Pôr Internet no bolso dos clientes está a transformar o negócio dos operadores

Em Portugal fala-se menos ao telemóvel, mas as receitas dos serviços de dados ainda estão muito aquém das chamadas.

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Os smartphones oferecem mais concorrência às chamadas de voz e SMS Lee Jae-Won/Reuters

O número de smartphones está a aumentar e, com ele, o número de pessoas que têm no bolso formas de comunicação alternativas aos telefonemas e SMS: desde redes sociais como o Twitter e o Facebook até aplicações como o Skype e o Viber, que permitem mensagens e chamadas gratuitas via Internet. Basta que o aparelho tenha uma ligação de dados ou se ligue à Internet através da rede sem fios de casa ou do trabalho. Junte-se a tecnologia à crise e o resultado é uma quebra no tempo passado a falar ao telemóvel em Portugal.

Dados da Anacom, o regulador do sector, indicam que o número de minutos de chamadas feitas a partir de telemóveis caiu este ano. No terceiro trimestre, o último a que a informação diz respeito, a duração total das chamadas (5300 milhões de minutos, 142 minutos mensais por utilizador) tinha ficado 2,5% abaixo do mesmo trimestre do ano passado. O acumulado de minutos ao longo dos primeiros nove meses foi, pela primeira vez na última década, inferior ao do ano anterior.

"A tecnologia permite que parte das necessidades das comunicações de voz sejam satisfeitas de outras formas, nomeadamente através da Internet", observa o economista João Confraria, vogal do conselho de administração da Anacom.

A popularidade dos smartphones e de aplicações como o Facebook e o Skype afecta o negócio dos operadores móveis de várias formas, explica por sua vez Francisco Jerónimo, analista da IDC em Londres para o mercado europeu. Por um lado, contribui para um decréscimo das chamadas e desvaloriza a relação entre operador e cliente: "Se alguém passar a usar só o Facebook Messenger, tanto pode estar na Optimus, como na Vodafone, como noutro qualquer".

Por outro lado, estas aplicações fomentam a procura por um plano de Internet no telemóvel. Mas o especialista nota que Portugal é um mercado particular: o preço médio dos smartphones vendidos está muito abaixo da média europeia e muitos clientes compram um aparelho sem plano de dados.

Segundo a IDC, o mercado dos telemóveis em Portugal tinha caído 18% no terceiro trimestre face ao mesmo período de 2011. Mas os smartphones, de que se venderam então 451 mil unidades, tinham crescido 21% - naquele período, quatro em cada dez telemóveis vendidos foram smartphones. Contactadas pelo PÚBLICO, Optimus, TMN e Vodafone afirmaram que as vendas permaneceram positivas ao longo do quarto trimestre.

A TMN e a Optimus não revelam quantos clientes com smartphones têm um plano de acesso à Internet. Na Vodafone, 27% dos clientes têm um smartphone e, destes, praticamente seis em cada dez têm um plano para acesso à Internet.

As receitas dos serviços de dados são já uma percentagem significativa do total, mas estão muito abaixo do conseguido com as chamadas. Na TMN, "o peso das receitas "não voz" foi no terceiro trimestre de 33%", disse a empresa, que não quis especificar que parte vem dos SMS e que parte dos tarifários de Internet. Na Optimus, 31% das receitas de serviços vieram de dados. Tirando os SMS, este valor é de 24% do total. A Vodafone não divulga estes números.

Em Portugal, os operadores dizem não ver nas aplicações de terceiros uma ameaça ao negócio, em parte devido aos muitos tarifários com SMS gratuitos. Noutros mercados, o cenário é diferente. Em Novembro, Espanha tornou-se o primeiro país em que os operadores se aliaram para oferecer uma aplicação para smartphones que permite aos utilizadores comunicarem através da Internet e que concorre com aplicações como o Viber ou o Facebook. Chamada Joyn, é uma iniciativa da GSM Association, o organismo que representa a indústria a nível mundial, e deverá alargar-se a outros países.

Francisco Jerónimo explica que "o grande desafio dos operadores é perceber onde vão poder entrar nesta cadeia de valor" e não se tornarem apenas nos fornecedores da rede sobre a qual outros disponibilizam serviços. "Se todos usarem o Facebook Messenger", exemplifica, os operadores "ficam dependentes" da rede social. João Confraria, da Anacom, observa que o sector está numa fase de "alteração do modelo de negócio, que corresponde a alterações tecnológicas", também porque as empresas, tanto no sector fixo como no móvel, investiram "bastante em novas gerações de infra-estruturas de rede" que agora pretendem rentabilizar.

Confraria diz que "ainda é cedo" para perceber como vai ser feita a transição no negócio dos operadores. Jerónimo vai mais longe: "Eles próprios ainda não sabem bem". Mas a estratégia, diz o analista da IDC, passará "pela oferta de serviços, pela venda de dados, por tarifários mais ajustados".

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