Portas recebido por Manuel Vicente em visita-relâmpago a Luanda

Deslocação surge num contexto de quebra das exportações para Angola e inclui encontro com o número dois do Governo.

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Portas vai estar na Feira Internacional de Luanda, dedicada nesta quinta-feira a Portugal Nuno Ferreira Santos

O vice-primeiro ministro, Paulo Portas, aterra nesta quinta-feira de manhã em Luanda para uma viagem de apenas 24 horas, numa conjuntura de crise económica para a economia angolana devido à baixa do preço do petróleo (que levou a cortes fundos no investimento e está a reflectir-se no clima social) com fortes impactos nas exportações portuguesas e nas empresas com negócios neste país.

Nos primeiros quatro meses do ano,  as vendas de bens para este país de língua portuguesa encolheram  25%, o que significa menos cerca de 300 milhões de euros face a idêntico período do ano passado. Ao mesmo tempo, as empresas estão com dificuldades em transferir verbas para fora do país devido à falta de divisas (o que obrigou a criar um alinha de apoio ao crédito), e têm de lidar com mais atrasos nos pagamentos.

Isto quando mais de 5000 empresas dependem a 100% de Angola para exportar (56% do total que vendem para este país). Ao mesmo tempo, o vice-primeiro-ministro chega a este país africano poucos dias após a Lusa ter noticiado que o Estado angolano abandonou o Tribunal Arbitral responsável por decidir sobre o processo que opõe a Sociedade Portuguesa de Empreendimentos (detida pelo Estado português) e Angola por causa da revogação da licença de exploração de diamantes da SML (detida pela SPE e pela estatal angolana Endiama). Fonte governamental de Luanda afirmou mesmo à Lusa este poderia ser “o prelúdio do início de um conjunto de retaliações” contra Portugal. No entanto, a estratégia pode também ser vista como uma táctica negocial de modo a tentar ganhar terreno num processo que se arrasta desde 2011.

A mensagem de Portas, no entanto, deverá ser a de destacar a importância dos laços, nomeadamente económicos, entre os dois países, até porque a sua presença surge por ocasião da Feira Internacional de Luanda (Filda), que nesta quinta-feira dedica o dia a Portugal. Das 67 empresas portuguesas registadas no evento, o maior do país, 24 marcam presença pela primeira vez. Antes da deslocação à Filda, e da participação num encontro da Câmara de Comércio e Indústria Portugal-Angola, Portas irá ter uma reunião com Manuel Vicente, vice-presidente da República e ex-presidente da Sonangol.

No final de Junho, já o ministro da Economia, António Pires de Lima, tinha estado em Luanda para, também numa visita de curta duração, dar o pontapé de saída para a criação de um observatório para o investimento entre os dois países. Os membros deste executivo, aliás, protagonizaram diversas viagens a Angola durante a legislatura, mas há ainda diversos problemas por resolver entre os dois países. Um das questões pendentes tem a ver com a agilização dos vistos. Outra tem a ver a o acordo para evitar a dupla tributação, um velho problema que tem atravessado vários governos sem ficar resolvido.

Quando em Março de 2012 o então ministro das Finanças Vítor Gaspar foi a Luanda em visita oficial, foi dado um passo em frente neste dossier, com o anúncio de que os dois países iriam dar início às negociações formais para chegarem a entendimento.

Mas com o esfriar das relações diplomáticas entre Angola e Portugal a convenção ainda não saiu da gaveta. Depois de o Presidente angolano anunciar a suspensão da parceria estratégica, o assunto parece ter ficado em segundo plano. Até os protagonistas desse aperto de mãos em Luanda já não estão hoje à frente das respectivas pastas das Finanças: Vítor Gaspar saiu em Julho de 2013 e, em Luanda, Carlos Lopes foi substituído dois meses antes por Armando Manuel como ministro das Finanças angolano.

Angola ainda não celebrou com nenhum país um acordo para evitar a dupla tributação, um tipo de convenção usada no direito internacional para mitigar ou mesmo impedir que dois Estados tributem o mesmo rendimento.

Quando as negociações foram anunciadas, a expectativa era que Portugal fosse o primeiro Estado com quem Angola celebrava um ADT, como são conhecidos estes acordos. Portugal tem em vigor convenções ADT com 64 países, havendo mais sete já assinadas para permitir que os rendimentos obtidos no estrangeiro tenham direito a crédito de imposto pelo facto de já serem tributados no outro país. O PÚLICO questionou, sem sucesso, o Ministério das Finanças sobre em que ponto se encontram as negociações para concluir o ADT.

Apesar da ausência de um acordo com Angola, “Portugal tem mecanismos unilaterais que não dependem de uma convenção, o que permite mitigar a dupla tributação de fonte estrangeira por um residente”, lembra Paulo Rodrigues, da área de tributação internacional da consultora Deloitte.

A inexistência de um acordo é vista como um desincentivo ao investimento estrangeiro e “há situações em que essa ausência faz com que os fluxos de rendimento estejam sujeitos à tributação local, que ocorre sobre o montante bruto dos rendimentos, fazendo com que na prática possa existir alguma perda de rentabilidade relevante nesses fluxos de rendimento [das empresas]”, diz Paulo Rodrigues.

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