Quase um quarto das empresas portuguesas congelou salários

Sinais positivos da economia ainda não convencem totalmente as empresas a operar em Portugal, revela estudo da consultora Mercer. Percentagem aumentou dois pontos percentuais face a 2014.

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Salários dos operários caíram 1,38% este ano Daniel Rocha

Aumentar ordenados está ainda longe de ser uma opção para a generalidade das 307 empresas que responderam ao inquérito que a consultora de recursos humanos Mercer elabora anualmente sobre as tendências salariais e benefícios. Enquanto em 2014 cerca de 20% das organizações optou por congelar ordenados, este ano a percentagem aumentou para 22%, com as empresas à espera de sinais mais convincentes de retoma económica e de uma diminuição mais expressiva da taxa de desemprego.

No total, foram analisados 112.677 postos de trabalho e a maioria das empresas inquiridas (53%) são multinacionais. Neste universo, a palavra de ordem parece ser “prudência”. Não só aumentou o número de companhias a congelar salários, como houve uma descida de 1,6% dos vencimentos dos quadros da administração geral, 0,02% nos administrativos e de 1,38% nos operários. Nas restantes funções (chefias intermédias ou comerciais, por exemplo) registou-se uma subida ligeira, entre 0,25% e 1,52%, abaixo do que se verificou em 2014 (1,18% e 1,56%). A expectativa para o próximo ano também é tímida. Os salários deverão crescer entre 0,79% e 1,24%, indica o estudo Mercer Total Compensation Portugal 2015 (o FMI estima uma inflação de 1,3% para esse ano). Uma das explicações passa pela entrada de novos trabalhadores que aceitam auferir ordenados mais baixos.

“Apesar da recuperação económica e de todos os sinais positivos, as empesas ainda demonstram genericamente uma grande preocupação em não assumir custos, para não aumentar a sua estrutura de despesas. Ainda não se sentem confortáveis para assumir um conjunto de decisões que, mais cedo ou mais tarde, terão de assumir”, analisa Tiago Borges, responsável da área de estudos de mercado da Mercer.

A crise financeira tem sido usada, até agora, como justificação para não actualizar salários. A melhoria dos indicadores económicos e o aumento do salário mínimo de 485 para 505 euros a partir de Outubro do ano passado poderiam até indiciar mudanças nas políticas de remuneração que, até agora, não se verificaram. Ao mesmo tempo, há o sentimento de que chegou a altura de ganhar melhor, referiu recentemente à The Economist Maarten Keune, especialista em mercado laboral da Universidade de Amesterdão, referindo-se ao contexto europeu. “Antes da recessão disseram às pessoas que os salários teriam de se manter baixos para estimular as exportações, depois veio a crise e os salários continuaram reprimidos. Mas agora que a crise está a chegar ao fim há um sentimento de: ‘Chegou a nossa vez’”, disse.

Tiago Borges ressalva que a retoma varia conforme os sectores e actividades económicas e há os que ainda mantêm como válido o argumento da crise para não subir vencimentos. Contudo, admite que “em termos mais globais, e a não ser que a economia volte a entrar em recessão, não é sustentável” continuar a usar a mesma justificação. “As empresas não podem ad eternum congelar salários, ficariam fora do mercado e as pessoas começariam a sair. Penso que ainda há alguma margem devido ao clima de receio, os colaboradores valorizam neste momento a estabilidade no emprego mas isso é, cada vez menos, uma justificação, sobretudo numa altura em que a taxa de desemprego está a descer, ainda que se mantenha elevada em níveis históricos”, continua.

O estudo também aborda as intenções de contratação e conclui que cerca de 26% tenciona aumentar o seu quadro de pessoal mas 14% tem planos para despedir. Outra das conclusões refere-se ao salário base anual dos recém-licenciados: no primeiro emprego, recebem entre 11.950 e 18.177 euros, no universo de empresas questionadas. E nas 307 organizações, 5% dos quadros de topo são ocupados por estrangeiros.

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