“Se comprar a TAP, a Globalia não irá mudar o hub de Lisboa para Espanha”

O presidente do grupo espanhol, um dos candidatos à compra da companhia de aviação, garante que vai manter a marca TAP se ganhar a privatização.

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Presidente da Globalia espera que a experiência do grupo seja uma vantagem na corrida pela TAP DR

O bom filho à casa torna. Assim será com a Globalia se comprar a TAP, numa privatização que tarda em descolar. O grupo espanhol, que até 2008 foi sócio da companhia de aviação nacional no negócio do handling, aguarda por fumo branco para dar o próximo passo. Juan José Hidalgo, fundador e presidente da Globalia, não se cansa de dizer que cabe ao Governo dar o tiro de partida. “Tem de decidir o que quer fazer”, afirma o empresário. Para acalmar os receios, garante que manterá o hub (placa giratória) de Lisboa, bem como a marca TAP. Quanto à actual equipa de gestão, com a qual entrou em conflito no passado, deixa por responder a pergunta sobre a sua manutenção aos comandos da empresa.

Foi o Governo que convidou a Globalia a participar na privatização da TAP?
O meu filho encontrou-se em Lisboa com um membro do Governo, que perguntou se tínhamos interesse em olhar para a TAP. Respondemos que sim. Aliás, até manifestámos esse interesse por escrito para confirmar que temos vontade de discutir este tema e de analisar a compra da companhia.

Quando fizeram chegar ao Governo esta garantia por escrito?
Foi próximo do jogo da final da Liga dos Campeões em Lisboa [que ocorreu a 24 de Maio], porque o meu filho estava em Portugal nessa altura.

E por que está a Globalia interessada na TAP?
Pode dar-nos um crescimento importante, porque a TAP e a Air Europa juntas teriam uma frota de mais de 100 aviões, passando a ser uma das transportadoras aéreas mais importantes da Europa. E a localização do aeroporto de Lisboa, onde a TAP tem o seu hub, é imbatível nas ligações entre a Europa e a América Central e do Sul. É um activo muito importante.

Há pelo menos outros três potenciais candidatos. O que pode oferecer a Globalia para os ultrapassar na corrida?
Em primeiro lugar, a nossa longa experiência de fazer nascer e crescer uma companhia. Lutámos muito para conseguir uma posição forte em Espanha e hoje somos a única companhia do país [a Iberia fundiu-se com a British Airways em 2010]. Trabalhámos para ter uma companhia eficiente e moderna e que tem sempre dado resultados positivos. E isto são pontos fortes únicos.

O objectivo é ficar com 100% da TAP?
Não consigo responder a essa pergunta. É preciso avaliar primeiro. Mais, é preciso saber primeiro quais são os objectivos do Governo em relação à empresa. Ainda não os conhecemos. Mostrámos o nosso interesse e agora aguardamos para conhecer quais serão os moldes da privatização. Se é que vai existir.

Mas estão dispostos a abdicar de uma posição de controlo? Falou-se de um cenário de venda de apenas 49% da TAP.
Ainda é cedo para dizer. Tudo depende das negociações, do entendimento a que possamos chegar e do próprio modelo. Será muito diferente se a privatização for feita através de negociação directa ou da alienação de uma parte do capital em bolsa. Enquanto não tivermos dados concretos em cima da mesa, é difícil dar uma opinião sustentada.

Já contrataram assessores jurídicos e financeiros para apoiarem a Globalia numa eventual privatização?
Não chegámos ainda a essa fase. Temos alguns advogados a trabalhar connosco neste tema, mas esse trabalho só poderá começar depois de sabermos qual é a posição do Governo. 

Até porque a privatização pode nem ser relançada...
Claro.

Portanto nem avançaram ainda para uma fase de diagnóstico da TAP, de due dilligence, com visitas técnicas à empresa e consulta de informação mais detalhada?
Nada ainda. Por agora, o que há a fazer é esperar.

O interesse que têm na TAP limita-se à companhia de aviação ou estão dispostos a ficar com as restantes subsidiárias do grupo, nomeadamente a empresa de manutenção no Brasil?
Ainda não conheço com profundidade os números da TAP e das participadas. Sei que o negócio da aviação tem tido bons resultados, que a frota está a ser modernizada e que o crescimento continua, mas existe uma dívida elevada. E também sei que há problemas no Brasil. Mas estas empresas de manutenção são, regra geral, muito eficientes. Nós já temos um centro de manutenção em Palma de Maiorca e vamos tentar abrir outro em Madrid. Gostaria de perceber como é que o negócio do Brasil perde tanto dinheiro. A Groundforce [operadora de handling detida em 49% pela TAP] já tem a maioria do capital na esfera privada e nós também usamos essa marca em Espanha. Foi o acordo a que chegámos com a TAP [quando a Globalia saiu do capital da empresa].

