Renegociação da dívida da Oi em tribunal deixa credores em suspenso

Pequenos obrigacionistas que investiram na PT em 2012 não sabem quanto, nem quando poderão recuperar os seus investimentos. que rondam os 230 milhões de euros.

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A Oi tinha 74 milhões de clientes no final de 2014 Rui Gaudêncio

“Alguma vez, há quatro anos, eu pensava que o BES e a PT eram um investimento de risco?” A pergunta, de um reformado de 73 anos, a quem um gestor de conta do BES convenceu, em 2012, a investir 50 mil euros em obrigações da PT, espelha o sentimento de incerteza partilhado com outros pequenos aforradores portugueses que se viram confrontados, na segunda-feira à noite, com o pedido de recuperação judicial apresentado pela Oi, a empresa de telecomunicações brasileira que é hoje a titular desta dívida. A única certeza, para já, é que o reembolso não acontecerá no dia 26 de Julho, como estava previsto.

Porque “há sempre uma primeira vez para tudo”, foi sem nunca antes ter investido em quaisquer aplicações que este reformado, que preferiu não ser identificado, se viu convencido a subscrever 40 mil euros em obrigações do BES e 50 mil em obrigações PT, ao abrigo da emissão Obrigações PT Taxa Fixa 2012/2016. Depois do primeiro susto com o BES, viu a emissão ser transferida para o Novo Banco, onde “correu tudo bem” e já foi reembolsado. Na PT, tudo tinha corrido bem, “até agora”, disse ao PÚBLICO.

Os primeiros sinais de alarme soaram-lhe quando, no início de Maio, foi surpreendido por uma comunicação, “veiculada pelos angariadores bancários e da parte de uma Portugal Telecom International BV, escrita em inglês”, em que se admitia que a Oi poderia não ter condições para cumprir o reembolso. Mas, da parte do banco, aconselharam-no a aguardar “a clarificação da situação”, já que vender as obrigações implicaria perder cerca de metade do valor investido.

Ontem, com o anúncio de abertura de um processo de recuperação judicial destinado a evitar a falência, vieram adensar-se as suas dúvidas em torno de quanto (e quando) poderá efectivamente vir a recuperar. Na mesma situação estão milhares de pequenos aforradores que ainda têm a receber um total aproximado de 230 milhões de euros. Embora o montante levantado pela PT em Julho de 2012 tenha sido de 400 milhões, no Verão passado boa parte dos subscritores aceitou o reembolso antecipado do investimento (quando a PT passou para as mãos da Altice e a dívida que era da PT passou para a Oi). Não foi o caso do aforrador com quem o PÚBLICO falou, e que deixou passar os prazos da operação porque estava fora do país.

Há semanas que a Oi (cujas acções serão excluídas dos índices de referência na bolsa brasileira) tenta, sem sucesso, negociar com os credores a reestruturação da dívida. Na segunda-feira à noite, já depois de ter acordado com o banco público BNDES (que também é seu accionista) a suspensão dos pagamentos por 180 dias, a operadora brasileira confirmou aquilo que o mercado há muito antecipava: a entrega de um pedido de recuperação judicial. O maior de sempre no Brasil, e um dos maiores na América Latina, como descreve a imprensa brasileira. A Oi, que é a maior concessionária de telefone fixo do Brasil (o que também obriga a empresa a fazer pesados investimentos na rede) e quarta operadora no móvel tinha, segundo dados da empresa, 74 milhões de clientes no final de 2014. E, de acordo, com o comunicado divulgado na segunda-feira, créditos que somam “aproximadamente 65,4 mil milhões de reais [17 mil milhões de euros]”.

O pedido de recuperação foi a “medida mais adequada” para “preservar a continuidade da oferta de serviços de qualidade a seus clientes” e “o valor das empresas Oi”, num cenário de “ameaças ao caixa (…) representadas por iminentes penhoras ou bloqueios em processos judiciais”, disse a empresa, que tem como accionistas (indirectos), antigos accionistas da PT como o Novo Banco e a Visabeira, mas também o BCP, que ficou com a posição da Ongoing, reunidos na Pharol (a holding que também ficou com os títulos de papel comercial de 897 milhões de euros da Rioforte).

“Quando o serviço da dívida é maior do que aquilo que a empresa consegue gerar, percebe-se que o elástico pode esticar, mas um dia rebenta”, afirmou ao PÚBLICO Octávio Viana, presidente da ATM, associação que representa os pequenos accionistas, ainda antes do anúncio do pedido de recuperação.

Há muito que o tema da dívida ensombra a Oi. Já era um problema quando, em 2013, Zeinal Bava assumiu a presidência da empresa (um ano antes de ser conhecido o investimento ruinoso da PT na Rioforte). Foi a necessidade de reduzir o endividamento que, em 2015, justificou a decisão de vender a PT Portugal, à Altice. Essa era uma condição para permitir uma aproximação à Tim (a operadora móvel da Telecom Itália), mas a própria Tim usou o argumento da dívida astronómica para recusar a fusão com a Oi. As negociações com a Tim foram interrompidas em Fevereiro deste ano e os rumores sobre o incumprimento da Oi começaram pouco depois.

Na terça-feira de manhã, a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) suspendeu os títulos da Pharol assim como as obrigações de retalho à espera de “informação relevante” por parte desta holding. Contudo, não será hoje que os obrigacionistas portugueses – ou tão pouco os pequenos accionistas da Pharol – ficarão a saber o que podem esperar do novo plano de reestruturação de dívida da Oi. A empresa tem dois meses para apresentar o plano.

Os accionistas da operadora vão ratificar o pedido de recuperação numa assembleia geral a 22 de Julho e os credores têm também de dar luz verde ao plano, antes que este seja fixado pelo tribunal, devendo depois decorrer num prazo de dois anos. Seja como for, interessa à empresa, aos credores e aos accionistas encontrar um equilíbrio, porque o cenário alternativo é o da liquidação da empresa.

No caso dos aforradores portugueses, chegou a estar na mesa a possibilidade de resgatar antecipadamente estes títulos com um desconto de 50% ou a troca das obrigações por outros títulos de dívida da Oi. Para os credores institucionais, um dos cenários discutidos foi o de trocar dívida por capital, a par do resgate antecipado do título, com um prémio de 12% a 15% face à cotação actual.

Para já, a bola está do lado da Oi e da sua capacidade em conseguir um plano que agrade minimamente aos credores e permita à empresa ser viável no futuro. Se isso acontecer, do outro lado do túnel poderão estar, um dia, investidores como o milionário egípcio Naguib Sawiris (do grupo Orascom), que disse à Bloomberg que, depois de reestruturar a dívida, a Oi será uma empresa com potencial, onde terá interesse em investir.

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