Mesmo com uma saída "limpa" fiscalizações externas e vigilância vão continuar durante duas décadas

Portugal só deverá acabar de pagar em 2042 os empréstimos europeus do programa de assistência financeira.

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A vigilância do FMI, hoje liderado por Lagarde, é a que vai terminar mais rapidamente: em 2021 Kim Kyung-Hoon/Reuters

Já vários economistas e políticos avisaram que o fim do programa de apoio financeiro não significa que Portugal fique livre da fiscalização das entidades que actualmente compõem a troika. E, de facto, são diversas as formas como Portugal poderá ficar sob vigilância das autoridades europeias (Comissão Europeia e Banco Central Europeu) e do FMI mesmo na eventualidade de se concretizar a chamada saída limpa.

Em primeiro lugar está previsto, tanto a nível europeu como no FMI, a existência de procedimentos de vigilância específicos para os países que concluíram um programa de ajustamento. No caso da Comissão Europeia – em coordenação com o BCE – chama-se Supervisão Pós-programa e consiste na realização de visitas de equipas ao país e a publicação de relatórios de seis em seis meses até que, pelo menos, 75% dos empréstimos concedidos tenham sido amortizados. Tendo em conta o actual calendário de pagamento dos empréstimos das entidades europeias, isso significa que Portugal pode ficar sujeito a este tipo de supervisão durante mais duas décadas.

A pagar até 2042
O Mecanismo de Estabilidade Europeu (MEE), a nova entidade responsável pela entrega dos empréstimos a Portugal, terá também a missão de verificar ao longo do tempo se o país tem capacidade de fazer face aos seus compromissos. Neste caso, até que o último euro seja devolvido, algo que apenas acontecerá em 2042, de acordo com o actual calendário.

No caso do FMI, chama-se Monitorização Pós-programa e o conceito é em tudo semelhante, envolvendo visitas e relatórios bi-anuais. A vigilância continuará a ser feita até que Portugal tenha apenas para pagar ao FMI um crédito inferior a 200% da sua quota no FMI, o que aos números actuais significa até 2021.

Em relação a um programa cautelar, esta fiscalização pós-programa tem diferenças substanciais: para além de não existir uma linha de crédito disponível, não são impostas medidas concretas à partida e não existe uma penalização financeira prevista para quem não cumpra, apenas uma penalização política, pelo facto de ser publicado um relatório que afirme que as políticas recomendadas não estão a ser seguidas.

Mas há mais mecanismos de vigilância a que Portugal estará sujeito. Legislação europeia publicada em Maio do ano passado, prevê também que a Comissão Europeia possa fazer aquilo a que se chama Supervisão reforçada. Neste caso, haverá lugar à entrega pelo Executivo Europeu ao Parlamento Europeu e ao país vigiado de relatórios trimestrais, com uma definição e acompanhamento de medidas que têm de ser adoptadas pelo país. Este mecanismo está previsto para países da zona euro que sejam “afectados ou corram o risco de ser afectados por graves perturbações financeiras”. A ideia de uma vigilância reforçada como alternativa a um programa cautelar foi recentemente avançada por Peter Praet, economista-chefe do BCE, numa recente visita a Portugal.

Depois, há os mecanismos regulares de fiscalização da situação orçamental e macroeconómica dos países que foi reforçada pela União Europeia em consequência da crise. O Procedimento por Défices Excessivos e o Procedimento por Desequilíbrios Macroeconómicos serão aplicados de forma imediata a Portugal assim que o país sair do programa e decidir não ter um programa cautelar. A única razão porque Portugal não está sujeito neste momento a estes procedimentos, tal como acontece com diversos outros países, é o facto de os países sob programa ficarem isentos. Neste caso, existirá também visitas regulares dos técnicos da Comissão Europeia e publicação de relatórios. E, em caso de incumprimento reiterado das recomendações, Portugal pode ficar sujeito a penalizações financeiras.

É possível que todos estes mecanismos de vigilância da Comissão Europeia e do FMI sejam aplicados em simultâneo a Portugal a partir de meados deste ano. Apesar de tudo estar só agora a começar a ser testado com a Irlanda (não estando ainda definidos os pormenores operacionais), a ideia é que as visitas dos técnicos e mesmo os relatórios publicados sejam realizados a pensar em simultâneo nos diferentes mecanismos.

Uma coisa é certa, contudo, as visitas regulares a Portugal de equipas em tudo semelhantes às da actual troika vieram para ficar.

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