Risco de conflito internacional sobe para o topo das preocupações sobre economia mundial

Riscos económicos em segundo plano na avaliação do Fórum Económico Mundial. Cimeira de Davos arranca na próxima semana.

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O FEM decorre de 21 a 24 de Janeiro, em Davos RUBEN SPRICH/Reuters

Nunca, até agora, o risco de se materializar um conflito internacional com repercussões a dez anos na economia mundial esteve no topo das preocupações das centenas de especialistas que todos os anos são ouvidos pelo Fórum Económico Mundial (FEM) no seu estudo sobre os principais riscos globais. Este ano aconteceu. Um terço dos 896 inquiridos – do mundo académico, empresarial, responsáveis de governos ou de organizações não-governamentais (ONG) – são europeus.

Sem que os receios sobre o andamento da economia tenham desaparecido, é encarado como real o risco associado a um conflito multilateral ou bilateral que possa assumir consequências significativas nas economias regionais ou a nível global – no comércio internacional, na moeda ou ao nível de recursos.

O estudo identifica 28 riscos para os próximos dez anos, distribuídos por categorias: económicos, ambientais, sociais, geopolíticos e tecnológicos. Depois dos receios sobre um conflito internacional, surgem referidos os eventos meteorológicos extremos, a queda de governos, o colapso de Estados, o desemprego, as catástrofes naturais, a inadaptação às alterações climáticas, a escassez de água, o abuso da protecção de dados e os ataques informáticos.

A dias do tradicional encontro global de Davos, de 21 a 24 de Janeiro na conhecida estância de esqui na Suíça, a conclusão que se retira do estudo está longe ser optimista (ainda que o intuito da análise seja, à partida, identificar riscos).

No inquérito – realizado entre Julho e Setembro – o “risco global” é definido com um evento ou uma condição incerta que pode causar um impacto negativo significativo em vários países ou economias em dez anos.

Ao contrário de outras edições, em que os riscos económicos – crises orçamentais, a evolução dos mercados financeiros ou o agravamento das desigualdades – apareciam em primeiro, desta vez os inquiridos consideram mais provável este risco geopolítico. No entanto, quando avaliam o seu impacto, os conflitos globais surgem em quarto, atrás da dimensão atribuída à escassez de água, à propagação das doenças infecciosas e às armas de destruição maciça.

Margareta Drzeniek-Hanouz, economista-chefe do Fórum Económico Mundial, frisa à Reuters que as preocupações económicas não desapareceram do mapa. Foram é relegadas para segundo plano.

No estudo, o FEM identifica alguns desses riscos: o aumento das tensões na Ásia Oriental, a aceleração da integração regional no Sudeste asiático, o aumento dos acordos comerciais regionais, a revolução do gás e do petróleo nos EUA, a turbulência no Oriente Médio e na Ucrânia, os processos de integração entre as economias da América Latina, a afirmação da China na economia global, o terrorismo.

O que aconteceu até se chegar aqui? O FEM dá a sua visão: “Quando a Guerra Fria acabou, inaugurou-se uma era de normas comuns na economia global; agora, mais de 25 anos depois a queda do Muro de Berlim, a competição estratégica está a regressar. O mundo está a braços com uma dinâmica aparentemente acelerada entre geopolítica e economia. A realpolitik não é orientada por questões ideológicas, inclui novos actores e desenrola-se num contexto de profunda integração económica”.

Ao contrário do que acontece no estudo deste ano, no balanço das respostas dos últimos dez anos em relação aos riscos geopolíticos, a ameaça de um conflito internacional aparece em último lugar (a menos referida pelos inquiridos). A preocupação mais presente ao longo dos anos é o risco de ocorrerem ataques terroristas. Os conflitos internacionais surgem mesmo atrás do risco identificado nas armas de destruição maciça, na queda de governos e no colapso de Estados.

Um olhar para a geografia das respostas ajuda a enquadrar o resultado da análise: um terço dos inquiridos são europeus (33,4%), a segunda maior franja de respostas vem dos Estados Unidos e Canadá (22,8%) e, depois, das economias emergentes da América Latina e da Ásia-Pacífico (cada uma das regiões com perto de 11%), cabendo às outras geografias uma participação sempre inferior.

No Council on Foreign Relations, em Washington, a directora-geral do FMI, Christine Lagarde, também falou nesta quinta-feira sobre riscos globais, focando-se nos efeitos de curto prazo. Em 2015, disse, é preciso medir o impacto na da subida do dólar no sistema financeiro e nos mercados emergentes, assim como o efeito da “normalização das políticas monetárias das economias desenvolvidas”, nomeadamente uma subida das taxas de juro de referência nos EUA.

Na zona euro e no Japão, Lagarde identifica outros riscos – o baixo crescimento e o longo período de baixa inflação. Quanto aos riscos geopolíticos, a directora-geral do FMI alerta para a crise ucraniana e para as “atrocidades recentes” em França , na Nigéria e no Paquistão.

Pires de Lima em Davos

Em Davos, nas cerca de 280 sessões de debate que vão ocorrer nos quatro dias de conferência, vão estar mais de 40 chefes de Estado e de governo, políticos e mais de 2500 empresários.

Marcam presença a chanceler alemã, Angela Merkel,  o Secretário de Estado norte-americano, John Kerry, o primeiro-ministro chinês, Li Keqiang, o homólogo turco, Ahmet Davutoglu, o presidente da África do Sul, Jacob Zuma, a directora-geral do FMI, Christine Lagarde, o director-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC), Roberto Azevêdo.

O desfile continua com nomes como Al Gore, Kofi Annan ou Bill Gates. O Governo português estará representado pelo ministro da Economia, António Pires de Lima.

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