Saída à irlandesa?

Ainda não saímos da grande depressão, mas já entrámos na grande campanha eleitoral, que inevitavelmente gerará confusão no debate público. Para mim, aquilo que sobretudo não pode acontecer é os portugueses pagarem ainda mais em juros, para aparentemente reganharmos a soberania, evitando um programa cautelar numa “saída à irlandesa”. Clarifiquemos as nossas opções em termos de financiamento de médio e longo prazo. Se os “juros” das obrigações a dez anos estivessem muito elevados (p.ex. 7%), com o crescimento previsto para este ano um segundo resgate idêntico ao primeiro seria inevitável – não conseguiríamos nem pagar esses juros nem refinanciar a dívida que entretanto vencerá. Caso estas yields estivessem abaixo dos 3,5%, que é a taxa média que estamos a pagar pela dívida acumulada e, sobretudo, abaixo de 3,2%, a taxa de juro marginal paga pelos 78 m. M€ da troika, aí sim teríamos condições para uma saída “limpa” do programa de ajustamento. Porém, o que interessa discutir é a situação previsível em Maio, com os juros algures entre 4% e 6%. Aqui há lugar a uma decisão política.

De um ponto de vista eleitoralista e míope, defender uma saída à Irlandesa faz sentido, pois aparentaria uma libertação total dos credores – o que não deixa de ser paradoxal, com uma dívida, ainda a crescer, de 127% do PIB. Mas qual o custo de sair em juros adicionais? Pode-se calcular como a soma de duas parcelas. Por um lado, os juros de “precaução” que estamos a pagar pelos depósitos na posse do Tesouro como reserva, e que são muito maiores do que seriam em condições normais (mais do dobro do seu valor em 2010). Por outro, os juros adicionais resultantes da diferença entre os juros de mercado (digamos 5%) e a taxa que teríamos num “cautelar a 2,5 anos”, em princípio à volta dos 3%. Uma estimativa para esta soma nos próximos 30 meses é de 1023 milhões de euros. Este seria o preço adicional a pagar pelo eleitoralismo demagógico da saída à Irlandesa.

 
 
 

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