Novos empréstimos ao consumo regressam a níveis do início de 2011

Bancos emprestaram 272 milhões em Março. Crédito ao consumo atingiu o valor mensal mais alto em quatro anos. Mercado automóvel está a ajudar à recuperação.

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O montante dos novos créditos ao consumo concedidos aos particulares regressou em Março a valores próximos dos registados no início de 2011, poucos meses antes da entrada da troika. Os dados mais recentes do Banco de Portugal, relativos a Março, mostram que nesse mês foram atribuídos empréstimos no valor de 272 milhões de euros, neste segmento.

Os valores dos novos empréstimos são muito susceptíveis a variações de mês para mês, nem sempre totalmente explicáveis pelos dados da conjuntura desse período. Há, porém, uma constante no movimento dos últimos meses: desde Setembro, os bancos concederam às famílias, em empréstimos ao consumo, sempre mais de 200 milhões por mês. Esta tendência não se verificava desde 2011, seja nos meses imediatamente anteriores ao pedido de resgate, seja nos primeiros depois da entrada da troika no país.

Para encontrar um valor mensal mais expressivo do que os 272 milhões de euros é preciso recuar a Março de 2011, mês em que os bancos tinham concedido 312 milhões. E só em Janeiro desse ano se encontra um valor semelhante ao de agora. Apesar do aumento nos novos empréstimos, o stock dos créditos (o total em balanço) ainda está em níveis de 2007.

Em relação a 2014, o ritmo de crescimento dos empréstimos continua a ser acelerado (30,7%), impulsionado pelo segmento do crédito automóvel, que acompanha o comportamento em alta no mercado de carros novos, cujas vendas estão a crescer a um ritmo expressivo (até Março tinham aumentado 36%, valor que abrandou para 32,5% no valor acumulado até Maio).

No crédito à habitação, os novos empréstimos também se mantêm desde finais do ano passado (Dezembro) acima dos 200 milhões de euros. Este segmento, tradicionalmente mais volumoso do que o crédito ao consumo, sofreu uma queda acentuada entre 2011 e 2013. Em Janeiro de 2012, o crédito ao consumo ultrapassa o montante mensal dos novos empréstimos à habitação atribuídos pelos bancos. E, a partir daí, o valor concedido passou a estar mais equilibrado entre estes dois segmentos. Em Março deste ano, foram concedidos 281 milhões para a habitação, valor que contrasta com os 176 milhões um ano antes e com 598 milhões há quatro anos, antes da intervenção da troika.

Os bancos estão a antecipar um aumento da procura de crédito, não apenas pelas empresas, mas também pelos particulares, apesar de a maioria dizer que vai manter os critérios de concessão dos empréstimos, que ficaram mais apertados nos últimos anos.

Margem para crescer?
Paula Carvalho, economista-chefe do departamento de estudos económicos e financeiros do BPI, fala numa “evolução positiva” visível no comportamento “de todos os indicadores de confiança” e que resulta da “confluência de vários factores condicionantes positivos que têm permitido o reforço do rendimento disponível dos particulares e a melhoria das expectativas quanto à sua evolução”.

Paula Carvalho refere as grandes tendências que considera estarem a permitir a maior concessão de crédito: “Os factores de fundo subjacentes incluem a melhoria verificada no mercado de trabalho, onde o ritmo de criação de emprego se mantém positivo há vários meses; os baixos níveis de inflação, possibilitando aumento do poder de compra, em termos reais; a queda dos preços dos combustíveis associada à baixa do petróleo, permitindo acomodar rendimento a outros bens e serviços (ou reforçar os níveis de poupança); a redução da carga fiscal desde início do ano (ainda que ligeira) e a reposição parcial de rendimentos retirados aos funcionários públicos do período de intervenção externa; também a queda das taxas de juro e dos níveis de spreads praticados pela banca”.

Além do ambiente proporcionado pelas baixas taxas de juro, pela melhoria na confiança dos consumidores e pela redução da taxa de desemprego, o economista-chefe do Montepio, Rui Bernardes Serra, lembra “o facto de a procura nos últimos anos ter estado reprimida, quer pela incerteza (o que levou a um aumento da poupança por motivo de precaução), quer pelo facto de os bancos terem tornado mais restritivos os critérios de concessão de crédito”.

Num cenário de descida do desemprego, enfatiza Rui Bernardes Serra, os bancos “poderão ter, à partida, uma maior propensão a conceder crédito neste segmento [consumo], que, quando o incumprimento é controlado, tende a apresentar margens superiores às do crédito à habitação”. Mas a “tendência recente” de privilegiar o crédito às empresas, sobretudo as que estão voltadas para as exportações, “em detrimento do crédito a particulares”, deverá continuar, acredita o economista-chefe do Montepio.

Há margem para os empréstimos aos particulares recuperarem nos próximos meses? Paula Carvalho nota que os níveis de endividamento das famílias “ainda permanecem algo elevados, se bem que o recente período de queda dos níveis de financiamento e a recuperação da actividade [económica] tenham já permitido um avanço significativo na sua diluição”. Se a dívida das famílias chegou a equivaler 95,8% do PIB em 2009, hoje esse rácio está em 84,4%, acrescenta a economista, considerando que “há mais espaço o acesso a financiamento”.

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