Parlamento vota nova lei dos reguladores sob coro de críticas

Supervisores criticam medidas previstas no diploma, sobretudo as ligadas às incompatibilidades e revisão salarial.

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O presidente do Tribunal de Contas, Guilherme d’Oliveira Martins Nuno Ferreira Santos

A nova lei-quadro das entidades reguladoras, que surgiu de uma exigência da troika, vai ser votada nesta quarta-feira no Parlamento sob um coro de críticas dos supervisores.

Algumas das medidas do diploma aprovado em Conselho de Ministros no início de Março, nomeadamente as que dizem respeito às regras das incompatibilidades e ao estatuto remuneratório dos cargos de administração, continuam a gerar desconforto.

Nos pareceres disponibilizados no site da Assembleia da República, onde a lei será votada na generalidade pelas 15h, uma das críticas mais fortes parte da Autoridade Nacional de Comunicações (Anacom), uma das nove abrangidas pelo diploma.

Esta entidade, liderada por Fátima Barros, escreve que “não se afigura compatível ou apropriado" que uma lei-quadro seja "contaminada por medidas especificamente determinadas para socorrer num contexto circunstancial transitório e excepcional”. Sustenta que algumas das regras constituem “um retrocesso na autonomia de alguns reguladores”, quando a exigência da troika ia no sentido de reforçar a independência destes órgãos.

Há medidas no diploma que têm provocado especial polémica, como é o caso de os membros do conselho de administração e de os directores serem proibidos de trabalhar no sector que supervisionaram por um período de dois anos, a partir do momento em que cessarem funções no regulador.

A Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE), por exemplo, explica que “não havendo nenhuma empresa no país que não tenha relações comerciais com empresas de energia, uma aplicação rigorosa da lei excluiria uma candidatura a qualquer emprego”.

Já a Autoridade da Concorrência propõe que a possibilidade que é dada aos conselhos de administração, de serem compensados com metade do salário durante o período de afastamento de dois anos, seja alargada aos directores dos supervisores.

Por sua vez, o Instituto Nacional da Aviação Civil (INAC), diz que estas regras vão trazer “um acréscimo de dificuldades, até inultrapassáveis, no que se refere ao recrutamento de pessoal”, pedindo por isso uma excepção à medida.

Gestão do INAC quer mandato renovado
O facto de a nova lei proibir a renovação de mandatos, que passam a ter duração de seis anos, também gerou críticas por parte do INAC, que exige que os actuais membros da administração, que cessam funções no final de 2014, sejam reconduzidos. O regulador sugere que esta possibilidade seja dada aos supervisores que eram institutos e agora vão ser transformados em entidades reguladoras (como acontece igualmente com a Anacom), embora não explique com que fundamento.

Há apenas dois reguladores que vão passar ao lado das novas regras por decisão do Governo: o Banco de Portugal e a Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC). No parecer do Tribunal de Contas, esta opção é criticada. Embora o órgão liderado por Guilherme d’Oliveira Martins diga compreender o caso do banco central, escreve que no que diz respeito à ERC “não se vislumbra justificação para a sua exclusão”, propondo que “seja abrangida na lei-quadro”.

Apesar de o TC sugerir um alargamento da aplicação da lei, há supervisores que têm uma visão diferente. A Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) e o Instituto de Seguros de Portugal (ISP), que com o Banco de Portugal compõem o Conselho Nacional de Supervisores Financeiros, exigem ser equiparados ao banco central. Ou seja, exigem ser excepção às medidas inscritas no diploma.

“A solução mais adequada parece ser a do tratamento noutra sede do regime das entidades que integram o Conselho Nacional de Supervisores Financeiros”, escreve a CMVM. Já o ISP refere que “o adequado funcionamento do sistema de supervisão do sector financeiro supõe o mesmo modelo de independência das três autoridades de supervisão” que compõem o conselho de supervisores financeiros.

Também as alterações no estatuto salarial destas entidades geraram desconforto, apesar de as mudanças inicialmente planeadas pelo Governo terem sido suavizadas. Em meados do ano passado, a ideia passava por equiparar as remunerações dos membros da administração à do primeiro-ministro, mas a intenção foi abandonada, dando lugar à criação de uma comissão de vencimentos em cada regulador, sem a existência de limites máximos nos salários.

O TC critica abertamente a decisão. “Deveria ficar assegurado no projecto que a remuneração dos membros do conselho de administração das entidades reguladoras fica sujeita a limites”, dando como referência o facto de ter sido adoptado esse modelo nas leis que regulamentam os salários dos gestores de empresas e de institutos públicos.

Mas há supervisores com pontos de vista diferentes. A Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos sublinha que “são reformuladas as responsabilidades dos titulares dos órgãos, apenas se admitindo a revisão do estatuto remuneratório no caso de se traduzir numa redução” dessas responsabilidades.

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