Moscovici diz que défice abaixo de 3% é “viável”, mas quer que lhe digam como

Comissário europeu está à espera do Programa de Estabilidade do Governo para perceber como é que Portugal vai conseguir atingir as suas metas orçamentais.

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Nuno Ferreira Santos

"Tenho de manter uma posição de independência e neutralidade", repetiu Pierre Moscovici praticamente no início de todas as respostas que deu aos deputados presentes na audição em que participou esta terça-feira na Assembleia da República.

O refúgio nesta intenção de neutralidade foi a estratégia seguida pelo comissário europeu para os Assuntos Económicos e Financeiros para se defender numa sessão parlamentar em que, por um lado, o PS lhe pediu explicações para o facto de a Comissão dar nos seus relatórios argumentos ao Governo para defender, por exemplo, que o ajustamento externo da economia portuguesa é estrutural, e em que, por outro, o PSD e o CDS o “convidaram” sucessivamente a fazer elogios ao desempenho do Governo durante os últimos anos. Pelo meio, o PCP classificou o programa da troika que a Comissão Europeia ajudou a delinear de “programa de agressão ao povo português”.

Perante isto, o comissário deixou diversas questões por responder, disse “saber bem que vai haver eleições proximamente” e resumiu aquilo que queria dizer sobre Portugal numa frase com recados para quase todos os gostos, dependendo da interpretação: "Muito foi feito, muito continua por fazer".

Entre aquilo que continua por fazer, Pierre Moscovici salientou a realização de mais reformas estruturais e o cumprimento dos objectivos para o défice público.

Nas reformas estruturais, o comissário deu poucos pormenores, dizendo que “é ao Governo, qualquer que ele seja, que compete decidir o que é preciso fazer”. Repetindo aquilo que habitualmente surge nos relatórios publicados pela Comissão disse apenas que é preciso fazer mais em áreas como as pensões, o mercado de trabalho e o endividamento das empresas.

O comissário europeu mostrou-se particularmente preocupado com o obstáculo que o elevado nível de endividamento constitui para para a realização de investimentos em Portugal, com efeitos negativos na capacidade do país para crescer. A solução mais imediata que deu a Portugal foi a de aproveitar o máximo possível o programa de investimento europeu lançado pela Comissão.

O chamado plano Juncker convida os diversos Estados membros a apresentarem projectos que possam receber financiamento proveniente do funco criado a nível europeu. Os projectos serão escolhidos de acordo com a sua qualidade. “É muito importante que as empresas portuguesas sejam capazes de apresentar vários projectos de qualidade”, disse.

Questionado pelos deputados sobre se os países que ainda agora estão a sair de uma crise e que têm um peso muito significativo de PME na sua estrutura empresarial não terão mais dificuldades em conseguir ter projectos vencedores, Moscovici disse que “não devemos subestimar a capacidade de Portugal apresentar projectos de qualidade”.

“Esta pode der um meio agressivo de relançar a economia portuguesa, foi isso que eu disse à ministra das Finanças”, revelou o comissário europeu.

No encontro que teve pela manhã com Maria Luís Albuquerque, o tema central poderá, contudo, não ter sido o plano Juncker. É que entre as preocupações de Bruxelas continua a meta do défice público deste ano. O Governo diz que no final de 2015 o resultado será de 2,7%, a Comissão Europeia aponta para os 3,2%, um valor que faria com que Portugal se mantivesse sujeito ao procedimento por défices excessivos.

“Só vejo vantagens em que Portugal saia do procedimento. Por exemplo, permitiria que o país beneficiasse mais da flexibilidade que existe nas regras europeias, já que deixaria de estar sujeito ao braço correctivo para passar apenas para o braço preventivo das regras”.

Apesar da diferença das estimativas para o défice feitas pelo Governo e pela Comissão, Pierre Moscovici ainda acredita que um valor abaixo de 3% “ainda é viável, mas a questão é saber como”. Aos jornalistas, o comissário explicou depois que, durante o encontro com Maria Luís Albuquerque, a ministra lhe voltou a garantir que a meta do défice seria cumprida, mesmo não lhe tendo apresentado novas medidas de consolidação.

A forma como Portugal irá atingir a meta orçamental, assinalou Moscovici, estará presente no Programa de Estabilidade e Crescimento que o executivo terá de apresentar a Bruxelas durante o próximo mês de Abril. Em simultâneo, será também entregue o Plano Nacional de Reformas.

No final, o comissário não evitou falar um pouco de política nacional, dizendo que não via impactos das eleições na política seguida pelo Governo. “A senhora Albuquerque disse-me que iria trabalhar até ao último dia”, afirmou, mostrando confiança que “os partidos que querem governar Portugal são todos pró-europeus”.

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