Neeleman quer uma velha conhecida para explorar novas rotas

Dono da Azul é já o maior cliente da manutenção da TAP e é nos Estados Unidos que está a sua maior aposta.

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O empresário fundou quatro companhias de aviação e hoje é dono da brasileira Azul REUTERS

É preciso falar mais devagar e ir moldando o discurso ao português do Brasil, mas David Neeleman não só compreende tudo, como se esforça por devolver na mesma língua. Faz, aliás, questão que assim seja, mesmo quando o incitam a usar o inglês para passar por cima das poucas palavras esquecidas. Alto, cabelo totalmente branco a combinar com uma camisa sem gravata, dificilmente passaria despercebido nas ruas de Lisboa, por onde andou na semana antes de apresentar uma proposta de compra pela TAP. Mas é profundamente discreto. Ouve mais do que fala e, quando fala, é só mesmo do que quer.

O empresário viveu apenas sete anos no Brasil, antes de os pais regressarem aos Estados Unidos. Em 2008, regressaria em força ao mercado brasileiro para lançar a sua quarta companhia de aviação, a Azul, que hoje ainda controla. A ligação da TAP ao país é o grande motivo pelo qual entrou na corrida à transportadora aérea portuguesa, já que dela depende a liberdade de muitos locais viajarem além-fronteiras, nomeadamente para a Europa. A sua relação com a companhia portuguesa, que também se estende ao presidente, Fernando Pinto, não é de negligenciar, visto que é o maior cliente da sua unidade de manutenção no Brasil.

Antes de criar a Azul, hoje a terceira maior transportadora aérea brasileira (a seguir à TAM e à Gol), fundou a low cost Morris Air, cujo crescimento despertou o interesse da Southwest, à qual viria a ser vendida, em 1993, por quase 120 milhões de euros (valores da época). Seguir-se-iam mais duas companhias: a canadiana Westjet e a norte-americana Jetblue, que Neeleman também já não controla. Aos 55 anos, mantém-se aos comandos da Azul, da qual é accionista maioritário e que no ano passado transportou 21 milhões de passageiros e gerou receitas superiores a 1,5 mil milhões de euros, até Setembro. Já o resultado líquido dos primeiros nove meses de 2014 foi negativo, em 23,3 milhões de euros. E a empresa tem falhado a entrada em bolsa, tendo já adiado por três vezes essa meta, à espera de melhores condições de mercado.

A proposta que Neeleman entregou inicialmente pressupunha a injecção de 300 a 350 milhões de euros na TAP, bem como uma profunda renovação da frota, com os olhos postos no mercado norte-americano, para onde a Azul começou recentemente a voar, e nas sinergias que podem ser obtidas na operação que as duas companhias já têm no Brasil. Mas a oferta foi entretanto melhorada, depois da fase de negociações com o Governo. O plano estratégico, onde entra a chegada de 53 novos aviões, saiu reforçado, mas não se sabe ainda se aumentou a fasquia pelo lado financeiro.

A instabilidade laboral na TAP sempre o preocupou e, por isso, foi o primeiro a acenar com uma política que já adoptou há algum tempo: a distribuição de 10% dos lucros pelos trabalhadores, quando existem. Por força das regras da União Europeia, que impedem investidores não-europeus de controlar companhias de aviação do espaço comunitário, Neeleman viu-se obrigado a procurar aliados para concorrer à privatização da companhia de aviação nacional. O consórcio que montou integra, por isso, a holding do empresário português Humberto Pedrosa, dono da Barraqueiro.

Pelo caminho, o dono da Azul deixa Germán Efromovich, que falhou pela segunda vez a compra da TAP. Já em 2012, o empresário, que controla o grupo sul-americano Avianca, tinha visto a sua proposta ser rejeitada, com o Governo a alegar falta de garantias financeiras. Também chegou a haver um terceiro candidato, o empresário português Miguel Pais do Amaral, mas este investidor foi excluído porque não apresentou uma oferta vinculativa pela empresa.

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