Cobrar mais impostos para investir é ideia de Stiglitz para Portugal crescer

Prémio Nobel da Economia veio a Lisboa e diz ter esperança no novo Governo para vencer os “constrangimentos da austeridade e do euro”.

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Joseph Stiglitz durante a conferência na Gulbenkian Enric Vives-Rubio

Aumentar alguns impostos para poder investir mais foi uma das ideias deixadas por Joseph Stiglitz ao novo Governo para que Portugal consiga voltar a crescer, mesmo “dentro dos constrangimentos do euro”. O economista, que falou esta terça-feira em Lisboa numa conferência organizada pela Fundação Calouste Gulbenkian, mostrou ter “uma esperança considerável” de que o executivo liderado por António Costa será capaz de cumprir essa tarefa.

O prémio Nobel da Economia centrou o seu discurso no tema que mais o tem ocupado durante toda a sua tarefa: a desigualdade. E voltou a referir a política de austeridade como uma das causas para o agravamento das desigualdades que tem ocorrido durantes as últimas décadas e que conduz, afirma, a um desempenho mais fraco das economias.

“Com a austeridade e com o aumento do desemprego, é difícil manter um crescimento económico no futuro, porque se está a destruir capital humano produtivo”, disse. E alertou: “As nossas estatísticas não captam a destruição de capital humano que está a ocorrer neste momento na Europa.”

Ainda assim – e apesar de dizer que o facto de os países europeus se terem “atado ao euro” torna as coisas mais difíceis – assinalou que “mesmo nos constrangimentos da austeridade – que não fazem qualquer sentido – há coisas que se podem fazer para estimular a economia”.

Uma das coisas que Joseph Stiglitz não aconselha é reduzir os impostos sobre as empresas de uma forma generalizada, “algo de que não há provas que faça crescer mais a economia”. O economista defende antes que se reduza os impostos apenas às empresas que voltem a investir no país.

Especificamente sobre Portugal Stiglitz, que antes da conferência almoçou com o primeiro-ministro e teve reuniões com delegações de todos os partidos da maioria de esquerda, disse aos jornalistas ter “uma esperança considerável” num novo governo que “está a tentar descobrir como é que pode pôr a economia a crescer dentro dos constrangimentos do euro”.

E deixou um conselho: “Aumentar os impostos de uma maneira que não afecte a economia.” “Toda a gente se queixa sempre de que paga demasiados impostos, mas com mais impostos pode-se investir nas pessoas, na tecnologia. Se não se investir, não se vai crescer”, afirmou, assinalando o que diz estar a ser um nível preocupante de subinvestimento.

Na sua intervenção perante uma plateia cheia no grande auditório da Gulbenkian, o economista norte-americano defendeu que o mundo inteiro está perante uma situação de emergência devido ao “enorme aumento dos níveis de desigualdade” que exige a tomada de decisões radicais no curto prazo que possam inverter a tendência das últimas três décadas e meia.

“A desigualdade é uma escolha. Uma escolha que não é feita pelos mais pobres, mas pelos nossos sistemas políticos”, afirmou, recordando o que foram os passos políticos dados nos Estados Unidos durante os anos 80 do século passado e que conduziram ao agravamento das desigualdades, tanto de riqueza e rendimento como de oportunidades.

“Tomámos uma série de decisões no último terço de século. O Presidente Reagan disse que, ao baixar impostos aos mais ricos, a tarte ia ser maior e que por isso a fatia a que cada um teria direito ia ser maior. O que nós sabemos dessa experiência é que a economia abrandou e que os únicos que beneficiaram foram os 10% mais ricos, especialmente os 1% mais ricos”, afirmou.

Stiglitz repetiu por diversas vezes que uma política económica que aposta em “entregar mais dinheiro aos mais ricos e esperar que este vá caindo para os mais pobres” não funciona. “Infelizmente, mais dinheiro nos 1% não significa que todas as outras pessoas fiquem melhores. O rendimento mediano não está melhor e quem tem os rendimentos mais baixos está pior”, disse.

Agora apela a que se comecem a adoptar medidas no sentido inverso das que foram iniciadas nos Estados Unidos nos anos 80, mostrando-se particularmente crítico das chamadas "reformas estruturais", da política de austeridade e dos acordos comerciais internacionais. “Para os Estados Unidos, esta política foi um desastre para o país. O que não percebo é como é que outros países, vendo o que aconteceu, querem imitar o modelo americano”, afirmou, referindo-se à Europa. Na sua intervenção, Stiglitz deixou uma mensagem final: "O problema da desigualdade não é económico, está na política."

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