MEO, NOS e Vodafone contestam taxas da Anacom em tribunal

Taxas de regulação de 27,9 milhões de euros foram impugnadas. Anacom tem provisões de 50 milhões para processos judiciais.

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Fátima Barros, presidente da Anacom Nuno Ferreira Santos

A Anacom e os operadores de telecomunicações não se entendem quanto às taxas cobradas pela entidade reguladora. O PÚBLICO sabe que algumas das componentes das taxas de 27,9 milhões de euros referentes à actividade de regulação em 2014 foram impugnadas judicialmente pela MEO, NOS e Vodafone.

De acordo com o relatório e contas da Anacom, no ano passado iniciaram-se 18 novos processos judiciais, dos quais 11 com valores pedidos pelas empresas. Assim, em Dezembro, a entidade presidida por Fátima Barros estava envolvida em 80 processos e foi obrigada a aumentar o valor das provisões para cobrir os riscos destas acções em 5,9 milhões de euros, para um total de 50 milhões. O aumento das provisões deveu-se à “instauração de novos processos judiciais, sobretudo relacionados com a impugnação de taxas pelos operadores”, refere o documento.

Segundo dados recolhidos pelo PÚBLICO, um dos motivos que tem levado os operadores à contestação das taxas de regulação são precisamente as provisões. Uma vez que a Anacom as contabiliza como custos da regulação das comunicações (ou seja, as provisões contam para o montante das taxas a pagar pelas empresas, que são quem suporta os chamados custos administrativos), os operadores entendem que estão a pagar pelas acções que eles próprios instauram contra o regulador. Outros valores referentes a 2013 (ano em que o montante total das taxas de regulação ascendeu a 24,4 milhões de euros) também foram alvo de processos judiciais. Não foi possível obter comentários nem da Anacom nem das empresas sobre estes temas.

Em declarações enviadas posteriormente ao PÚBLICO, fonte oficial da Anacom referiu que "o pagamento das taxas de regulação está previsto nas directivas europeias e na legislação portuguesa e que a Anacom cumpre a legislação".

Também adiantou que “sempre que o processo termina sem que o tribunal dê razão aos operadores, o que a Anacom faz é devolver às empresas esse montantes provisionados”.

A Anacom adianta no relatório, divulgado na semana passada, que obteve rendimentos totais de 85 milhões de euros em 2014, dos quais 27,9 milhões se referem às taxas de regulação, 49,3 milhões às taxas de utilização de frequências radioeléctricas e 1,7 milhões às taxas de utilização de números. Os rendimentos aumentaram 30%, o que se deve, em parte, ao facto de o Governo ter aumentado em 9,9 milhões de euros as tarifas de utilização de frequências para assegurar maior receita fiscal. Também houve um ajustamento (aumento) de 3,5 milhões de euros nas taxas/custos administrativos depois de serem apurados os custos finais relativos a 2013 (que obrigaram a constituir mais provisões para processos judiciais). Em contrapartida, e por causa de no ano passado ano terem sido encerrados dois processos judiciais  a favor das empresas, a Anacom terá de devolver taxas de 1,7 milhões de euros que estavam provisionadas.

São várias, e muitas delas complexas, as acções judiciais em que o regulador está envolvido. É a própria Anacom quem o reconhece no relatório e contas, onde revela que os gastos com consultadoria de advogados subiram 66% no ano passado, para 583 mil euros, em virtude do “maior envolvimento (…) em processos judiciais de complexidade acrescida, que requerem o acompanhamento específico e complementar de advogados externos”.

A entidade reguladora diz que estão em causa acções referentes “sobretudo à impugnação de deliberações tomadas no âmbito da actividade de regulação dos mercados” e que pedem indemnizações com valores “significativamente elevados”. Assim, tal como a complexidade, também o risco associado aos processos aumentou, o que explica o reforço de 5,9 milhões de euros das provisões acumuladas para processos judiciais, para 50 milhões. Na prática, significa que a Anacom tem provisionado um valor correspondente a quase 60% dos rendimentos, que é contabilizado nos custos imputáveis às empresas, que por sua vez são alvo frequente de contestação judicial.

Essa é, de resto, a única ênfase do auditor externo ao relatório e contas da Anacom: “Sem afectar a opinião expressa sobre as demonstrações financeiras, chamamos a atenção para o facto de que (…) incluem uma provisão para riscos e encargos acumulada no valor de cerca de 50 milhões de euros”, escreve a Ernst & Young Audit & Associados. “Atendendo a sua natureza e complexidade, os efeitos da conclusão daqueles processos [judiciais] apresentam algumas incertezas”, acrescenta o relatório de auditoria.

Com rendimentos de 85 milhões e gastos do exercício de 45,4 milhões (um aumento de 11% que se deveu essencialmente à subida das despesas com pessoal, já que todas as outras rubricas diminuíram), a Anacom registou um resultado líquido de 40 milhões de euros em 2014. A subida de 63% face ao homólogo deve-se essencialmente aos 9,9 milhões de euros que correspondem ao valor do aumento com as taxas de espectro que será entregue directamente ao Estado.

Também vão ser entregues aos cofres públicos outros 26 milhões de euros. O destino dos resultados líquidos da Anacom é decidido pelo Governo em portaria. Nos últimos anos tem servido para acertar contas entre os operadores de telecomunicações e a Fundação para as Comunicações Móveis (programas e-escolas e e-escolinhas), mas também já foi utilizado para financiar a participação portuguesa na Agência Espacial Europeia.
 

Notícia actualizada a 10/08, às 12h54: acrescenta comentário de fonte oficial da Anacom

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