Olli Rehn: Decisões do programa de ajuda são do Governo, não da troika

Comissário europeu nega que cortes nas pensões e privatizações da EDP e da REN tenham sido imposições dos credores internacionais a Portugal.

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Olli Rehn diz que o momento mais difícil do programa português foi a demora na apresentação do pedido de ajuda Georges Gobet/AFP

Os cortes operados nas pensões de reforma em Portugal, a par da venda da EDP e da REN aos chineses, resultaram de decisões do Governo português, afirmou nesta segunda-feira Olli Rehn, comissário europeu responsável pelos assuntos económicos e financeiros, negando implicitamente que estas medidas tenham sido impostas pela troika de credores internacionais.

No caso da privatização da empresa de distribuição de energia (EDP) e da rede eléctrica (REN), tratou-se de uma “decisão do Governo português no quadro do programa” de ajuda externa, afirmou Rehn durante uma audição no Parlamento Europeu (PE) e em resposta a uma pergunta da eurodeputada socialista portuguesa Elisa Ferreira. A redução das pensões “também é uma decisão do Governo português em diálogo com as instituições” da troika de credores (Comissão Europeia, Banco Central Europeu e Fundo Monetário Internacional), garantiu.

O comissário estava a ser ouvido no quadro da investigação em curso no PE sobre a legitimidade democrática da acção da troika na negociação e no acompanhamento dos programas de ajustamento económico e financeiro assumidos por Portugal, Grécia, Irlanda e Chipre em troca de assistência financeira da zona euro e do FMI.

Segundo Rehn, o momento mais difícil do programa português foi a demora na apresentação do pedido de ajuda por parte do Governo de José Sócrates, que só surgiu muito depois de a zona euro ter constatado que se tornara inevitável.

“Tivemos muitos períodos de desafio com Portugal, mas penso, de facto, (…) que o pior, ou o mais crítico, foi no período que antecedeu o programa porque tivemos muitas discussões com o ministro das Finanças de Portugal muito muito antes” de Lisboa ter apresentado o pedido, afirmou em resposta a uma pergunta de Diogo Feio, do CDS.

Isto porque, precisou, “já era muito claro algures em 2010 que a menos que Portugal assumisse uma acção muito forte em termos de reformas económicas e de consolidação” orçamental iria enfrentar taxas de juro “proibitivas” que o afastariam do mercado da dívida.

Face à bateria de perguntas dos eurodeputados sobre a legitimidade da troika e das políticas impostas pelas suas instituições aos países ajudados, o comissário afirmou que a criação desta instância informal foi decidida, há quatro anos, pelos governos da zona euro sob uma pressão “extrema” no plano político e de calendário na altura em que a Grécia, à beira da bancarrota, pôs a moeda única europeia em risco.

“A Europa teve de criar rapidamente estruturas que não estavam previstas”, nomeadamente com a criação de um fundo de socorro para estabilizar os países em dificuldades, a par da troika, para conduzir os processos de ajustamento económico e financeiro associados à ajuda. “No pico da crise foi preciso fazer compromissos”, acrescentou.

Apesar destas “limitações”, a troika “funciona relativamente bem”, nomeadamente porque permitiu a combinação da experiência das três instituições que a compõem, defendeu Rehn. O comissário deixou aliás implícito que o FMI, cuja presença na troika foi imposta pela Alemanha, deverá continuar presente mais algum tempo, citando em favor desta tese o apoio “inequivocamente favorável” expresso pelo novo ministro – social-democrata – alemão Frank-Walter Steinmeier.

Para Rehn, a troika “não é o problema, mas o início da resolução do problema” provocado pela acumulação de desequilíbrios macroeconómicos em vários países. “Os problemas dos países sob programa começaram muito antes do programa, e o programa teve de resolver estes problemas, não o contrário”, afirmou, considerando que esta situação “é muitas vezes esquecida no debate actual”. Em 2010, quando a extensão dos problemas orçamentais da Grécia começou a ser conhecida, a zona euro poderia ter optado por uma “queda livre e incumprimento desordenado” da dívida grega, o que “teria sido pior para a Grécia e para a Europa”, sustentou.

Segundo o comissário, ainda, os programas que correram mal, como na Grécia, resultaram da “turbulência política” do país entre 2010 e as eleições legislativas de Junho de 2012. Foram igualmente as crises políticas que tornaram inevitáveis os erros sucessivos das previsões económicas da troika, sustentou.

“O grau excepcionalmente elevado de incerteza” vivido pela zona euro nomeadamente em 2011 e 2012 teve um impacto na procura interna, afirmou, citando o caso específico da Grécia e de Itália em que a turbulência foi tal que provocou o “descarrilamento” das previsões económicas.

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