OCDE prevê crescimento mais baixo do que o Governo para este ano e o próximo

Oorganização está mais pessimista em relação à recuperação do consumo privado, mas mais optimista em relação às exportações.

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O secretário-geral da OCDE e a ministra das Finanças na apresentação das conclusões do relatório Enric Vives-Rubio

Com os portugueses ainda muito endividados, o consumo privado não vai conseguir ser o motor da retoma portuguesa, que será por isso mais lenta do que aquilo que o Governo está a prever, alerta a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE).

No relatório sobre Portugal publicado esta segunda feira, a entidade sedeada em Paris apresenta estimativas de crescimento para Portugal durante este ano e o próximo que são mais pessimistas do que as apresentadas pelo Executivo na sua proposta de Orçamento do Estado. A OCDE prevê que a economia cresça 0,8% este ano e 1,3% no próximo. O OE baseia-se num crescimento de 1% em 2014 e de 1,5% em 2015.

As diferenças em relação à variação do PIB são relativamente pequenas, mas é notória uma diferença muito significativa entre aquilo que a OCDE e o Governo pensam acerca do padrão de crescimento que se irá observar na economia portuguesa.

Enquanto o Executivo espera que o consumo privado continue a acelerar em 2015 depois da surpreendente recuperação registada este ano, a OCDE está a apontar para o regresso do consumo a taxas de crescimento muito modesta já no próximo ano. No relatório publicado esta segunda-feira, os técnicos da OCDE estimam uma variação de 1,5% do consumo privado este ano e de 0,5% no próximo. Do lado do Governo, aponta-se para um crescimento de 1,8% em 2014 e de 2% em 2015. De igual modo, a OCDE prevê uma contracção maior do consumo público que o Governo.

O relatório explica as razões desta previsão bastante mais modesta para o consumo, tanto público como privado: “A continuação da necessária consolidação orçamental, os níveis elevados de endividamento no sector privado e o desemprego alto vão limitar a procura doméstica”.

Isto significa que, para a OCDE, aquilo que aconteceu na primeira metade de 2014, em que o consumo privado recuperou e sustentou uma parte significativa do crescimento do PIB português, não se continuará a verificar nos próximos anos.

A compensar esta visão pessimista do contributo do consumo, a OCDE é contudo mais optimista em relação a outros indicadores. Prevê que as exportações cresçam 5,4% em 2015, superando a variação de apenas 3% nas importações. O Governo está bastante menos confiante num contributo tão positivo da procura externa líquida (exportações menos importações) e prevê que as exportações cresçam 4,7%, contra 4,4% nas importações.

Em relação às importações, a diferença de previsões está relacionada com a forma como OCDE e Governo vêem o consumo a evoluir. Mas no que diz respeito às exportações, o Governo, embora esteja a ser criticado por muitos analistas por ser demasiado optimista, acaba por ser mais prudente que a OCDE nas suas expectativas em relação à procura externa direccionada ao país.

E, de facto, o recente abrandamento da economia europeia, com países como a Alemanha e a França a revelarem fragilidades no crescimento, torna mais difícil a vida às empresas exportadoras portuguesas.

O que será então que leva a OCDE a apresentar projecções tão favoráveis para as exportações portuguesas. No relatório, a explicação não é óbvia. O que é dito é que, perante o cenário de endividamento elevado, o único caminho que a economia portuguesa pode seguir é o de aumentar o investimento no sector exportador e, consequentemente, vender mais bens e serviços ao estrangeiro. “Perante um cenário de necessidade de mais investimento e a precisar também de reduzir a dívida externa, um aumento sustentado das exportações será a chave para criar mais empregos e promover a inclusão social”, afirma a OCDE.

Para que o crescimento das exportações seja possível, os técnicos da OCDE deixam ainda algumas recomendações. Aumentar a concorrência nos sectores dos bens não-transaccionáveis como a energia, garantir que a negociação salarial seja feita ao nível de cada empresa evitando a extensão da contratação colectiva e melhorar a ligação entre as universidades e as empresas são apresentadas como as soluções para as exportações crescerem mais do que já têm crescido.

O risco da deflação
A OCDE alerta que as previsões de crescimento por si apresentadas têm riscos. Mas estes não estão nas exportações. A maior preocupação está virada para  o perigo de deflação.

O relatório afirma que “com a inflação a entrar em terreno negativo desde o início de 2014, existe o risco de a deflação se tornar mais persistente, num contexto de inflação baixa na zona euro”. “Isto pode fazer descarrilar a retoma e tornar a redução de dívida mais difícil”, avisa. A OCDE está particularmente preocupada com o efeito que uma descida de preços prolongada teria no sector empresarial, que está muito endividado e onde “mais de 40% das firmas com empréstimos bancários não são capazes de fazer face ao seu serviço de dívida com os seus rendimentos operacionais”.

O outro risco detectado pela OCDE está na possibilidade de deterioração da situação do sistema financeiro nacional.

Efeitos no OE
A previsão ligeiramente mais baixa da OCDE para o crescimento em 2015 pode ser, caso se concretize, um problema para as metas orçamentais do Governo para o próximo ano. Aliás, apesar de o OE apontar para um défice de 2,7%, a OCDE projecta que no final do ano não se consiga melhor do que 2,9%.

O problema para as contas públicas poderá não estar tanto na possibilidade de um crescimento económico de 1,3% em vez dos 1,5% em que o Governo baseia as contas do orçamento. Mais preocupante para as finanças pública é se se confirma que o consumo privado não cresce à taxa de 2% prevista pelo Governo mas apenas de 0,5%.

É que a evolução do consumo privado é fundamental para o andamento da receita fiscal, especialmente dos impostos sobre o consumo como o IVA, que sustentam grande parte das expectativas de redução do défice para o próximo ano.

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