Medidas de 1500 milhões com impacto no défice de 460 milhões

Tal como faz o Governo no programa de estabilidade, o PS confia na economia para minimizar o efeito negativo imediato que medidas como a reposição dos salários e o corte da sobretaxa podem ter no défice.

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Uma coisa têm em comum os dois planos para a legislatura apresentados em Portugal na última semana – um pelo Governo, outro por um grupo de economistas escolhidos pelo PS -, apesar de a maioria das medidas apresentadas apontarem para uma redução da receita ou para um aumento da despesa, o valor do défice permanece sob controlo ou desce a alta velocidade, graças a uma ajuda da economia.

Esta estratégia que baseia a consolidação orçamental no crescimento da economia é especialmente evidente na proposta mais recente apresentada pelo grupo de trabalho mandatado pelo Partido Socialista. Os doze economistas avançam com diversas medidas, que calculam podem vir a ter um impacto negativo no saldo orçamental de reduzida dimensão em 2016 e 2017 e um efeito positivo nos dois anos seguintes.

Nestes cálculos, contudo, muito depende da forma como a economia reage e do contributo que dá para o esforço de consolidação orçamental. De facto, olhando para o ano de 2016, as medidas propostas pelo grupo de trabalho formado pelo PS conduzem, de acordo com os cálculos feitos pelo PÚBLICO, a um impacto imediato e directo nas receitas e despesas situado próximo dos 1500 milhões de euros.

No entanto, este valor não leva em conta o efeito indirecto que essas medidas podem vir a ter nas finanças públicas, por via do aumento de actividade económica e de emprego que podem gerar. E no seu modelo, os peritos do PS estimam esse efeito indirecto e calculam que, no final, o impacto global no défice, em 2016, será apenas de 460 milhões de euros, um pouco mais de 0,2% do PIB.

São várias as medidas em que se acredita que esse efeito indirecto possa ser muito positivo. A reversão de metade do corte salarial na função pública, por exemplo, significa o pagamento de mais 300 milhões de euros de salários em 2016 (de acordo com as contas do Governo no Programa de Estabilidade). Mas, depois de levar em conta o maior consumo e criação de emprego que pode resultar desse aumento salarial aos funcionários - e consequente pagamento de mais impostos – os peritos do PS estimam que o efeito negativo da política salarial da Função Pública não seja mais de 105 milhões de euros no próximo ano.

Na eliminação de metade da sobretaxa do IRS, que no imediato pode reduzir a receita desse imposto em 380 milhões de euros, o impacto final estimado em 2016 é de 312 milhões de euros.

A redução das TSU (tanto das empresas como dos trabalhadores), que os economistas sugerem que comece a ser feita parcialmente em 2016, poderia, de acordo com os números apresentados pelo relatório conduzir a uma perda de receita imediata no próximo ano a rondar os 712,5 milhões de euros. No entanto, a estimativa de impacto final, depois de contabilizado o efeito na economia, seria de 420 milhões de euros.

Depois, há medidas que apesar de significarem um aumento da despesa, o PS acredita que podem vir a ter, logo em 2016, um impacto positivo no défice. O complemento salarial anual é uma delas. Pode custar no imediato 87,5 milhões de euros ao ano, mas a estimativa de impacto no saldo orçamental é positiva, em 15 milhões de euros. De igual modo, a aceleração da execução dos fundos comunitários (que implica necessariamente um reforço da comparticipação do Estado), conduz a uma estimativa de impacto positivo nas contas públicas de 137 milhões de euros.

A contribuir para que o efeito no défice seja menor também há medidas que resultam logo no imediato num reforço de receitas, como a aplicação de um imposto sobre heranças (100 milhões de euros), ou uma redução da despesa, como uma política de pensões que inclui o congelamento das reformas excepto as mínimas e a convergência do sistema público com o privado (163 milhões de euros). No documento também é previsto um ganho de 220 milhões com poupanças sectoriais e com o pagamento de juros, embora não seja explicitado como é que se pensa que este último pode diminuir.

Do lado do Governo, no Programa de Estabilidade, também é notória a aposta numa consolidação bastante mais baseada no crescimento. É verdade que o ritmo de reversão da austeridade é mais moderado, mas em 2016, as medidas que são detalhadas no documento apontam para um impacto negativo directo nas contas de cerca de 500 milhões de euros. Isso não impede contudo que, para esse ano, o Governo acredite que pode baixar o défice de 2,7% para 0,8%.

Mais quota de mercado
Outro sinal claro da confiança na viragem na economia que tanto o Governo como o PS acreditam poder fazer na próxima legislatura está nas projecções para as exportações portuguesas.

Do lado do Executivo, no Programa de Estabilidade, foi revisto em alta o valor do crescimento das exportações de uma forma mais significativa do que aquilo que seria explicado pelo aumento da procura externa dirigida à economia portuguesa, especialmente entre 2017 e 2019.

Do lado dos economistas do PS, é mesmo explicitado o impacto que as medidas por si propostas terão na variação das exportações portuguesas. De acordo com o documento, graças a medidas como a descida da TSU das empresas ou políticas de apoio à inovação e internacionalização, a taxa de crescimento das exportações aumenta 0,5 pontos percentuais em 2016 e 1 um ponto em 2017 e 2018, um ganho que é apenas explicável com aumentos da quota de mercado de Portugal.

Esta estratégia de confiar na economia para garantir a redução do défice representa uma alteração em relação ao que foi feito no programa da troika. Aí, as medidas de contenção da despesa e de aumento da receita que eram aplicadas tinham de ser de maior dimensão do que o efeito final que se pretendia para o défice. Isto porque o impacto que tinham na economia conduziam a que o orçamento acabasse por sair prejudicado devido à diminuição do ritmo de actividade e consequente cobrança de impostos.

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