Mas ficar com a manutenção do Brasil faz sentido para a Globalia?
Temos um grupo com actividades muito vastas. Conhecemos o funcionamento da manutenção, do handling, das companhias de aviação. Estamos por dentro de todos os negócios que a TAP tem. Mas agora é preciso dedicar tempo a analisá-los.

Que estratégia vê para a TAP se entrar no grupo Globalia?
Não gosto de predizer, nem de prometer algo que poderei não vir a cumprir. Nesses casos, prefiro não me pronunciar. A única coisa que peço é que a TAP e o Governo olhem bem para o nosso grupo, que vejam tudo aquilo que temos feito em Espanha e como trabalhamos. E que saibam, quando avançarem com a privatização, que a Globalia procura sempre a eficácia e a produtividade empresarial.

Mas manteriam a marca TAP, por exemplo?
Sim, claro. A TAP tem de identificar-se como tal. E há que fortalecer não só a companhia, enquanto empresa portuguesa, mas o próprio aeroporto. E nunca debilitar esses activos.

Saíram da Groundforce em 2008, em conflito com a administração da TAP. Este passado pode ser prejudicial à Globalia?
Defendo que tínhamos razão no conflito. Além disso, tivemos azar. Tínhamos uma boa estratégia para a empresa, mas o aeroporto de Faro foi invadido por low cost [que contrataram a Portway, empresa de handling da ANA concorrente da Groundforce]. Tivemos de manter, sem trabalhar e a pagar, mais de 500 pessoas durante dois anos. E a legislação portuguesa dificultava os despedimentos. Isso converteu-nos numa empresa com perdas, que teve de encontrar soluções. Não foi culpa nossa. Comprámos uma licença com determinadas condições que se alteraram a meio do jogo.

Mas também houve conflitos directos com a TAP sobre a gestão da Groundforce. Se comprarem a companhia vão manter a actual administração, que ainda é a mesma?
Foi uma situação complicada. Éramos maioritários, mas era a TAP que geria a empresa. Mas, para mim, o maior problema foi a situação em Faro. 

Não respondeu se manteriam a actual administração. 
Ainda não consigo responder a essa pergunta.

Como avaliam o facto de o Governo continuar a adiar uma decisão sobre a privatização?
O Governo é que tem de saber o que fazer. Da nossa parte, até que nos digam qual é o caminho, não posso pronunciar-me.

Poderá ser mais difícil a um investidor espanhol ficar com a TAP por causa dos riscos de transferência do hub de Lisboa?
É impossível isso acontecer. O mercado que voa através de Lisboa vai para outros destinos, como o Brasil ou Angola. Não vão querer voar até Espanha para depois seguirem a sua viagem. 

Está a dar uma garantia de que o hub será mantido?
Se comprar a TAP, a Globalia não irá mudar o hub de Lisboa para Espanha porque é um activo que não pode ser transferido. O que se pode é potenciá-lo.

A Globalia está a analisar mais alguma oportunidade de aquisição no sector da aviação?
Não. Estamos concentrados na TAP porque sentimos que há aqui uma oportunidade. Mas ainda estamos a falar de uma hipótese que não é clara. 

Têm recebido contactos do Governo ou há alguma reunião marcada sobre este tema?
Não. 

Por que não demonstraram interesse na TAP na primeira tentativa de venda, em 2012?
Não era o momento certo. Estávamos em plena crise e mais focados em reestruturar o nosso grupo e torná-lo eficiente. Agora que já ultrapassámos essa fase, é o momento certo para comprar a TAP. Estamos mais fortalecidos empresarial e financeiramente.

Como está a correr a operação da Air Europa em Portugal e quais são os planos?
Está muito bem. Iniciámos os voos no Porto e aumentámos a oferta em Lisboa. Pouco a pouco, iremos reforçar a operação. Estamos muito satisfeitos com o desempenho, assim como com a actividade da agência de viagens Halcon.

A jornalista viajou a convite da Globalia

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