçamento do Estado para 2015. Mas a ideia não é pacífica no interior do Governo. O que, aliás, foi público quando o ministro da Economia, António Pires de Lima, veio contestar a posição de Leal da Costa, dizendo que a medida é um “fantasma” que só prejudicaria o “funcionamento da economia”.

No estudo Taxas alimentares e o impacto na competitividade do sector agro-alimentar, publicado este mês, foram ouvidas empresas (produtores e retalhistas), consumidores, autoridades públicas de saúde, feitos estudos de mercado e analisados os casos de países que introduziram taxas extraordinárias – Dinamarca (taxa sobre produtos com gorduras saturadas, que acabou por cair), Finlândia (gelados, refrigerantes e doces), França (bebidas com adição de açúcar e adoçantes artificiais) e Hungria (chocolates, bebidas energéticas, produtos açucarados pré-embalados e aperitivos salgados).

Do lado dos consumidores, quando se verifica um agravamento destes produtos, há um efeito indutor da procura, “associado à redução do consumo do produto taxado” – embora os consumidores acabem por procurar produtos idênticos de gamas mais baixas ou por comprar outros produtos com igual ou idêntico teor de açúcar, sal ou com excesso de gorduras saturada. “Inversamente, a diminuição ou o fim da taxa está associada a preços mais baixos, e a maior consumo dos produtos taxados”.

Custos administrativos
Para as empresas, não é claro, segundo o estudo da Ecorys, qual é o efectivo impacto na competitividade. Mas há lições a tirar. Desde logo, a definição das taxas tem impactos significativos nos encargos administrativos das empresas, nomeadamente quando a taxa é aplicada aos ingredientes. Disso são “exemplos claros” os casos da Dinamarca e da Finlândia, diz o estudo encomendado pela Direcção-geral das Empresas e da Indústria.

Os custos de contexto – administrativos – são “relativamente maiores” para as pequenas e médias empresas (PME) do que para os maiores produtores, sendo-lhes mais difícil mitigar este impacto nas próprias margens de comercialização do que as multinacionais.

No estudo admite-se que haja impacto na rentabilidade. Embora ressalve que os dados não são totalmente conclusivos, a Ecorys diz que as entrevistas, casos de estudo e a informação de mercado recolhida mostram que a margem das empresas é influenciada negativamente e que, face à diminuição da procura do produto taxado, há um impacto nos resultados das empresas.

O estudo diz que a “diminuição nas vendas dos produtos taxados por parte dos produtores e dos retalhistas, e a perda de emprego que resulta da queda das vendas, pode ser compensada por um crescimento noutras linhas de produtos”. Mas não é assim para todo o tecido empresarial. As PME que não têm a mesma flexibilidade do que as multinacionais para compensar estas perdas através de ganhos noutros produtos. E mesmo acontece em relação às empresas multinacionais “que só produzem uma categoria de produtos (produtos açucarados por exemplo)”.

No caso de Portugal, a FIPA (onde estão vários sectores do agro-alimentar, desde as bebidas refrescantes à indústria do chocolates ou dos gelados, por exemplo) espera que a posição de Pires de Lima prevaleça no interior do Governo. Jorge Henriques, presidente da federação, diz que o estudo mostra que as “tentativas de taxar ou de proibir os produtos com mais valores calóricos não atingiram os objectivos” para alterar os hábitos de consumo de produtos com riscos específicos para a saúde.

E considera que é preciso ter em conta o momento actual das empresas e dos consumidores, considerando que não podem ser objectivos de arrecadação de receita a prevalecer. “Já temos uma taxa de IVA de 23% em alguns produtos, o que é um desequilíbrio brutal face a Espanha, o sector da restauração já tem uma taxa elevadíssima [de 23%] e é preciso olhar para o contexto em que as empresas e os consumidores vivem”.

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