O ano horribilis em que a bolsa encolheu 25% e o PSI-20 já só tem 18 cotadas

O principal índice da Bolsa de Lisboa perdeu mais de 9200 milhões de euros em 2014, em grande parte por causa da derrocada do Grupo Espírito Santo, que abalou a confiança dos investidores nacionais e estrangeiros.

Nuno Ferreira Santos

Ao fim de poucos meses, tudo mudou. O que no início parecia ser uma trajectória de ganhos sem paralelo na Bolsa de Lisboa acabou por se transformar num ano horribilis para a praça portuguesa. Contrastando com o ganho de 18% que apresentava em Março, o principal índice da bolsa nacional, o PSI 20, chega ao final de 2014 a perder cerca de 25% do seu valor e reduzido a 18 títulos.

A capitalização bolsista do índice – feitas as contas até à última sessão, a 24 de Dezembro – ascende agora a cerca de 45,3 mil milhões de euros, o valor mais baixo desde 2008, ano em que a crise financeira, ampliada pela falência do Lehman Brothers, abalou violentamente os mercados financeiros internacionais.

A culpa de quase tudo o que aconteceu de mau na Bolsa de Lisboa no último ano teve o epicentro na crise do Grupo Espírito Santo (GES), que implodiu, levando ao desaparecimento do BES a 3 de Agosto, reduzido a banco mau, e da Espíríto Santo Financial Group (ESFG), holding que detinha a participação no banco. De uma assentada, o universo das 20 empresas que compunham o índice de referência da bolsa nacional ficou reduzido a 18 títulos, com a saída do BES e da ESFG. A reduzida dimensão das empresas cotadas fora do índice torna incerta a sua recomposição, uma situação que afecta negativamente a imagem da bolsa portuguesa, reduzindo ainda mais o seu volume de negócios.

A derrocada do GES arrastou ainda a Portugal Telecom (PT), exposta em cerca de 900 milhões de euros à Rioforte, do grupo GES, e teve efeitos colaterais fortes nos restantes títulos financeiros cotados, nomeadamente no BCP e no BPI. Estes dois bancos poderão ainda ter de pagar um adicional, relativo à muito provável diferença do valor de venda do Novo Banco e os 4900 milhões de euros injectados através do fundo de resolução, assegurado pelos maiores bancos nacionais, incluindo estas duas instituições.

“Se, por um lado, a recuperação da credibilidade do país ajudou a baixar o custo de financiamento do Estado, por outro, factores internos (caso do BES) e externos (Galp e Jerónimo Martins) contribuíram para um ano mau no PSI-20”, sintetiza Miguel Gomes da Silva, director da sala de mercados do Montepio Geral.

João Queiroz, director de negociação do Gobulling, do Banco Carregosa, nota que o “desempenho da bolsa portuguesa, este ano, ficará registado como um dos piores da história do mercado de capitais nacional” e que depois da saída das empresas do universo Espírito Santo e da crise na PT, o PSI-20 ficou “a quase 2000 pontos do mínimo histórico registado em 1993, aquando da sua criação”.

Sobre o impacto da crise BES-GES na bolsa lisboeta, o analista João Queiroz destaca que, para muitos investidores, “a forma de resolução da instituição de crédito que representava 20% do sector bancário doméstico de uma pequena economia muito aberta, sem políticas monetárias nem cambial e que carece continuamente de investimento estrangeiro directo, deverá e poderá ter implicações na atractividade e interesse que o nosso mercado de capitais poderá representar”.

Pedro Lino, director da Dif Broker, vinca que a saída das empresas aumentou a “percepção do risco no investimento em acções portuguesas”. O facto de o índice ficar ainda mais exposto a um “reduzido número de empresas”, cujo peso é muito díspar, também explica grande parte desta evolução, nota por seu lado Miguel Gomes da Silva.

Para além da derrocada do BES, o PSI-20 foi afectado negativamente pela queda do preço do petróleo, que atingiu particularmente a Galp e as construtoras, com destaque para o grupo Mota-Engil, e pelas tensões geopolíticas criadas pelo conflito na Ucrânia e crise na Rússia, com reflexos na Jerónimo Martins, que tem uma forte presença na Polónia. O grupo de distribuição acumulou uma forte desvalorização, recuando mais de 41%.

Face aos restantes mercados europeus, a queda da bolsa de Lisboa só encontra paralelo na bolsa grega, onde o principal índice acumula uma perda que supera os 26%, reflexo da forte instabilidade política e económica do país.

A queda do preço do petróleo, mais de 40% no brent, que serve de referência à Europa, o fraco crescimento, o risco de deflação na zona euro e as convulsões geopolíticas na Rússia roubaram boa parte dos ganhos amealhados na primeira metade do ano pelos principais índices bolsistas europeus. Ainda assim, a maioria deles encerra em terreno positivo, embora com ganhos modestos, à excepção do FTSE de Londres, que regista uma queda anual de 2%, e do CAC 40 de Paris, que fecha inalterado (até à última sessão, de 24 de Dezembro). O Eurostoxx 50, que agrega a 50 maiores companhias europeias, apresenta uma variação positiva de 2,4%.

As valorizações mais expressivas foram registadas pelo AEX de Amesterdão (5,9%), pelo IBEX 35 de Madrid (5,7%) e pelo DAX alemão (3,9%). A reflectir a recuperação da maior economia mundial, os principais índices norte-americanos apresentaram ganhos expressivos: o Nasdaq a valorizar 15,2%, o S&P 500 a ganhar 13,4% e o Dow Jones a subir 9,4%.

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