Portugal leva proposta a Bruxelas para exportar energia renovável para a UE

Governo propõe meta vinculativa de 25% da capacidade de trânsito nas "auto-estradas" de electricidade na UE. Quer prioridade para o assunto em defesa do qual já ameaçou veto e calcula que o país tem um potencial eólico quatro vezes superior à sua capacidade actual.

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Portugal pressiona Comissão Europeia nas renováveis

A União Europeia não conseguirá atingir as novas metas de clima e energia para 2030, a custos suportáveis para os consumidores, se não comprar energia renovável a Portugal e Espanha, países mais abundantes em vento e sol e, por isso, mais baratos para produzir. É este o motivo de base que o Governo português apresenta para a proposta inédita que enviou esta semana à Comissão Europeia e que pode levar o país a tornar-se exportador de energia renovável para a UE.

Terça-feira passada, o ministro do Ambiente e da Energia, Jorge Moreira da Silva, enviou aos comissários europeus com as respectivas áreas uma carta em que propõe uma meta vinculativa de 25% de capacidade de interligação das redes eléctricas entre todos os estados-membros até 2030. “É um assunto prioritário”, diz, dada “a necessidade de transferência física, entre estados-membros, da electricidade produzida de fontes renvováveis”, a custos eficientes.

A meta defendida significa, na prática, que a UE deve ter "auto-estradas" de electricidade com espaço suficiente para deixar circular 25% da capacidade de produção instalada em todo o seu território dentro de 16 anos. Como meta intermédia para 2020, defende 12% e, “no muito curto prazo”, 10%. “Se a política europeia para 2030 quer impulsionar o uso de energias renováveis, isto significa que precisamos de um roteiro” para as interligações, escreve o ministro.

Nos últimos meses de negociações para o novo pacote Clima e Energia 2030, o Governo português tem defendido a adopção de uma quarta meta vinculativa, em cimeiras de chefes de Governo e de Estado da UE e da OCDE, de forma a que o assunto deixe de ser uma preocupação apenas portuguesa e espanhola a passe a ter âmbito comunitário.

Em Dezembro passado, na votação do relatório do Conselho de Energia sobre o Mercado Interno de Energia, Portugal chegou a ameaçar veto, por o documento nada propor quanto ao atraso crónico na interligação entre a Península Ibérica e França. A Península Ibérica era apenas retratada como a “excepção” na lista de projectos de interesse comum da UE e que não atingiria a meta no prazo previsto. No final, a versão aprovada mostra que os Vinte e Oito concordaram que “deve ser dada prioridade aos estados-membros que estão mais longe de atingir a meta”, requerendo-se “investimento significativo” nestas infra-estruturas.

Outra carta que os ministros da economia, energia e ambiente de oito países da UE escreveram em vésperas de Natal, entre os quais a Alemanha, França, Itália e Portugal, em defesa de metas ambiciosas para o consumo de energia renovável (40%), também refere por duas vezes a necessidade de “aumentar a capacidade de interligações” para que os compromissos sejam cumpridos.

Nas metas actuais, que constam da chamada lista de Projectos de Interesse Comum (PCI) que define as redes transeuropeias prioritárias para a UE, o objectivo de interligação da Península Ibérica é de apenas 4%, encontrando-se em 1,6% neste momento. Portugal considera-a insuficiente para a ambição das metas de clima e energia que têm sido discutidas, apesar de o acordo vir longe.

Na missiva de terça-feira,  o Governo reafirma que está do lado das metas mais exigentes para 2030: redução das emissões domésticas de dióxido de carbono em 40%, em relação a 1990, 40% do consumo de energia a partir de fontes renováveis, 30% de aumento de eficiência energética, a que junta a quarta meta, de 25% nas interligações.

Os primeiros cálculos de que o Governo dispõe, segundo apurou o PÚBLICO, dizem apenas respeito ao potencial eólico adicional. Estes indicam que Portugal tem condições naturais para ter quatro vezes mais capacidade instalada do que a actual (de 5 gigawatts (GW) para 20), e Espanha também (de 25 GW para 100 GW), de acordo com dados desenvolvidos pela Direcção-Geral de Energia e Geologia e pela Agência Portuguesa do Ambiente.

Com o estrangulamento histórico que impede a circulação de energia eléctrica da Península Ibérica para França, e daí para o resto da Europa, Portugal pede aos seus parceiros europeus que levem a sério este assunto, ao fim de décadas perdidas a que a França resistiu. Os novos corredores de electricidade para a Europa podem também atrair investimento, empresas e emprego.

A discussão sobre a quantidade e a ambição das metas vinculativas do novo pacote de clima e energia, que vão de 35% a 40%, têm dividido os países e a Comissão Europeia. Países como a Polónia e o Reino Unido defendem apenas uma meta, de modo a terem margem de manobra para explorar carvão e gás xistoso. Os ingleses alegam ainda que as novas linhas de alta tensão vão encarecer a energia eléctrica. Às três metas tradicionais que estão em cima da mesa – redução das emissões de CO2, consumo de energia de fontes renováveis e eficiência energética -, Portugal acrescentou à discussão uma quarta: 25% de capacidade de interligação eléctrica.

A Comissão deverá divulgar o Livro Branco do Pacote Clima e Energia 2030 no próximo dia 22 de Janeiro, mas tudo fica para mais tarde, para o executivo comunitário que se segue, tendo pela frente cerca de dois anos de negociação até as novas metas chegarem a lei.

Notícia corrigida às 13h36: Espanha tem potencial eólico correspondente a quatro vezes a sua capacidade instalada, tal como Portugal, e não cinco.
 

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