“A decisão de investimento na Rioforte foi de Henrique Granadeiro”

Ex-administrador financeiro da PT diz que Bava não terá tido responsabilidade directa.

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Daniel Rocha

Se a audição do ex-CFO da PT servia para saber de quem é a responsabilidade pelo investimento, ruinoso, de 897 milhões de euros na parte não-financeira do GES, então Zeinal Bava está a ganhar a Henrique Granadeiro.

Quando os deputados se sentaram na sala 6 do Parlamento, onde decorrem as audições da comissão de inquérito à gestão do BES, traziam uma expectativa muito concreta sobre o ex-responsável financeiro da PT. Luís Pacheco de Melo deveria poder esclarecer um dos mistérios desta história: quem decidiu, ordenou e concretizou o investimento de 697 milhões de euros da tesouraria da PT em dívida da Rioforte, a holding não-financeira do Grupo Espírito Santo. Em Fevereiro e Abril, pouco antes do colapso do GES, a PT investiu um total de 897 milhões de euros naquela empresa, que viria a pedir a “gestão controlada” em Julho, uma pretensão negada pelas autoridades luxemburguesas - país onde a holding tinha a sua sede - o que levou a uma declaração de insolvência.

Desse montante investido, há 200 milhões de euros que Henrique Granadeiro assumiu, “por inteiro” a responsabilidade. Quanto ao resto, o ex-chairman negou qualquer tipo de interferência, apontando a responsabilidade de Zeinal Bava e de Pacheco de Melo. Chegou a citar uma acta, de Julho de 2014, onde Pacheco de Melo assume, ainda que de forma “cabalística”, que Bava sabia do investimento. Bava não guardou isso na memória, como se sabe. No Parlamento, o ex-gestor afirmou que estava “focado” no projecto da Oi, e que passava “85%” do tempo no Brasil, nessa altura.

Esta quinta-feira, Pacheco de Melo esclareceu, logo na primeira ronda de perguntas do deputado Jorge Paulo Oliveira, PSD: “A decisão de investimento na Rioforte foi de Henrique Granadeiro.” Pergunta do deputado: “Henrique Granadeiro validou?” Resposta, seca, com um sorriso: “Sim.”

Mais detalhes: “Ricardo Salgado apresentou-me as várias vantagens (…) Fui ao gabinete de Henrique Granadeiro, mostrei-lhe a apresentação que me tinha sido feita. Em Março, Granadeiro comunica-me que eu teria de ir a uma reunião com Morais Pires (…) Eu não me opus ao investimento. Opus-me terminantemente a que tivesse o prazo de um ano.”

É um facto, nesta versão de Pacheco de Melo, que “Zeinal Bava sempre teve conhecimento do tipo de aplicações que fazíamos no GES”, porém, esta aplicação em concreto não terá sido da sua responsabilidade directa. Mesmo que o gestor recebesse, por e-mail, os célebres “tableaux de bordo”, onde apareciam descriminados os valores investidos, ele próprio garantiu aos deputados que não se recorda de os ter lido.

“Na reunião no BES com Morais Pires fui confrontado que estaria tudo acordado entre Henrique Granadeiro, Ricardo Salgado e Zeinal Bava. E tratava-se de renovar as aplicações de 900 milhões de euros por um ano”, referiu Pacheco de Melo, que repetiu a sua oposição ao prazo do investimento. Porque aprovou esse investimento, então? Porque a relação com o BES, de parceria estratégica, o aconselhava, e o histórico era claramente positivo. Aliás, dos quase 900 milhões que foram perdidos na Rioforte, 750 tinham sido recentemente pagos pela empresa “irmã” Espírito Santo International (ESI).

“Eu relatei o que é que são as verdades dos factos”, expôs o ainda administrador da PT SGPS, que já não tem o pelouro financeiro. Ou seja, que era a PT SGPS (a que Granadeiro presidia, à época) e não a PT Portugal (liderada por Bava e em processo de fusão com os brasileiros da Oi) que geria os fundos da empresa, neste tempo de impasse que os deputados procuram, sem grande êxito, perceber. E isso, para simplificar, significa que a versão que Bava apresentou aos deputados é coincidente com a do ex-CFO. Até porque Granadeiro não parece dispor de provas documentais para atestar a sua “convicção” de que era Bava quem superintendia à tesouraria. Neste ponto, quase caricato, reside toda uma tragédia. A PT (seja a SGPS, seja a Portugal, sejam ambas) perdeu 900 milhões num investimento decidido não se sabe bem por quem (Granadeiro, Bava, Pacheco de Melo, outro funcionário?). E isso fez com que a fusão com os brasileiros da Oi voltasse a ser renegociada, em perda, e que a PT Portugal acabasse vendida aos franceses da Altice, acabando com o sonho de um “grande operador lusófono” e gerando um rombo que é quatro vezes maior do que o orçamento da secretaria de Estado da Cultura para 2015. Granadeiro e Bava foram, salomonicamente, afastados, em timings diferentes.

Como é que isto foi possível? Pacheco de Melo responsabiliza Salgado & companhia: “Fomos enganados e defraudados pelos mais altos responsáveis do GES.” E responsabilidades próprias, houve? “A informação sobre a Rioforte que nos foi transmitida omitia deliberadamente informação relevantíssima. Contra fraude de informação não há análise que resista, senhor deputado…” A análise, a ter existido, desaconselharia, também, que a PT entregasse 98% da sua tesouraria a um único grupo financeiro, o BES. Mas foi o que aconteceu…

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